Um dos mais especialistas no mundo em tempestades severas, o doutor Harold Brooks visita Santa Catarina esta semana para participar do congresso Semana Estadual da Defesa Civil 2016, realizado em Florianópolis. Ele conversou com o Diário Catarinense sobre prevenção e alerta de desastres naturais:

Continua depois da publicidade

Falta de diálogo entre Defesa Civil e operadoras emperra projeto de alerta em SC

No ano passado, a região Oeste foi atingida por um forte tornado e na última semana foram microexplosões. Por que o Estado de Santa Catarina é alvo de tantos desastres climáticos provocados por tempestades severas?

O Sul do Brasil e o Norte da Argentina é possivelmente a segunda região mais propícia a ter tempestades severas no mundo. Há alguns ingredientes geográficos que ajudam a entender esse processo. O que acontece no Brasil é que os ares quentes e úmidos da Amazônia se chocam com o ar seco e frio vindo dos Andes.

Continua depois da publicidade

Essa geográfica é propícia tanto ao aparecimento de tornados como de microexplosões?

Tornados são mais frequentes em regiões de grandes montanhas, já microexplosões ocorrem em todos os tipos de relevo.

Em eventos como tornados ou vendavais, é impossível evacuar uma região que será afetada, pois o alerta é feito poucas horas antes da área ser atingida. No entanto, como reduzir os impactos de um desastre desse tipo?

Há várias ações que podem ser implementadas, basta planejamento. Isso envolve até a forma como as construções domésticas serão feitas. Não se deve necessariamente evitar os danos, mas sim reduzir esse impacto. A estrutura de uma casa, por exemplo, precisa ser resistente o suficiente para que os moradores possam se abrigar em segurança. Pessoas precisam estar cientes de onde devem ir em casos extremos.

Continua depois da publicidade

Como funciona esse processo de educação para ações em desastres naturais nos EUA?

Em regiões que são frequentemente atingidas, como o Estado de Oklahoma, se aprende desde criança. Minha filha tem seis anos e já teve instrução na escola para aprender o que fazer em caso de um tornado.

Na microexplosões que atingiram duas cidades catarinense na semana passada, os moradores não foram alertados com antecedência. Como funciona o aviso de alerta de desastres nos EUA e como isso pode ser adaptado ao Brasil?

O modelo norte-americano de comunicação de previsão de desastres foi construído nos últimos 60 anos, existe um planejamento em diferentes escalas em nível nacional, então é algo complexo. Acredito que isso dificulte o Brasil de copiá-lo. A Defesa Civil aqui deve produzir um sistema próprio, de repente se espelhando em países em condições similares, como Argentina, Chile, Uruguai e Paraguai. As ameaças de desastres são bem parecidas nesses países sul-americanos. Uma das coisas que é preciso descobrir é uma previsão a longo prazo. O moradora precisa estar ciente que algo pode acontecer hoje ou amanhã, assim vai ficar atento a qualquer alerta.

Continua depois da publicidade

Esses procedimentos mudam de acordo com o tamanho das cidades ou são similares?

O tamanho da cidade só difere em caso da capacidade de resposta no pós-desastre. Claro que em grandes cidades haverão mais pessoas afetadas, mas também teremos mais pessoas para ajudar na recuperação dessa área, em responder aos danos.

Como especialista no assunto, qual a principal dica que o senhor daria à Defesa Civil SC e a moradores de áreas de risco no Estado?

Tempestades severas vão acontecer, e podemos fazer ações para diminuir os danos, mas nunca evitá-los completamente. Em um curto prazo, entre 15 min a 30min, podemos tomar atitudes que protegem vidas. Esse preparo é importante e nos ajuda a seguir com nossas vidas.

Continua depois da publicidade

VEJA A DIFERENÇA ENTRE SISTEMAS DE ALERTA DE DESASTRES

Nos EUA

Como funciona o alerta para desastres naturais nas cidades que integram a região de Tornado Alley, nos Estados Unidos, onde fica o principal corredor de incidência de tornados no mundo:

1- Monitoramento:

O monitoramento meteorológico nos EUA é feito sem interrupções e, caso a tempestade seja caracterizada como severa (quando há risco de formação de tornados), um meteorologista fica acompanhando apenas aquela formação de nuvens, como um controlador de voo.

