A BR-470, em Ibirama, teve o fluxo interrompido por aproximadamente 30 minutos na manhã desta quinta-feira. Por volta das 10h, membros da tribo Laklaño Xokleng tomaram a rodovia para uma manifestação pacífica, acompanhada pela Polícia Rodoviária Federal (PRF).
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A mobilização é nacional e cobra o diálogo do Ministério da Saúde com os indígenas sobre a proposta do governo federal de municipalização do atendimento médico ofertado às tribos de todo o Brasil. Caso a ideia se concretize, a Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), que hoje faz o atendimento das comunidades, será extinta e os municípios ficarão responsáveis pela prestação do serviço aos indígenas, por meio dos postos e demais unidades de saúde.
Geomar Covi Crendo, representante da comunidade indígena que vive na região de José Boiteux, argumenta que a prefeitura não tem condições de absorver mais essa demanda. Hoje a tribo tem aproximadamente dois mil integrantes.
– Se for preciso uma fiscalização ou uma auditoria na Sesai, nós não somos contra. Sempre tem o que se melhorar, mas nós precisamos ser ouvidos – reforça Crendo.
O prefeito de José Boiteux, Jonas Pudwell, conta que a administração não foi oficialmente informada sobre a proposta do governo federal. Diz que teve conhecimento da situação por meio dos veículos de comunicação e da própria comunidade indígena que o procurou.
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Ele afirma que atualmente o município tem duas unidades básicas de saúde. Os índios, entretanto, são atendidos por uma equipe específica da Sesai, que conta com médicos e enfermeiros, os quais percorreram as tribos. Segundo o prefeito, se precisar ampliar esse atendimento para a comunidade Laklaño Xokleng, será necessário ter ao menos mais dois postos.
– É complicado, porque o dinheiro está escasso. De onde virá o recurso para isso? Terminar e simplesmente passar para o município não é a solução. Se a Sesai tem problemas, precisam resolver – defende.
Antropóloga aponta impacto negativo da municipalização para os indígenas
A antropóloga e coordenadora pedagógica do curso de Licenciatura Intercultural Indígena, da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Jozileia Daniza Kaingang, explica que a proposta divulgada em entrevistas pelo ministro da Saúde prevê que os municípios assumam a saúde dos indígenas nas regiões Sul, Sudeste e parte do Nordeste.
Na avaliação dela, as equipes que hoje atendem os indígenas promovem um trabalho complementar que também leva em conta métodos medicinais tradicionais dos indígenas e rituais, e que também acompanham especificidades importantes no atendimento às comunidades. Para ela, os municípios já têm dificuldades de dar conta da saúde com as condições atuais.
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A antropóloga questiona o argumento do ministro, de que na região Sul as comunidades indígenas seriam mais próximas das cidades, e sustenta que ainda existe muito preconceito com os indígenas na região. Por isso, no entendimento dela, uma saúde diferenciada seria o mínimo que o Estado poderia oferecer aos povos originários.
– Quem depende dos postos de saúde nas cidades sabe que tem que levantar 3h, 4h para conseguir atendimento. Como um indígena vai sair da sua aldeia para pegar uma ficha na cidade, sem transporte. Fico me perguntando se os municípios dariam conta. Tanto é real essa dificuldade que a maioria dos prefeitos da região Sul consultados pelos próprios caciques deram cartas dizendo serem contra a municipalização – questiona.
Contraponto
Por meio da assessoria de imprensa, o Ministério da Saúde informou que acompanha as manifestações realizadas pelos indígenas e que está aberto ao diálogo. Confira abaixo o teor da nota:
A pasta esclarece que a realização de ações na atenção à saúde indígena desenvolvidas pela Secretaria Especial de Saúde indígena (Sesai) é uma das atribuições da pasta e que as eventuais mudanças no desenvolvimento dessas ações de vigilância e assistência à saúde aos povos indígenas ainda estão sendo objeto de análise e discussão.
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Cabe ressaltar que não haverá descontinuidade das ações. Para isso, o Ministério da Saúde tem se pautado pela garantia da continuidade das ações básicas de saúde, a melhoria dos processos de trabalho para aprimorar o atendimento diferenciado à população indígena, sempre considerando as complexidades culturais e epidemiológicas, a organização territorial e social, bem como as práticas tradicionais e medicinais alternativas a medicina ocidental.