Por Fabrício Vitorino

Jornalista, gerente digital da NSC e mestre em cultura da Rússia

Uma jovem segura um cartaz em branco, em frente a um ponto turístico. De repente, policiais chegam e a prendem. Outra jovem segura uma placa, com um dos mandamentos de Deus: “Não matarás”. Em seguida, também é detida. Em outra parte do país, uma jovem grava um vídeo para o TikTok, em frente a um monumento, na capital. O que acontece? É presa. Crianças, que seguravam placas “não à guerra”, também foram presas, junto com seus pais.

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As cenas descritas acima não são surrealismo. Elas aconteceram na última semana, em diferentes partes da Rússia. A guerra desencadeada após a invasão à vizinha Ucrânia mobilizou um aparato repressivo que vai entrar para a história por sua intransigência. Nesta semana, os dois primeiros casos baseados na nova lei que criminaliza a “disseminação de fake news”, com punição de até 15 anos e prisão, foram a julgamento, na cidade de Tomsk. A infração de ambos? Contestar, na internet, a “guerra” (que na Rússia precisa ser chamada de “operação especial”.

A semana foi marcada pela subida de tom dos principais líderes do conflito. Enquanto Vladimir Putin ameaçou traidores da pátria (soldados desertores, capturados e russos que protestam contra o conflito), e fala abertamente em punir os Estados Unidos e o Ocidente, Volodymir Zelensky aumenta a retórica de cobrança por ajuda de países da União Europeia. Já o presidente americano, Joe Biden, fala em 3ª Guerra Mundial e reforça que a Rússia deve retroceder.

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O fato é que a guerra segue em curso na Ucrânia. Ocidente e Rússia parecem estar longe de um acordo. As duras sanções impostas ao povo russo já começam a fazer efeito – punindo essencialmente, a mesma população que, muitas vezes, ou não sabe o que acontece ou, se sabe, em grande parte não apoia.

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Em 1869, Liév Tolstói terminou de escrever a obra “Guerra e Paz”. Nos diários, em dado momento, ao falar sobre a guerra russo-japonesa, ele pontua: “despotismo produz a guerra, e a guerra produz o despotismo. Aqueles que querem lutar contra a guerra deveriam lutar apenas contra o despotismo.”

Em 2001, numa entrevista, Putin disse que a vida de um represente eleito era mais confortável que a de um czar. “Em algum momento você voltará à sua vida normal, e será importante não ficar envergonhado do que fez”.

Em 1974, Alexander Soljenítsin, historiador que denunciou as atrocidades da União Soviética em “O Arquipélago Gulag”, deu uma entrevista ao New York Times. “Em nosso país, a Rússia, a mentira se tornou não apenas uma categoria moral, mas um dos pilares do Estado”.

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Quando completou 22 anos de governo – e sem perspectiva de deixar o poder –, Pútin (um déspota?), invadiu a Ucrânia e chamou a guerra de “operação especial”.

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