Como muitos blumenauenses, faz 18 dias que Udemar Fidler saiu de casa pensando que voltaria no dia seguinte. Diretor financeiro do Sindicato dos Trabalhadores Têxteis, é chamado à sede do sindicato para ajudar a retirar o material da área alagável do prédio. Seria mais uma vez de outras tantas naquele 1983 chuvoso. Tudo ia para o pavimento superior. Mas desta vez é diferente, e ele acaba ficando incomunicável e longe da família.
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O trabalho de levar tudo para o alto é duro. Estão em poucos. Alguns militares ajudam a carregar os arquivos de metal, a farmácia, consultórios odontológicos e a cantina. A chuva não dá sossego. Termina o trabalho e já pensa em recomeçar. A água ameaça invadir o segundo piso. E invade. Sessenta e cinco centímetros de água barrenta onde parecia impensável.
A chuva caindo insistente no telhado de zinco não sairá mais da memória de Udemar. Raios, bateiras levando doentes para o Hospital Santa Isabel e os helicópteros de socorro formam uma sinfonia angustiante. Por hora, o silêncio da cidade transformada em leito temporário do Rio Itajaí-Açu não alivia a situação. O frio de julho leva aqueles poucos homens abrigados no prédio a buscar no agasalho do time de futebol do sindicato o aquecimento. Para comer, apenas ovos e salsichas cozidas. É o que resta na cantina.
Depois de quase duas semanas, a água avisa que está indo embora durante a madrugada. O prédio treme diante da força da água que escoa na galeria sob a construção. Após o medo de achar que o prédio viria abaixo, Udemar finalmente vai para casa. São três horas para chegar ao Garcia. Magro e barba já grande, é recebido pela esposa. Ela, a salvo, mas sem ter notícias do marido e tendo de aguentar a própria angústia e a dos dois filhos, havia transformado as incertezas em pontos de crochê. A enchente lhe rendeu uma colcha.
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