2- Comunicação:

O mesmo meteorologista fica responsável por emitir alertas para um sistema de informação para regiões onde está o tornado e para onde ele deve seguir. Órgãos públicos e de defesa civil, além de meios de comunicação, empresas e até escolas, ajudam a propagar o alerta, que é feito pouco tempo antes do aparecimento dos tornados – cerca de 20 minutos.

Continua depois da publicidade

3 – Família:

Desde a escola primária, crianças são educadas e treinadas sobre a importância de como proceder em casos de desastres naturais. Isso se reflete no comportamento dos adultos. Por isso, empresas, escolas e áreas residenciais já têm planos de ação em casos de emergência. A principal ordem é encontrar o lugar mais seguro possível em pouco tempo.

4- Pós-tragédia:

Além dos cuidados para encontrar um bom abrigo ou área segura antes da passagem de um tornado, é preciso ter atenção após o desastre. Nos EUA, é comum a força do vento derrubar poste de energia e ainda explosões em sistemas de gás encanado. Por isso, a preparação da população daquele país também inclui regras de procedimento pó-tragédia.

Em Santa Catarina

Passa pelo Oeste de Santa Catarina o segundo maior corredor de tempestades severas do mundo. No entanto, o Estado ainda não possui um sistema de alerta em operação para ajudar moradores de áreas afetadas.

Continua depois da publicidade

1- Monitoramento:

A previsão meteorológica no Estado é feita pela Epagri/Ciram. Desde abril, o radar meteorológico de Lontras voltou a operar. Ele foi utilizado na previsão da tempestade que atingiu o Estado no Domingo. Mas os dados não foram tão precisos para prever as microexplosões em Ponte Alta do Norte e Porto União.

2- Comunicação:

A Epagri/Ciram e Defesa Civil SC fazem previsão apenas de tempestades e informam isso em redes sociais. Um sistema de mensagem via SMS foi desenvolvido em 2014 e ainda não está em funcionamento por falta de acordo entre Estado e operadoras de telefonia.

3 – Família:

A Defesa Civil SC informa que faz campanhas publicitárias para informar como moradores devem proceder em caso de desastres natural.

Continua depois da publicidade

4- Pós-tragédia:

Não há qualquer tipo de protocolo de dicas sobre o que a população de áreas atingidas devem fazer após uma tempestade severa.

No Rio de Janeiro

Em 2011, desastres naturais provocados por fortes chuvas na região Serrana do Rio de Janeiro resultaram no maior desastre natural da história do Brasil, com mais de 500 vítimas fatais. Nova Friburgo foi um dos municípios mais afetados. Após a tragédia, a Defesa Civil da cidade desenvolveu um sistema de alerta via SMS, que é aplicado até hoje. Esse sistema foi premiado internacionalmente e serviu de modelo para o desenvolvido pela Defesa Civil SC.

1- Monitoramento:

A previsão meteorológica é feita através de radares meteorológicos e medidores de umidade. De acordo com o subsecretário da Defesa Civil de Nova Friburgo, Robson José Teixeira, o órgão municipal recebe informações do Cemaden para detectar desastres.

Continua depois da publicidade

2- Comunicação:

Quando há a indicação de uma tempestade severa ou cheia de rios, uma equipe se reúne e decide se emite ou não mensagens via SMS para 20 mil pessoas cadastradas no município, que tem 200 mil habitantes. Além disso, quarenta sirenes espalhadas em áreas de risco ajudam a alertar a população. Afirma o Teixeira: “O número de 20 mil moradores cadastrados parece baixo, mas esses moradores são multiplicadores de informação. Eles avisam amigos e parentes que não estão no cadastro”.

3 – Família:

Para preparar os moradores sobre como proceder em casos de desastre natural, a Defesa Civil de Nova Friburgo realiza pelo menos duas vezes por ano treinamentos de proteção e evacuação em todos os bairros da cidade.

4- Pós-tragédia:

Os treinamentos incluem como proceder após enchentes e tempestades. Inclusive, onde pessoas desabrigadas podem procurar ajuda, como escolas e outros prédios públicos previamente escolhidos para atender vítimas.

Continua depois da publicidade