Nos últimos 12 meses, Joinville perdeu 4,5 mil postos de trabalho. É como se, de repente, todos os moradores do bairro Jardim Sofia deixassem a cidade. Os dados fazem parte do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), do Ministério do Trabalho e Emprego, divulgados na última semana.

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Uma estatística que a população começou a sentir na pele principalmente neste ano e que contrasta com o título de “cidade do pleno emprego” exibido até meados de 2014. Além de promover demissões, banco de horas e férias coletivas, a não reposição de vagas abertas tornou-se quase uma regra entre as empresas.

– No ano passado, a nossa caixa de currículo ficava vazia. Agora, está cheia e ninguém vem procurar – diz o diretor de negociação do Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias do Plástico, Antônio Borinelli.

Neste polo industrial, as demissões pularam de 363, em junho, para 646, em julho. Mas as dispensas no setor plástico são apenas uma parte dos cortes. Julho terminou com 1.986 postos de trabalho a menos. Em números absolutos, foi a maior perda em SC, seguido por Blumenau, que fechou 1.624 vagas.

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– Os anos de 2013 e 2014 foram atípicos, houve muita troca de emprego devido à grande oferta de trabalho. Neste ano, a oferta está abaixo da média, mas temos a expectativa de que em outubro ou novembro melhore um pouco – afirma o gerente de recrutamento e seleção da RH Brasil, Joanir Schadeck.

Entre os municípios perto de Joinville, julho também acentuou o fechamento de postos de trabalho. A exceção foi São Francisco do Sul, que gerou 14 vagas.

Para o presidente da associação empresarial de São Francisco do Sul, Carlos André Atanásio Veiga, os novos empreendimentos ligados ao transporte marítimo, como o Terminal Graneleiro da Babitonga (TGB), e a atividade portuária ajudam a enfrentar a crise.

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Dólar em alta favorece

O presidente do Porto de São Francisco do Sul, Paulo César Côrtes Corsi, destaca que 70% da movimentação portuária são de exportação e o dólar em alta favorece, mas não blinda o porto da crise. A expectativa é de terminar o ano com receita um pouco abaixo da registrada em 2014.

No acumulado do ano, além de São Francisco do Sul, cidades como São Bento do Sul e Jaraguá do Sul ainda mantêm saldo positivo na geração de vagas. Já em Araquari, nem mesmo a vinda da BMW foi suficiente para impulsionar a geração de empregos. O município terminou os primeiros sete meses com 196 postos a menos.

Diversificação vira alternativa

Ulisses Truchinski, da Transligue: novos serviços

Alguns empresários encontraram na diversificação de serviços uma forma de enfrentar a crise. Em julho do ano passado, a empresa Transligue começou a oferecer o serviço de armazenagem, carregamento e descarga de mercadorias para seus clientes, além do transporte de cargas. Para isso, trocou uma área de 800 metros quadrados no bairro São Marcos por outra de 3,3 mil metros quadrados dentro do condomínio Perini Business Park, no Distrito Industrial de Joinville.

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O carro-chefe continua sendo o transporte na companhia com sede em Jaraguá do Sul e unidades em Joinville, Blumenau, Itajaí e São José, em SC, e nas cidades paulistas de Campinas, Santos e São Paulo. Os novos serviços, porém, garantiram os negócios e as contas em dia.

– Em Santa Catarina, mantivemos os 240 funcionários diretos e indiretos e ainda reforçamos a equipe comercial. A expectativa é a de terminar o ano com crescimento de 10% – diz o diretor Ulisses Truchinski.

Indústria diminui o ritmo

O desemprego em Joinville reflete, sobretudo, o ritmo mais lento nas indústrias de transformação, que em julho eliminaram 1,5 mil vagas e totalizaram 4 mil postos fechados nos primeiros sete meses do ano.

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Se a indústria anda mais devagar, as cargas também diminuem e os efeitos são sentidos diretamente no setor de transportes, uma espécie de termômetro da economia.

