Com 40 anos feitos no último dia 11, o candidato das oposições à presidência da Venezuela, Henrique Capriles, é um político maduro, que se diz empenhado em mudar o país governado pelo rival Hugo Chávez desde 1999. Nesta entrevista a ZH, concedida por e-mail após três meses de contatos, Capriles faz coro com a presidente Dilma Rousseff: a entrada da Venezuela no Mercosul deve ser o ingresso de um país, e não de um governante – sem o personalismo do adversário, de quem evita citar o nome.
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Ao falar do Brasil, também não perde a oportunidade de cutucar o rival. Diz que a Venezuela tem muito a aprender com a “alternância” brasileira – Chávez está há 13 anos no poder e tenta ficar 20.
Aludindo aos longos discursos do adversário, Capriles assegura que falará menos e trabalhará mais. Também diz que manterá os programas sociais (a vitrina chavista), “mas sem que nenhum venezuelano se sinta obrigado a vestir a camisa de uma cor para obter a ajuda de que necessita”. Na política internacional, outra frase dirigida ao rival:
– Evitaremos confrontos e o uso do petróleo como ferramenta política para impor nossas visões (uma prática chavista).
Confira trechos da entrevista:
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Zero Hora – A Venezuela está ingressando no Mercosul, e a presidente Dilma Rousseff disse aos críticos que se trata da entrada de um país, e não de um governante. Como o senhor vê isso?
Henrique Capriles – Coincido com a afirmação da presidente Rousseff. O ingresso no Mercosul ou em qualquer outro sistema de integração significa a entrada de um país, não de um governante. Uma das coisas que sempre dizemos é que temos de resgatar essa institucionalidade. A presidente do Brasil entende bem, porque pertence a um país que vê as relações internacionais como relações entre Estados e não como de indivíduos que governam. No nosso país, a atuação tem sido baseada em uma política exterior ideologizada, baseada nos interesses do governo de turno e não nos dos venezuelanos. Os setores produtivos, as empresas, os trabalhadores do nosso país não foram consultados em nenhum momento sobre o ingresso no Mercosul nem sobre a retirada da CAN (Comunidade Andina).
ZH – Há algumas situações delicadas. Chávez rompeu com Israel e é amigo do iraniano Mahmoud Ahmadinejad, e o Mercosul tem intensas relações com Israel. Como fica isso?
Capriles – Efetivamente, é uma contradição desenvolver uma política externa comum dentro do Mercosul com diferenças tão marcantes nos relacionamentos com diversos países. Por exemplo, Brasil e Argentina não têm relações diplomáticas com o Irã na mesma intensidade que tem a Venezuela. A Venezuela rompeu relações diplomáticas com Israel, mas terá, com o ingresso no Mercosul, de se adequar a acordos comerciais com terceiros, o que inclui Israel e outros países. Além disso, este governo, que tanto critica os acordos de livre comércio, aceita, no protocolo de adesão ao Mercosul, alcançar o livre comércio com esses países e programas de liberalização comercial. Acreditamos na integração dos Estados, mas essa integração deve se traduzir em benefícios para o nosso povo. Nossa integração nesse ou em outros processos não se baseará em uma pessoa, mas nos lineamentos de uma política exterior.
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ZH – Como o sr. analisa a situação do Paraguai? Foi justo suspendê-lo do Mercosul e foi certa a atuação do chanceler venezuelano, que se reuniu com militares paraguaios em Assunção?
Capriles – Não nos meteremos na política interna de outros Estados, e durante meu governo nossa atuação internacional será regida pelos princípios do direito internacional, do respeito e da não-intervenção nos assuntos internos dos outros países. Também entendemos que cada país tem suas leis, pelas quais se regula, e respeitamos. Mas, pessoalmente, creio que o povo é quem tira e põe um mandatário. Não concordo que seja um grupo de congressistas que tenha o poder para julgar o presidente. Respeitamos as decisões tomadas pelos demais países, mas acreditamos na vontade popular.
ZH – Em termos econômicos, a Venezuela está demasiadamente dependente do petróleo?
Capriles – Pretendemos fazer da Venezuela um país que não dependa única e exclusivamente do petróleo, queremos fazer do petróleo uma alavanca para diversificar nossa economia.
ZH – Quais seus planos em relação ao Brasil?
Capriles – O Brasil é um país que admiro e respeito por tudo o que conquistou. Temos muito o que aprender com o Brasil em relação a suas políticas de inclusão social, de respeito pelo seu setor empresarial de direitos humanos e, sobretudo, de uma democracia baseada em princípios de respeito e alternância no poder. Vamos manter relações de harmonia com todos os países da região, sempre e quando os acordos e convênios se traduzam em benefícios para a nossa economia e o nosso povo.
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ZH – O presidente Chávez usa seus problemas de saúde como marketing eleitoral?
Capriles – Não vou fazer eco para rumores. Sobre a saúde do outro candidato, conhece-se o pouco que o governo nos disse. Só posso dizer que espero que se recupere plenamente, participe das eleições e seja testemunha da mudança que virá para a Venezuela.
ZH – O sr. acredita que finalmente uniu a oposição venezuelana, depois de tanta desunião?
Capriles – Aprendemos com nossos erros. Fizemos um processo de primárias, e ali foram os venezuelanos que elegeram minha candidatura para liderar esse processo. Sou o capitão de um time formado por milhões de venezuelanos.
ZH – O que o sr. manteria do atual governo e o que mudaria?
Capriles – Para ter igualdade e justiça, precisamos de independência de poderes e instituições. Vamos ser um governo que falará menos e trabalhará mais. Nossa prioridade é o social. Vamos manter os programas sociais, mas sem que nenhum venezuelano se sinta obrigado a vestir a camisa de uma cor para obter a ajuda de que necessita (prática que a oposição diz ser implementada pelo presidente).
ZH – E na diplomacia, o que deve mudar?
Capriles – Acreditamos em uma diplomacia independente, construtiva, integracionista e de muito respeito em relação às outras nações. Evitaremos os confrontos e o uso do nosso petróleo como ferramenta política para impor nossas visões.
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