O fiscal pode estar no carro ao lado, na calçada, na garupa da moto, sem uniforme de Guarda de Trânsito ou da Polícia Militar. No lugar do bloco de multas, apenas uma câmera no celular, na mão, acoplada no painel do carro. Há dois meses e 26 dias, o blog Brusque na Contramão assumiu o papel de publicar infrações de trânsito flagradas pela cidade.

Continua depois da publicidade

Ao contrário de aplicativos e grupos criados para avisar os motoristas das blitze, uma dupla de empresários da área de tecnologia se inspirou no site Sinal Vermelho Curitiba para fiscalizar motoristas que pecam no trânsito. Os relatos vem sendo coletados desde dezembro de 2012 e têm uma pitada de ironia, mas, segundo os criadores, são menos hostis que as do site curitibano. Se o blog tem apenas oito posts, a fanpage do Brusque na Contramão no Facebook já tem dez vezes mais postagens.

As fotos de veículos estacionados em calçadas, ciclofaixas, embaixo de placas de estacionamento proibido e na contramão de ruas centrais são enviadas por pessoas que circulam pela cidade, por e-mail ou por mensagens inbox. Os flagrantes não são apenas de infrações que ferem o Código Brasileiro de Trânsito, como uma caminhonete furando o sinal vermelho no cruzamento da Rua Gustavo Schlosser com a Avenida Lauro Muller, no Centro. Também mostram atitudes imorais denominadas pelos fundadores do blog como barbeiragens, como ocupar duas vagas no estacionamento.

Além da colaboração de quem curte, o site é alimentado por imagens feitas pelos fundadores. Em conversa pelo Facebook, um deles explica como o site surgiu:

– Foi a partir de uma série de indignações diante da postura de muitos motoristas brusquenses no dia a dia, a atitude (ou falta dela) por parte deles gerava (e continua a gerar) muita indignação. Como nunca houve um canal virtual aberto para este tipo de assunto em nossa cidade, resolvemos levar o projeto adiante.

Continua depois da publicidade

Os donos da página afirmam que recebem de três a cinco denúncias por dia, mas já houve picos de até dez infrações diárias. As imagens próprias são feitas com uma câmera GoPro acoplada no painel dos veículos. O critério para filtrar as imagens que vão para a rede, é a intensidade da infração.

Especialistas avaliam legalidade de colocar flagras na internet

O secretário de Trânsito e Mobilidade de Brusque, Paulo Sestrem, avalia positivamente as duas páginas. Diz que podem ajudar a modificar o comportamento dos motoristas. Os números de infrações registrados pela Guarda de Trânsito de Brusque (GTB) parecem indicar uma mudança de comportamento nos três primeiros meses do blog, quando as irregularidades ao estacionar caíram cerca de 40%.

No entanto, a pedagoga e especialista em Direito e Gestão de Trânsito Karine Winter ressalta que as imagens não servem como ferramenta para punir quem estaciona sobre calçadas ou fura o sinal vermelho:

– Não pode configurar prova de infração. Só configura prova se o agente de fiscalização presenciar o ato. Então, o correto é denunciar para Polícia Militar, Guarda de Trânsito, polícias rodoviária estadual ou federal.

Continua depois da publicidade

Presidente da OAB alerta para Constituição

Além das infrações repercutirem na internet, podem incomodar os motoristas devido à exposição. Os fundadores do Brusque na Contramão relatam que nestes primeiros meses de existência, o blog recebeu apenas uma reclamação:

– Um motorista ficou ofendido e solicitou a remoção da foto da infração. Excluímos para evitar conflitos. Foi um caso único.

O presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) em Blumenau César Wolff avalia com parcimônia e diz que o blog pode colocar em conflito dois princípios da Constituição Federal:

– Existe um artigo que protege a privacidade e outro que fala da liberdade de informação. As outras pessoas têm direito de fiscalizar porque existe um grande contrato social, mas é preciso encontram um equilíbrio para não aniquilar a privacidade.

Continua depois da publicidade

O mestre em Ciência da Computação e professor da Universidade do Vale do Itajaí (Univali) Fabricio Bortoluzzi ameniza e diz que as redes sociais permitem exposição. E, de certa forma, as pessoas perderam a noção dos riscos e da exposição na internet.