Igreja de pedra de 715 a.C. que abrigou agricultores, peregrinos e padres vira residência na Toscana

Elisabetta Bruscolini e Giancarlo Astrólogo são verdadeiros colecionadores de amigos, objetos e, é claro, casas. Ela é gerente geral de uma escola de cinema na Itália, uma produtora famosa por reconhecer jovens cineastas talentosos e acompanhá-los durante seus primeiros grandes projetos. Ele é um ex-estilista de alta costura que agora coleciona obras de arte. Contudo, embora estejam juntos há 16 anos, nunca sentiram a necessidade de se casarem.

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– Casamento? Não acho que isso seja importante. Um relacionamento é algo que escolhemos a cada dia. Divertimos um ao outro e nunca nos entediamos porque gostamos das mesmas coisas: amigos, conversar, arte, cinema, viagens – afirmou Bruscolini.

E a grande comunidade de amigos que cultivaram se junta a suas famílias estendidas (três filhos adultos e muitos netos), não apenas em Roma, onde vivem a maior parte do tempo, mas também na Toscana, onde passam boa parte do tempo livre.

No começo do relacionamento, reformaram uma casa na cidade toscana de Castelmuzio, preservando meticulosamente o exterior medieval e transformando o interior em um espaço moderno, arrojado e limpo _ o pano de fundo ideal para seu estilo despojado, a coleção de arte (dele) e as fotos antigas de sets de filmagem (dela).

O projeto foi uma colaboração de três anos com uma pequena empresa da Sardenha, a VPS Architetti, liderada por Giuseppe Vallifuoco, um homem com quem Bruscolini viveu durante 13 anos quando seus filhos gêmeos eram pequenos. Algumas pessoas podem achar isso desconfortável, mas Astrólogo explicou, enquanto Bruscolini traduzia do italiano, que “Giuseppe se tornou um dos meus melhores amigos. Somos como irmãos. Não há qualquer atrito quando trabalhamos juntos”.

Astrólogo e Bruscolini, ambos com mais de 60 anos, adoraram a casa. Mas um dia, em 2007, quando caminhavam pelo interior, descobriram que uma esplêndida propriedade que já namoravam há algum tempo, uma grande paróquia ligada a uma velha igreja, estava à venda, afirmou Bruscolini.

– Nós a compramos em dois dias. Fica a um quilômetro da vila em meio a um olival – um lugar mágico – contou.

A igreja de Pieve di Santo Stefano a Cennano foi consagrada católica em 1285, mas data de cerca de 715 a.C. (Eventos como batismos, casamentos e concertos ainda são realizados no local, mas as missas ocorrem na cidade.) Durante séculos, a residência de pedra adjacente abrigou padres, peregrinos, cavaleiros e agricultores.

– Nos primeiros cinco meses, simplesmente desfizemos tudo que havia sido feito nos últimos 100 anos e a estrutura original começou a aparecer. Seguimos a mesma ideia da velha casa: quartos abertos e grandes. Onde os padres dormiam, havia uma grande chaminé e, quando peregrinos paravam no local, também podiam dormir ali. O andar de baixo é onde ficavam os animais – afirmou Bruscolini.

Ninguém imaginava que a reforma da estrutura de mais de 465 metros quadrados que compraram por cerca de um milhão de dólares custaria quase 2,6 milhões de dólares e levaria quase quatro anos para ficar pronta. Contudo, conseguir aprovação para reformar um edifício histórico pode ser quase impossível na Toscana. E esse não foi o único obstáculo.

Acabar com odores antigos e desagradáveis não é um desafio que os arquitetos geralmente enfrentam, mas o fedor era onipresente no andar de baixo, recorda Ilene Steingut, uma arquiteta americana que trabalhou na equipe.

– O cheiro era terrível – afirmou Steingut, uma das três sócias de empresa e atual esposa de Vallifuoco, o ex de Bruscolini. Essa complicação também não parece incomodá-la muito.

Conforme disse Bruscolini:

– Em nosso círculo de amigos, isso não é considerado tão incomum.

Durante séculos, as paredes de pedra porosa do andar de baixo criaram o local ideal para os animais fazerem suas necessidades e a única forma de acabar com o cheiro seria criar uma estrutura de isolamento.

– Para garantir que o cheiro não ressurgisse. Decidimos fazer um sistema de paredes com um espaço entre as estruturas existentes e as novas paredes foram feitas com tijolos de alvenaria ocos – afirmou Steingut.

Muitas das outras paredes da casa também haviam sido aumentadas ou acrescidas ao longo dos séculos e todos os envolvidos afirmaram ter descoberto que lidar com elas seria um desafio igualmente assustador – ou, em outras palavras, um processo de design orgânico.

Mudanças foram feitas durante a construção (bibliotecas escavadas em paredes grossas, janelas internas adicionadas), deixando em polvorosa os funcionários locais, acostumados a trabalhar com projetos pré-determinados.

– No começo os funcionários foram muito resistentes. Mas, ao final, todos ficaram curiosos em relação ao trabalho que estava sendo feito e ficaram satisfeitos com o resultado – afirmou Steingut.

Hoje, o exterior mantém aquela pátina de “velho mundo”. Mas dentro, a casa é um casamento – ou melhor, uma parceria – entre acabamentos modernos e as estruturas originais. A iluminação é sutil, brincando com as obras de arte dos donos e com detalhes arquitetônicos como as enormes vigas do telhado, sem chamar atenção para si. Conforme contou Vallifuoco em um e-mail, a iluminação “está escondida dos olhos, ou emerge de fissuras e buracos nas paredes e no teto”.

Não surpreende que essa casa com lugar para 12 pessoas geralmente esteja cheia de uma mistura internacional de pessoas que adoram as artes. Muitas delas se reunirão lá para o festival de cinema que Bruscolini ajuda a organizar na cidade.

– Nós gostamos de compartilhar essa casa. Como faziam nos velhos tempos – afirmou ela.

Porém, ninguém sabe ao certo quanto tempo o produto final continuará a ser o centro das atenções dos donos. A atração pelas artes e pelo design pode ser um negócio instável.

Recentemente, Astrólogo percebeu que havia superado o período art déco e vendeu quase toda a sua coleção em favor de obras de arte sino-tibetanas de meados do século XX.

Quanto a Bruscolini, depois de terminar a filmagem de seu último trabalho, “Elementary Love” (um filme difícil, com atores pré-adolescentes em todos os papéis principais, afirmou), vai partir para o próximo projeto, uma comédia.

Em um sábado recente, quando esperava pela chegada dos convidados, Bruscolini especulou sobre por que a relação com Astrólogo funcionava e sobre sua próxima colaboração. Ela imagina uma casa em alguma ilha grega, afirmou, bem perto do mar.