– Me machuco bastante, já não sou mais tão nova, mas não consigo parar – confessa Molly. Dos 31 anos de vida, ela passou 22 dançando diversos estilos. O breaking, sua atual paixão, a que “machuca”, entrou no seu caminho há sete. Os dias da nutricionista são agitados, cheios de trabalho, mas ela não abre mão de dedicar o tempo livre aos passos e “ensaia quando dá, de manhã, à noite, sábado…”. Ela é a única mulher do Nos Trink Criu, um dos cinco crews (equipes) que dançam o estilo original do movimento hip hop.
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Hoje é fácil encontrar grupos de dança urbana, ou de rua, em eventos e apresentações na TV. O Prêmio Revelação do Festival de Joinville deste ano foi dado à companhia local Maniacs Crew – uma das várias participantes do estilo. Apesar da temática e de serem confundidas com o movimento, a dança que realmente representa o hip hop é o b-boying – também chamada de breaking, mas ainda mais conhecida como breakdance.
Surgido nos guetos negros e latinos da Nova York dos anos 1970, era mais do que expressão corporal. Batalhas de dança entre b-boys rivais amenizam a violência das gangues, que aterrorizava os bairros pobres da cidade americana na época. A energia dos jovens era canalizada em treinar e ser a melhor equipe. Era um refúgio social.
Mais de 40 anos depois, Wagner Wagz é um legítimo representante dessa filosofia em Florianópolis. Além de b-boy, é grafiteiro e trabalha exclusivamente com o hip hop. Até o ano passado dava aulas de b-boying para crianças do ensino fundamental em cinco colégios estaduais com o projeto Escola Aberta do Governo Estadual. Ele e Molly são dois dos 12 membros do Nos Trink Criu, uma crew de estudos e arte-multiplicadora da cultura hip hop.
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– Dançar pra mim é demonstrar o amor e o prazer pela vida, compartilhar felicidade e quem sabe poder mudar a vida de alguém por meio desse ato – diz Wagner.
Ele começou a dançar aos 15 anos, encantado com um grupo que ensaiava os passos na esquina da sua rua. O conhecimento da cultura hip hop veio depois, nas viagens, estudos e conversas com os mais velhos. Hoje, ele vive de sua arte e dos workshops que promove.
Individualidade é fundamental
– O breaking nasceu da necessidade de se apresentar como indivíduo, então a unicidade e o estilo pessoal são essenciais na dança – afirma Molly.
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As jaquetas estilosas, os tênis coloridos e os bonés virados são parte dessa construção de identidade. Desde o início do breaking, era comum ver pentes ou escovas de dentes – usadas para limpar os tênis nos intervalos – espetados nos cabelos dos dançarinos. Molly, por exemplo, não consegue dançar se não estiver vestida como gosta.
Marcar seu estilo também é essencial: a partir dos passos básicos top rock (em pé), footwork (trabalho dos pés executado no chão), powermove (movimentos giratórios) e freeze (congelar o corpo em uma posição difícil), os dançarinos usam a criatividade. Incorporam movimentos da dança contemporânea, por exemplo.
O breaking é um estilo de vida, uma escolha feita por milhões de pessoas ao redor do globo. O pequeno número de crews em Florianópolis une seus integrantes em torno da dança, mas as equipes estão sempre viajando para festivais e a integração é grande.
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A rivalidade se transformou em algo que une. Molly diz que há um reconhecimento imediato:
– É fácil socializar com a dança. Já participei de rodas em vários Estados do Brasil e em Nova York e Miami também. É só se apresentar para ser aceito.
As origens
O ritmo dançante das batidas e versos do rap que surgia nos guetos do Bronx, em Nova York, nos anos 1970 embalava os frequentadores das famosas Block Parties, as festas que reuniam multidões nas ruas. Balançar os quadris, mexer os pés, agitar as mãos, incorporar o ritmo, suar. Dançar, enfim, era a resposta natural, primal, àquela revolução de sons.
Com influências como danças latinas e africanas, sapateado, capoeira, os passos do showman James Brown, a ginástica olímpica e filmes de artes marciais, esses dançarinos forjaram um novo estilo, enérgico, acrobático e original. Em inglês, hip significa “cintura”, e hop “pulo”. Mexer os quadris e saltar. A dança, então, dava nome à manifestação artístico-cultural que surgia: hip hop.
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Nascia o b-boying ou breaking, depois chamada de breakdance pela mídia. O estilo ficou conhecido em uma cena do sucesso do cinema Flashdance, de 1983, e ganhou o mundo.
Michael Jackson passou a usar passos do locking e popping, variações do break, e ter crews virou moda. Nessa época, uma equipe chamada Automatic Breakers foi pioneira do estilo em Florianópolis.