Para quem lida cotidianamente com literatura e cultura ser um navegantino é um privilégio. Ser filho de pescador nascido na cidade de Navegantes é mais que um privilégio, uma realidade. Sou assim, não um navegador, mas um navegante em terra firme que tem as águas como amuleto. O destino me reservou essas dádivas e algumas outras, como na adolescência ter tido a oportunidade de trabalhar como ajudante de carpinteiro em um estaleiro onde se realiza a `Carpintaria da ribeira` que é uma marca cultural das mais importantes de nossa cidade. Jovem ainda, com quatorze anos andava nos andaimes a construir barcos de pesca de madeira. Pode parecer pouco, mas para a poesia que descobri depois na cidade, estas marcas na memória são talvez, o tesouro mais importante de minha existência.

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Posso dizer francamente que meu trabalho com a literatura e com projetos culturais estão estivados na experiência de trabalhar com barcos e peixes (porque também fui peixeiro). A cultura viva dessas pessoas que vivem perto do mar me abriram os olhos para o poder da arte da escrita, principalmente da poesia. Navegantes é uma cidade que oferece literalmente ao olhar de um leitor (não apenas o leitor de livros, mas do leitor de mundos) um mar de possibilidades narrativas. Cada cidadão de navegantes possui um cardume de conhecimentos que movimenta a história dessa cidade. Esta cidade que se transforma diariamente, a exemplo das correntes marítimas, das marés, das cores na orla a cada dia.

Certa vez o filósofo católico Jacques Maritain, escreveu “a arte é a flor e a perfeição deste mundo”. Onde não houver graça esta flor não vingará. Apenas o deserto crescerá. Atualmente, junto com uma equipe talentosa, tenho o grande privilégio de desenvolver trabalhos através do Instituto Caracol, que possibilita a muitas crianças, adolescentes e jovens o contato com as artes da dança, canto, leitura e teatro. É uma satisfação poder contribuir com a terra natal dessa maneira. É como um dom, a retribuição não obrigatória, mas feita com festa, comemorando esta data fazendo votos para que a cidade seja pensada cada vez mais para as pessoas. Afinal sem elas nos restaria não um jardim, mas um deserto à beira mar.

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