O sonho de escrever uma carta para as novas gerações da família fez dona Leonor Rocha ir estudar no auge dos 85 anos. A senhora de cabelos grisalhos e fala cativante integrava até o começo desse ano o grupo de 2% da população não alfabetizada de Santa Catarina. Mas essa história começou a mudar quando ela encontrou o apoio do Instituto Biss. Ali, está aprendendo a formar as primeiras palavras e, menos de um mês após o início das aulas, convenceu a melhor amiga a acompanhá-la.
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Dona Leonor conta ter casado cedo, aos 20 anos de idade, e logo vieram os filhos. Um por ano após a troca de alianças, recorda. Cuidar das seis crianças se tornou prioridade e os estudos foram deixados para trás. O tempo, porém, não tirou a vontade de aprender. O calendário marcava 22 de fevereiro de 2024 quando ela cruzou a porta da sala de aula com o material debaixo do braço. Caprichosa, tudo estava devidamente adesivado com o nome dela, assim como fez quando os filhos foram para a escola.
— Quando soube da escolinha aqui, vim correndo. O meu sonho de aprender é para deixar alguma coisa escrita para os meus bisnetos e tataranetos. Pode ser um bilhetinho — afirmou à NSC TV.
Leonor foi para as primeiras aulas sozinha, mas no dia 7 de março chegou com amiga de longa de data. Dona Eliete, com 72 anos de idade, sabe ler e escrever, embora trocando algumas letras às vezes. Na infância, cursou as séries iniciais, entretanto o estudo também precisou ser interrompido. Hoje, uma vai a casa da outra para fazerem as tarefas juntas. Quando Leonor precisa de ajuda com as atividades, lá está a mão parceria de Eliete, auxiliando com o que pode.
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— Estava falando para o meu que neto que eu ia estudar para ser médica e a Leonor para advogada. Se der nós duas vamos para a faculdade — diz Eliete.
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SC tem 118 mil catarinenses analfabetos
Dados do IBGE apontam que 9,3 milhões de pessoas com 15 anos ou mais não sabem ler e escrever no Brasil. O levantamento revela ainda que o analfabetismo está diretamente associado à idade. Quanto mais velho o grupo populacional, maior a proporção de pessoas que não sabem juntar letras para formar palavras. Em 2023, eram 5,2 milhões de cidadãos com 60 anos ou mais nestas condições, o que equivale a uma taxa de analfabetismo de 15,4% para esse grupo etário.
Ainda segundo o IBGE, Santa Catarina é o terceiro estado do país com o menor índice de analfabetismo. Só perde para o Rio de Janeiro (2,1%) e para o Distrito Federal (1,9%). O Estado teve uma redução na taxa de pessoas sem letramento de 0,2% de 2022 para 2023. Santa Catarina, inclusive, apresenta a menor taxa da região Sul, como mostra a tabela abaixo. Ainda assim, são 118 mil catarinenses que não conseguem escrever o próprio nome ou ler uma embalagem no supermercado.
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Sandra Maria Mueller é professora há 38 anos e começou a lecionar no Instituto Biss em 2023. A experiência de dar aula para adultos é nova, mas em alguns aspectos a tarefa é semelhante a trabalhar com as crianças. Ela conta que as dúvidas sobre construção de palavras, por exemplo, são bem similares, indiferente da faixa etária. O que muda é que quanto maior a pessoa, mais tímido para fazer perguntas, o que exige da educadora um pouco mais de insistência na hora de tirar dúvidas.
A professora recorda de uma das primeiras alunas adultas. A mulher trabalhava em uma cozinha e a nutricionista precisava ler o cardápio para ela saber o que seria preparado no dia. A situação gerava constrangimento, e ela decidiu ir estudar.
— Independente da idade, a alfabetização é uma libertação para todas as pessoas. É estar no mundo com mais dignidade. Poder ser verdadeiramente cidadão e cidadã — frisa Sandra.
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