Os textos que acompanham uma foto que circula pelas redes sociais e que sugerem que pacotes de cloroquina e hidroxicloroquina estariam sendo vendidos em trens da malha urbana estadual do Rio de Janeiro são falsos.

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Apesar de o Comprova não ter encontrado o autor da imagem, nem registro da circunstância e local onde ela foi feita, a partir análise detalhada da foto e de informações obtidas com o Sindicato da Indústria de Produtos Farmacêuticos (Sindusfarma), é possível afirmar que não há embalagem de medicamentos à base de cloroquina ou hidroxicloroquina na imagem que viralizou.

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Como verificamos? 

Inicialmente, o Comprova contatou a Supervia, companhia que opera o transporte ferroviário no Rio de Janeiro e é responsável pela linha que leva a Japeri, onde teria sido clicada a foto, segundo algumas das postagens. Também entrou em contato com a Polícia Militar, órgão acionado quando há alguma ocorrência nos trens e estações.

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A equipe também fez uma busca reversa de imagem no Google, e na ferramenta TinEye, para tentar achar a fotografia original, No entanto, os primeiros posts encontrados, do dia 4 de agosto, já são repostagens. O Comprova questionou internautas que publicaram a foto se conheciam o autor da imagem, mas nenhum respondeu de maneira afirmativa até o fechamento deste texto. Essas pessoas sempre alegavam que receberam a foto já com o contexto falso.

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Sem ter a confirmação, o Comprova utilizou a ferramenta InVid, que possibilita a ampliação de imagens, para observar detalhes da foto. Com o ampliação da imagem, a reportagem entrou em contato com o Sindicato da Indústria de Produtos Farmacêuticos para checar quais laboratórios comercializam medicamentos à base de cloroquina e hidroxicloroquina e, assim, identificar se as embalagens desses remédios apareciam na foto verificada. A equipe também procurou a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), mas não obteve retorno até o fechamento desta reportagem.

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Verificação

O que dizem a PM e a Supervia

A Supervia informou que não pode confirmar a veracidade da foto porque não “teve registro do fato citado”. A empresa afirmou ainda que investe em campanhas para alertar sobre o comércio ilegal de camelôs “e os riscos do consumo de produtos de procedência não conhecida e, por vezes, fora do prazo de validade” e que, quando sabe de algum tipo de ocorrência, aciona a Polícia Militar por meio do Grupamento de Policiamento Ferroviário (GPFer) – os agentes da companhia não têm poder de polícia.

A Polícia Militar do Rio de Janeiro afirmou não ter sido acionada para nenhuma ocorrência relacionada à venda de cloroquina nos vagões das linhas fluminenses. E completou que “é importante que as pessoas denunciem este tipo de conduta e não contribuam comprando produtos de origem desconhecida”.

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Embalagens

Observando a imagem detalhadamente com a ferramenta InVID, é possível identificar alguns remédios, como o Dipimed, à base de dipirona, utilizado no tratamento da dor e febre, e o Narix, descongestionante nasal. Para descobrirmos se há embalagem de cloroquina ou hidroxicloroquina na foto, também pesquisamos os laboratórios que comercializam as drogas no Brasil. Contatado pelo Comprova, o Sindicato da Indústria de Produtos Farmacêuticos (Sindusfarma) informou que as empresas que vendem atualmente as duas drogas em farmácias do país, segundo dados da consultoria IQVIAsão: Apsen, E.M.S e Sanofi.

Um quarto laboratório, Cristália, produz cloroquina, mas vende apenas para o Sistema Único de Saúde (SUS) e hospitais particulares, em embalagens de 200 comprimidos, conforme informou ao Comprova. “O Quinacris (nome do remédio) não é comercializado em farmácias e drogarias e o foco do produto não é o paciente final”, afirmou a empresa.

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Comparando as embalagens dos três produtos comercializados em drogarias brasileiras, é possível verificar que não há nenhum deles na imagem que viralizou nas redes sociais.

A foto verificada pelo Comprova não mostra, portanto, nenhum remédio à base de cloroquina ou hidroxicloroquina.

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Nenhuma das duas substâncias tem eficiência comprovada contra o novo coronavírus e medicamentos à base delas devem ser prescritos “em receita especial de duas vias”, informa um comunicado publicado em março pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária.

Comprova
Na imagem acima, embalagens de hidroxicloroquina vendidas em farmácias no Brasil. Abaixo, as embalagens que aparecem na foto, ampliadas com a ferramente InVID (Foto: Reprodução / Comprova)

Por que investigamos?

O Comprova verifica conteúdos que tenham grande viralização e repercussão nas redes sociais. É o caso do post em questão, que teve 3.825 interações no Twitter até 7 de agosto, segundo a ferramenta CrowdTangle.

No Facebook, foram ao menos 7.700 compartilhamentos e mais de 10 mil interações. A maioria das páginas com viralização tratam de notícias locais do Rio de Janeiro, mas o caso também foi divulgado por alguns sites, o mais expressivo da rádio Tupi FM.

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Embora o comércio ilegal seja comum em muitas cidades brasileiras, o post chama a atenção por supostamente mostrar a venda de uma droga que está em evidência no país. Apesar de não ter eficácia comprovada contra a covid-19, o medicamento vem sendo apresentado pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido) como uma possível cura para a doença – ele, inclusive, afirmou ter tomado ao ser infectado pelo novo coronavírus.

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Muitos brasileiros acreditam que a substância seja realmente uma cura, e o post coloca a saúde da população em risco ao afirmar que a droga pode ser encontrada em trens do Rio de Janeiro. Como informado anteriormente, a droga só pode ser vendida em receita de duas vias.

O Comprova tem publicado outros conteúdos falsos relacionados à pandemia, como da médica que disse que a Austrália controlou a covid-19 com ivermectina e do influenciador que negou a eficiência das máscaras.

Falso, para o Comprova, é todo conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.

A checagem acima foi produzida pelo Projeto Comprova, iniciativa que reúne a NSC Comunicação e outros 23 veículos de mídia do país no combate à desinformação.

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