Depois de uma viagem de ônibus até a República Dominicana, conexão em dois países de avião e três dias atravessando o Brasil a partir do Acre, o haitiano Frantz Emmar Juerier, 41 anos, chegou, no ano passado, em terras catarinenses.
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Na visão de Frantz, todos os haitianos estariam no Brasil se pudessem. E muitos escolheriam Santa Catarina para viver, segundo ele. Hoje, o Estado é um dos mais procurados pelos imigrantes do país caribenho, que foi arrasado por conflitos civis e um terremoto em 2010.
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O haitiano trabalha de carteira assinada como tintureiro na fábrica de fios têxteis Círculo, de Gaspar, onde ganha pouco mais de R$ 1 mil e benefícios trabalhistas, como vale transporte, alimentação na empresa e ambulatório.
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Segundo o diretor de Recursos Humanos da Círculo, Bonifácio Rodrigues, Frantz é um funcionário exemplar e um líder nato. Tanto é, que trouxe para a empresa outros 18 haitianos, alguns que já moravam em Santa Catarina e outros do próprio país. Ele foi o primeiro a chegar em Gaspar e hoje já são mais de cem haitianos vivendo na cidade.
Com um português fluente, Frantz ensina o idioma para os funcionários uma vez por semana na empresa. No Haiti, ele era agricultor e professor de literatura francesa e línguas.
– No Haiti, a gente não tinha uma coisa específica para fazer. Não tinha um emprego. Só na escola eu tinha uma oportunidade, porque dá para fazer uma escolinha em qualquer lugar, por exemplo debaixo de uma árvore. Eu ensinava literatura, espanhol, francês e inglês no nível básico.
Frantz trabalhou em outros três empregos no Estado, mas segundo ele o dinheiro que ganhava não dava conta de sustentar a mulher e os quatro filhos, que ainda moravam no Haiti.
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Quando começou a trabalhar como tintureiro em Gaspar, aconselhado pelo pastor da igreja evangélica que frequentava em Pouso Redondo, o haitiano recebeu um empréstimo da empresa para trazer a família ao Brasil. A esposa também está empregada na Círculo hoje, na área de acabamento, e o filho mais velho, prestes a ingressar.
O diretor de RH conta que os funcionários brasileiros da empresa se envolveram com a situação dos haitianos em Gaspar, doando móveis e outros artigos para a casa. Aliás, os funcionários acabam se envolvendo talvez mais do que imaginavam com o drama dos imigrantes, como demonstra o supervisor da tinturaria Luis José da Silva.
– Notei que um deles não estava bem. Conversamos e ele me contou que o atravessador que está fazendo o caminho com a sua mulher no Peru está pedindo mais dinheiro. Agora ele não está conseguindo falar com a esposa e está muito preocupado – conta.
Apesar de o governo brasileiro dar toda a documentação necessária para que os haitianos que chegam ao Acre consigam emprego no Brasil, a maioria dos imigrantes ainda sai do país sem documento algum, tendo que se submeter à rota ilegal e aos atravessadores, que cobram caro pelo transporte.
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Frantz conta que ouviu dos muitos soldados catarinenses em missão de paz da ONU no Haiti, liderada pelo Brasil desde 2004, que Santa Catarina seria um lugar de oportunidades. E, apesar das dificuldades para chegar (sua mulher passou uma semana em viagem com atravessadores), o haitiano diz que só no Brasil conseguiu sonhar com um futuro melhor.
– Aqui conseguimos um visto e um trabalho que paga nosso sustento, o que era impossível no Haiti. Para todos os haitianos o Brasil é o país mais querido do mundo – disse.
Escassez de mão de obra estimula contratação
A maioria dos haitianos em Santa Catarina trabalha em três grandes setores: na agroindústria, especialmente nos frigoríficos, no setor têxtil, e na construção civil. A informação é do presidente da Câmara de Relações Trabalhistas da Fiesc, Durval Marcatto. Segundo ele, todos os haitianos empregados no Estado estão em situação regular, seja com visto de trabalho ou solicitantes de refúgio, com carteira de trabalho em mãos, o que dá segurança jurídica às empresas contratantes.
Marcatto explica que o cenário de pleno emprego no país hoje dificulta o preenchimento de vagas de baixa qualificação. E na indústria catarinense, ele diz, há uma dificuldade permanente de encontrar estes trabalhadores, que estaria sendo amenizada pelos haitianos.
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Muitos dos imigrantes, de acordo com o presidente, saíram do Haiti sem ter ao menos uma formação escolar básica. É por isso que algumas empresas catarinenses, percebendo a capacidade destes trabalhadores, estão investindo em capacitação.
No total, 180 haitianos, trabalhadores das empresas Metisa, de Timbó e BRF, de Chapecó, receberam do Sesi cursos de língua portuguesa. A Videplast, de Videira, vai iniciar neste ano uma turma com 80 imigrantes.
Já o instituto Euvaldo Lodi (IEL) da Fiesc ofereceu um encontro para 30 jovens haitianos, filhos dos funcionários das empresas, para apresentar alternativas de inserção no mercado de trabalho. A ação viabilizou a contratação de sete jovens da turma.
O diretor do Sistema Nacional de Empregos (Sine) em Santa Catarina, Edilson Godinho, esclareceu que as vagas preenchidas por haitianos são pouco procuradas por brasileiros. E que inclusive a alta demanda por mão de obra na indústria catarinense daria conta de empregar os haitianos e também catarinenses interessados.
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