De acordo com o presidente do Sindicato das Empresas de Transporte de Cargas de Joinville e Região, Ari Rabaiolli, o volume transportado caiu 25% nos primeiros sete meses do ano.

A entidade reúne 70 empresas e 80% do produto interno bruto (PIB) do setor na região. Em faturamento, a redução é menor, afirma Rabaiolli, já que os clientes passaram a enviar cargas fracionadas, o que eleva o custo do frete.

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– O volume de vendas caiu 25% especialmente por causa da queda no transporte nos setores de linha branca e no de metalurgia que fornece para o setor automotivo -destaca.

Emprego chega ao divã

O desemprego transformou-se em uma das principais preocupações das famílias em 2015. Em Joinville, quem não vive o drama na pele, certamente tem um amigo, vizinho ou parente lidando com os efeitos mais duros da crise econômica.

Além do impacto financeiro na vida pessoal e na economia, o desemprego tem efeitos também emocionais, tanto para o profissional e seus familiares quanto para os colegas que permanecem empregados e absorvem o volume extra de trabalho.

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Em 13 anos, a psicóloga Cleonice de Fátima de Andrade afirma nunca ter recebido em seu consultório tantas queixas ligadas a demissões quanto em 2015, situação vivida também pela psiquiatra Cíntia Döhler nos últimos seis anos de atuação.

– Em um único dia, os maridos de três pacientes foram demitidos – conta Cíntia.

A psicóloga Cleonice explica que, até o ano passado, as questões sobre trabalho se referiam a se o profissional estava na área certa, insatisfação salarial, injustiças, assédio moral, estresse por excesso de trabalho, interação com os colegas e dúvida se deveria ou não trocar de emprego.

– Ultimamente, as queixas são de crises de ansiedade frequentes por insegurança de perder o emprego a qualquer momento. Os profissionais vivem diariamente na expectativa de que poderão receber no final do dia a notícia de que seus serviços não serão mais necessários, pois presenciam demissões de colegas diariamente – afirma Cleonice.

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Conforme a psicóloga, muitos dos seus pacientes reclamam que estão sobrecarregados e estressados por terem de realizar tarefas que antes eram divididas entre a equipe. Outros chegam com a notícia de que foram demitidos e perdidos por não saberem que rumo tomar diante da crise que o País atravessa.

No consultório de Cíntia Döhler, chegam casos em que a tristeza não passa. E quando ela não vai embora e torna-se incapacitante, está na hora de pedir ajuda, como explica a especialista nesta entrevista:

A Notícia – Quanto tempo uma pessoa demora para se recuperar do baque da demissão?

Cíntia Döhler – Varia muito de pessoa para pessoa, algumas não sofrem tanto e outras adoecem de fato. Uma pessoa mais otimista vai ver com bons olhos poder se aperfeiçoar e buscar outro emprego, já o pessimista não vai ver muita perspectiva. Nessas horas, a pessoa pode reagir com estreesse. Isso é comum acontecer e é saudável, mas se perdurar por mais três meses pode evoluir para uma depressão. Ficar triste não causa paralisia, mas a incapacidade de reagir mostra que é hora de procurar ajuda.

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AN – Quais são os sinais de que o indivíduo está ficando deprimido?

Cíntia – A depressão é um quadro amplo, começa a atingir o corpo com dores físicas, perda de sono, a pessoa não tem vontade de comer e de se cuidar, sente-se culpada, acha que não vai conseguir mais nada.

AN – O que o profissional deve fazer para evitar agravar o quadro?

Cíntia – Procurar manter a rotina, não dormir até o meio-dia, manter uma atividade física e aperfeiçoar o conhecimento. Conheço casos de pessoas que abriram o próprio negócio e estão mais felizes. Uma paciente que antes trabalhava no setor administrativo abriu um salão de beleza. Aproveitou a crise para apostar em outra oportunidade. Muitos pacientes não teriam coragem de empreender se não tivessem perdido o emprego.