O desabamento do Rana Plaza, na região metropolitana de Daca, cujo número de mortos chega a 400 e não para de subir, reverbera há uma semana as condições precárias de trabalho em Bangladesh – um dos maiores exportadores de produtos têxteis baratos.

Continua depois da publicidade

Ontem, no Dia Internacional do Trabalho, até o papa Francisco disse ter ficado chocado ao saber quanto ganhavam as vítimas: menos de R$ 100 ao mês.

– A manchete que me chocou de verdade no dia da tragédia de Bangladesh foi “viver com 38 euros (R$ 100) ao mês”. Era o que recebiam as pessoas que morreram. É o que se chama de trabalho escravo – disse o Pontífice, em audiência na Praça de São Pedro.

O prédio de oito andares que desmoronou abrigava cinco fábricas têxteis fornecedoras de varejistas ocidentais. Em Daca, milhares de pessoas marcharam no Dia do Trabalho pedindo pena de morte para o dono do edifício, que teria obrigado os trabalhadores a permanecer no prédio apesar de sinais evidentes do comprometimento da estrutura, e melhores condições de trabalho. Ainda há 149 pessoas desaparecidas e 2,5 mil feridos no pior desastre industrial do país.

O governo anunciou um plano de inspeção das fábricas e teme atos de violência nas demais indústrias, onde operários trabalham em condições precárias. Empresas europeias e americanas exigiram que Daca melhore a segurança dos trabalhadores. A União Europeia afirmou estar considerando fazer exigências às fábricas com base no sistema de preferências comerciais. Ao todo, sete pessoas foram detidas e acusadas de homicídio doloso.

Continua depois da publicidade

Duas empresas que tinham os produtos fabricados no local se comprometeram a indenizar as famílias das vítimas. A britânica Primark tomou a iniciativa na segunda-feira e foi seguida pela canadense Loblaw, cujas roupas de baixo custo da marca Joe Fresh eram fabricadas naquele edifício. O grupo prometeu uma ajuda significativa. No sábado, um pequeno protesto foi realizado em Londres diante de uma loja da Primark. Os manifestantes gritavam lemas como “Ame a moda, vamos proibir os ateliês da miséria” e “Vergonha para a Primark”.

Preocupada com sua imagem, a italiana Benetton afirmou que “o produtor de Bangladesh já não faz parte de seus fornecedores” e afirma que realiza com frequência auditorias sociais. A Dird Ltd., que produz 20 milhões de peças ao ano para varejistas britânicos incluindo Tesco, Sainsbury’s e Next, diz estar muito mais vigilante, fazendo inspeções nas instalações.

Dono desconsiderou alerta sobre risco de desabamento

A história do Rana Plaza ilustra o custo social implícito nas mercadorias baratas fornecidas para grandes redes internacionais. São comuns casos de edificações que não seguem normas de construção civil.

O dono do edifício, Sohel Rana, 35 anos, que segundo a imprensa local, também estaria envolvido com comércio ilegal de armas e drogas, é descrito como homem influente entre políticos locais. Para construir Rana Paza, ele e seu pai teriam forçado proprietários de terra a vender suas propriedades. A autorização para construir teria sido obtida com base em favores e corrupção. O prédio foi erguido com cinco andares. Em 2011, outros três andares adicionais foram construídos, com autorização de um aliado político de Rana.

Continua depois da publicidade

No dia anterior ao colapso, televisões locais mostraram que havia rachaduras no prédio, mas nenhuma autoridade impediu Rana de abrir o prédio na manhã seguinte. Trabalhadores do terceiro piso teriam escutado ruídos semelhantes a explosões, e rachaduras apareceram no prédio. Houve pânico. Um engenheiro examinou os pilares e pediu ao proprietário que o local fosse esvaziado imediatamente. Segundo um repórter local citado pelo jornal americano The New York Times, no entanto, Rana não ficou impressionado.

– Isto não é uma rachadura. Não é um problema – teria dito Rana, que após o desabamento, tentou fugir em um helicóptero, mas foi localizado na fronteira com a Índia.

Na terça-feira, para não ser linchado, Rana foi levado a uma audiência protegido por um capacete policial.