Naquela tarde de domingo, a vida de três homens confluíram em meio à água carregada de lodo que tomava conta das ruas centrais de Guaramirim. Haviam passado poucos minutos do meio dia e o prefeito da cidade, Lauro Frolich, decretara estado de calamidade pública. Após passar uma noite ilhado em Jaraguá do Sul, Reginaldo Dias conseguiu retornar à Guaramirim e foi até o ponto mais próximo de sua casa, que conseguiu atingir a pé.
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Separado pelo rio que se formou, ele queria chegar perto da filha Vania Jaqueline, 27 anos, que estava presa na casa inundada e sem condições de sair.
– Aí apareceu essa boa alma, graças a Deus – diz Reginaldo.
Um mês depois do fatídico 8 de junho, Reginaldo reencontrou o homem que resgatou a sua filha. Adelar Grzybowski empurrava o barco de metal com um remo improvisado desde a madrugada de domingo. O equipamento foi emprestado do bairro Guamiranga para trazer ajudantes até o Mercado Pimentel. Lá, o grupo ajudou a erguer as mercadorias – ação que se mostrou de pouca eficácia, já que 70% do estoque deve se ter descartado.
Motorista do mercado, Adelar chegou ao estabelecimento sábado à noite e ficou alguns dias sem dormir. Com o estabelecimento inundado, ele usou a embarcação para ajudar outras pessoas. Tímido, não se vangloria do ato. Ao contrário, quase minimiza a ação.
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– Não tinha mais o que fazer no mercado. Havia poucos barcos na cidade e fui ajudar. Tirei muitas pessoas das casas, algumas desesperadas – conta Adelar, com a simplicidade que lhe é característica.
Adelar remou por mais de 24 horas auxiliando a população. O PM Lino também auxiliou. Reginaldo e sua filha Vania foram uma das famílias resgatadas
Marcas profundas
Enquanto esperava para encontrar um meio de chegar à casa da filha, Reginaldo deparou-se com o cabo da Polícia Militar, Roberto Lino da Silva. Mesmo em licença, Lino vestiu a farda e foi até o Centro da cidade para ajudar as pessoas atingidas pela enchente. Encontrou Reginaldo falando de sua filha e avistou o barco de Adelar. Unidos, os três partiram para o resgate.
– Eles nem pensaram duas vezes para me ajudar – sorri Reginaldo, lembrando do alívio que sentiu ao reencontrar a filha.
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Após o resgate, cada um seguiu o seu destino. Adelar guiou o barco pelas ruas da cidade até a manhã de segunda-feira. Ao todo, calcula ter socorrido 20 famílias. Lino conseguiu outro barco e foi até o bairro Corticeira ajudar os atingidos. Ele estima ter ajudado entre 15 e 20 pessoas. Reginaldo instalou-se em sua loja de placas com o único colchão resgatado da casa, enquanto a filha foi acolhida na casa de amigos.
Hoje, Reginaldo aguarda a liberação do FGTS para substituir os móveis estragados pela enchente. Como tantos outros moradores do Vale do Itapocu, qualquer menção de chuva é sentida com preocupação. Lino ajuda a esposa a reconstruir o negócio de estética em um novo endereço. Adelar não teve a casa atingida, mas a lembrança não sai da sua cabeça.
– Pensei que poderia ser a minha família no lugar dos atingidos pela chuva. Não aguentei ver o sofrimento dos outros. O que senti foi alívio de poder ajudar – resume.
Pontes atingidas são recuperadas
Em uma das maiores enchentes da sua história, Guaramirim calcula R$ 21 milhões em prejuízos no setor público e R$ 190 milhões no setor privado, que inclui indústrias, comércio e agropecuária. Dos R$ 409 mil prometidos pelo governo do Estado logo após a enchente, apenas R$ 204 mil tiveram o repasse confirmado no “Diário Oficial”.
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Conforme o prefeito Lauro Fröhlich, as enchentes no Oeste de SC podem ter impactado no corte da verba direcionada ao Vale do Itapocu, já que 36 cidades dividiram os R$ 4,5 milhões destinados pelo Ministério da Integração Nacional.
Atualmente, a Prefeitura prioriza a recuperação de pontes importantes, como a do Agricultor, no bairro Guamiranga, que está sem passagem e tem um projeto orçado em R$ 383 mil. A verba já foi garantida pelo Fundo Social do Estado, porém o valor ainda não foi liberado. A empresa responsável pela obra já foi licitada e a expectativa é de que o trabalho comece na próxima segunda-feira.
Outras duas pontes importantes que precisam ser reformadas: as dos rios Putanga e Putanga Velho. Hoje, apenas carros leves passam pelo local. Fröhlich explica que será necessária uma recuperação provisória, mas novas estruturas terão de ser construídas. Outras pontes, como a que liga Guaramirim a São João do Itaperiu, já foram reformadas.
Segundo a Defesa Civil, 120 casas estão interditadas, mas o número varia de acordo com as liberações.
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