O chef de cozinha francês e um dos grandes nomes da gastronomia internacional, Claude Troisgros, abriu o ciclo de palestras no segundo dia da Expogestão 2019, nesta quarta-feira (15) na Expoville, em Joinville. Em sua participação, o CEO do Grupo Troisgros no Brasil falou sobre a sua relação com a cozinha e a paixão por inovar apostando na conexão entre as culinárias francesa e brasileira.
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Na Expogestão ele compartilhou a história inspiradora dele mesmo, um homem que despontou para o empreendedorismo por incentivo da família e ganhou o mundo por sua alta gastronomia – liderando uma rede de restaurantes. Carregando o sobrenome que promoveu um movimento importante na década de 60, conhecido como ‘A nova cozinha Francesa’, foi em meio a este universo que ele cresceu e deu os primeiros passos na profissão.
— Minha paixão começou da tradição familiar, dos Troisgros, que eram três cozinheiros gordos. E se reparar “trois” é três; “gros” é gordos, um nome que tem tudo a ver com a culinária e com a comida — brinca Claude.
O palestrante conta que aprendeu a lidar com a cozinha ainda criança, quando as brincadeiras com os irmãos e os primos aconteciam justamente na cozinha do restaurante dos avós, em Roanne, na França. O pai e o tio de Claude também eram cozinheiros e rodaram o país buscando novos sabores, tornando o negócio da família promissor e reconhecido em todo o mundo.
— O movimento iniciado pelo meu pai era para conhecer as tradições regionais e não para negá-la. Pelo contrário, era ir além e colocar a criatividade à frente, para valorizar o produto da estação e o pequeno produtor. Era levar modernidade à cozinha tradicional francesa e eu cresci em meio a essa transformação — conta.
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O legado permaneceu e assim como as gerações passadas, antes de desembarcar no Brasil, Claude já havia cozinhado e ido ao encontro de referências em Paris, na França, e em países como Inglaterra, Irlanda, Itália e Alemanha. Outros familiares seguiram os mesmos passos e hoje são 11 os chefs de cozinha da família ao redor do mundo.
— Aprendi tudo na cozinha da vovó, onde cada prato era feito com amor. Essa é uma lembrança emocional, porque envolvia uma comida caseira, cozinha de alma, de panela. Eu cresci ali, ajudando a descascar batata e recebendo pescadores, produtores e caçadores. Era um dia a dia incrível e de aprendizagem — recorda.

O despertar da cozinha franco-brasileira
Em uma dessas idas e vindas, Claude escolheu viver no Brasil devido ao espírito viajante que nutria, quando tinha 24 anos. O pai havia perguntado quem gostaria de se aventurar e conhecer a culinária do Brasil e ele não exitou e aceitou o convite. Assinou um contrato de dois anos em 1979 para trabalhar em um badalado restaurante em Copacabana, no Rio de Janeiro.
— Quando cheguei, encontrei um Brasil tímido na gastronomia – com uma culinária regional muito forte e outra internacional, que, na verdade, eram cardápios da França, Itália e Portugal, sem uma identidade específica. Cheguei com uma culinária nova e não tinha produtos para organizar uma cozinha francesa tradicional, mas tinha na minha frente produtos tropicais (goiaba; batata baroa; aipim; farinhas; maracujá). Então, por necessidade comecei a envolver os produtos brasileiros dentro de uma culinária de técnica francesa — conta.
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Segundo Claude, ele nunca teve a pretensão de, naquele momento, criar algo novo ou uma “nova cozinha brasileira” a exemplo do conhecido movimento francês. “Só queria um produto bom para oferecer para o meu cliente”. A proposta, porém, foi além, e ele viajou o Brasil todo para conhecer as cozinhas de cada região do País e entender as tradições dos povos, dos produtos e da culinária local. Virou uma espécie de “cozinha franco-brasileira”.
Tamanha descoberta o fez refletir e ao fim do contrato com a empresa que o trouxe ao País, ele não exitou e decidiu construir suas próprias raízes no Brasil.

O caminho para o reconhecimento
— Sem um tostão, liguei para meu pai e disse que decidi ficar no Brasil, porque o país me acolheu e eu queria ficar aqui. Pedi um dinheiro emprestado para começar e recebi a melhor resposta que um pai pode dar a um filho: “Não! Se vira”, e foi o que me forçou a me virar — revela.
O não serviu como incentivo e o levou a montar em 1981 em uma galeria no Leblon, no Rio de Janeiro, seu primeiro restaurante. Em que ele fazia as compras, cozinhava e ainda lavava a louça. Tudo em um espaço que cabiam apenas 18 banquetas e era equipado por um fogão e uma geladeira usados.
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— Foi um sucesso, pela boa comida, mas principalmente por sorte — afirma.
A sorte foi a escolha do nome do restaurante, ‘Roanne’, em homenagem à cidade em que a família fez fama na gastronomia. José Bonifácio de Oliveira (Boni), ex-chefe da Rede Globo, e o jornalista Armando Nogueira conheciam o restaurante na França e, mesmo não sabendo que ele era herdeiro da família, decidiram jantar no restaurante carioca. Após aprovarem a comida, o ambiente se tornou em um point de estrelas de TV, permitindo a expansão dos negócios.
Entre 1992 e 1997, Claude chegou a mudar para Nova Iorque e deixou seu primeiro funcionários e fiel escudeiro na cozinha, Batista, tocando os restaurantes cariocas. No período, apresentou a união das culinárias da França e do Brasil aos americanos e levou as tão sonhadas três estrelas do jornal The New York Times.
Ao retornar ao Brasil em 1998, também por acaso apresentou a proposta de um programa de gastronomia para a TV a uma executiva do Grupo Globo e há 15 anos mantém no ar programas televisivos na área.
— Sou uma pessoa que acredita no Brasil e nos últimos anos repensei meus conceitos de negócio. desde 2017 decidi me aproximar um pouco mais da realidade e deixar de lado uma gastronomia que atinja só um público para abrir as portas e a mente para uma gastronomia boa, mas mais acessível ao consumidor. Não só em preço, mas em paladar, onde a pessoa se reconhece através de certos produtos, técnicas e sabores — entrega.
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Novos projetos
O novo caminho traçado pelo profissional aos 63 anos o fez criar propostas inovadoras, uma delas no mesmo espaço em que havia aberto seu primeiro negócio há 40 anos e que, segundo ele, está rendendo frutos. Trata-se de um projeto em que a cozinha fica instalada no meio do ambiente e é possível que os clientes se sintam em casa e possibilitem ao chef cozinhar junto com os consumidores.
— Nessa nova fase, desconstrui tudo. Não tem mais couvert, não tem mais toalha de mesa e a comida é de panela, para compartilhar e está tendo um retorno inacreditável — destaca o profissional, que planeja ainda aumentar seus esforços em filantropia e em um programa em canal aberto de TV.