O Hospital Maicé, no município de Caçador, no Meio-Oeste de Santa Catarina, terá que afastar um médico que teria praticado violência obstétrica e ginecológica contra pacientes atendidas pelo SUS. A medida foi determinada pela Justiça em caráter liminar após o Ministério Público catarinense (MPSC) ajuizar uma ação civil pública. Antes, a Promotoria local já havia recomendado o afastamento dele, mas foi contrariada pela direção da unidade hospitalar, que optou por mantê-lo.

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Uma série de relatos que chegaram ao MPSC mostram que o médico agia costumeiramente de forma agressiva ao realizar atendimentos e exames, descumprindo normas legais e direitos referentes à saúde da mulher e do feto, como o parto humanizado. Ele também chegou a humilhar pacientes. O nome dele não foi divulgado pelo Ministério Público, que revelou o pedido de afastamento.

A Justiça determinou que o médico seja substituído por outro profissional em, no máximo, 30 dias. Até que isso ocorra, ele deverá realizar todos os procedimentos de acordo com os termos fixados pela Organização Mundial da Saúde (OMS), sob pena de multa de R$ 50 mil por descumprimento. Se o hospital não afastá-lo, estará sujeito a uma multa diária de R$ 10 mil, limitada a R$ 1 milhão.

Médico chamou paciente com tumores de “burra, surda e gorda”

O Ministério Público tomou conhecimento do caso por iniciativa das próprias vítimas. Várias delas relataram, por exemplo, que o exame ginecológico de toque do colo do útero foi feito de forma agressiva, o que causou sangramento e dor.

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“Uma das mulheres afirma que a experiência foi tão traumática que nem pensa em ter outros filhos”, escreveu o MPSC ao divulgar o caso.

Uma outra vítima relatou que, após 12 horas em trabalho de parto, previsto para ser normal induzido agendado, foi recriminada pelo médico por ter engravidado em uma idade avançada. O bebê nasceu desfalecido, o que causou preocupação da mãe sobre o motivo de não estar chorando.

— Porque você está chorando por ele — disse o médico à paciente. A criança sobreviveu após ser reanimada por ele, uma vez que não havia pediatra na sala de parto.

Já uma outra vítima foi hostilizada após ter levado exames para marcar a retirada de dois tumores na vagina. Após ser mandada embora pelo médico, a paciente resolveu insistir e foi chamada de “burra”, “surda” e “gorda”. Ela foi submetida à cirurgia por outro profissional, segundo o MPSC.

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— São dezenas de depoimentos relatando situações estarrecedoras vividas diante de um médico que deveria atender de forma acolhedora e humanizada, mas prefere humilhar as pacientes, com palavras e atitudes que ferem a dignidade. Um profissional com essas características não pode estar na linha de frente do SUS — diz a promotora de Justiça Silvana do Prado Brouwers.

A ação civil ajuizada pelo Ministério Público pede, além da troca do médico, que o hospital pague, no mínimo, R$ 300 mil por danos morais coletivos, para compensar os prejuízos das vítimas de discriminação de gênero, e promova capacitação continuada dos profissionais que atuam na área da saúde da mulher.

O MPSC ainda solicita a instalação de um canal de comunicação para que as pacientes possam relatar anonimamente casos de discriminação sofridos no hospital e a adoção de um parto humanizado.

O que diz a gestão do hospital

Ao NSC Total, a direção do hospital, sob responsabilidade da Associação Franco Brasileira – Hospital Maicé, comunicou que encaminharia uma nota em resposta a questionamentos enviados por e-mail, o que não ocorreu até esta publicação. O espaço segue aberto para uma eventual manifestação.

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A reportagem ainda procurou a Secretaria de Estado da Saúde de Santa Catarina (SES-SC), uma vez que o Hospital Maicé também presta atendimentos pelo SUS, apesar de ser gerido por uma associação privada e não fazer parte da rede própria do Estado. Em resposta, a pasta comunicou repudiar veementemente casos de abuso de qualquer natureza e que irá acompanhar e apurar os fatos junto à unidade.

“Por não se tratar de servidor do quadro funcional da Secretaria, não há possibilidade de realização de sindicância. Entretanto, o caso será acompanhado de perto e caso comprovado o fato irá tomar as providências necessárias”, escreveu a SES-SC, em nota.

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