As escutas telefônicas que embasaram a denúncia do Ministério Público (MP-SC) contra os envolvidos na operação Fundo do Poço foram divulgadas no domingo pelo programa Estúdio Santa Catarina, da RBS TV.

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Na ação, foram investigadas 46 pessoas, entre empresários e servidores públicos – sendo que 20 tiveram prisão decretada em novembro – por fraudes de licitações destinadas à perfuração de poços artesianos, que resultaram no desvio de pelo menos R$ 500 mil.

Nas gravações é possível identificar a combinação de preços entre empresários que recebem para perder propositalmente disputas. Também há diálogos do deputado estadual Romildo Titon (PMDB), hoje presidente da Assembleia Legislativa, com empresários investigados.

Segundo os promotores, os empresários faziam prévia combinação entre si e com os representantes dos municípios e órgãos públicos envolvidos e pagamentos indevidos para afastar os concorrentes. O objetivo seria interferir nos resultados das licitações.

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A investigação diz que houve utilização recíproca de propostas e orçamentos fraudulentos e pagamento de vantagens indevidas aos próprios servidores e dirigentes, com os quais eram ajustadas práticas ilícitas.

Além da combinação, os empresários são acusados de se passar por pessoas detentoras de poder decisório e que agem em nome da administração pública.

:: Escutas mostram negociação

Em ligação, o proprietário da empresa Água Azul Poços Artesianos, Luciano Dal Pizzol, conversa com um funcionário sobre o pagamento de valores ao prefeito da cidade de Ouro. Confira:

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Nessa gravação, Dal Pizzol pede a sua secretária que saque R$ 20 mil para pagar um amigo, que segundo o MP- SC seria o deputado Titon:

:: Relatório da investigação possui 671 páginas

São mais de mil horas de escutas telefônicas. Apenas o relatório da investigação tem 671 páginas.

Sobre o deputado Titon, a investigação do MP-SC afirma que “é flagrante o fato de que o parlamentar não se limita ao repasse de subvenções para prefeituras municipais e associações de comunidades rurais, mas, também, participa ativamente da interveniência no processo de indicação e escolha da empresa que irá realizar os serviços de perfurações dos poços artesianos, interagindo de forma personalíssima com os empresários investigados, inclusive na busca de orçamentos”.

Titon é um dos denunciados pelo MP-SC. O deputado nega que tenha recebido propina. A denúncia está com o Tribunal de Justiça de Santa Catarina, que ainda não decidiu se a aceita ou não.

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:: Os indícios nas mensagens

As escutas mostram a aproximação em encontros pessoais e telefonemas do deputado Romildo Titon com o empresário Luciano Dal Pizzol, dono da empresa Água Azul, uma das envolvidas no esquema.

No dia 17 de fevereiro de 2013, Titon enviou a seguinte mensagem ao empresário: “Amigo Luciano, será que taria pronto aquele orcamento dos poços, e poderia mandar pegar amanha sedo [sic]? Titon”.

O diálogo é seguido da resposta do empresário que diz estar em viagem e combina outra data para fazer a entrega. No dia 20, Titon volta a indagar o empresário com nova mensagem. No dia seguinte, 21, uma quinta-feira, Dal Pizzol liga para a empresa e fala com uma funcionária, dizendo que um amigo vai passar lá para pegar R$ 20 mil (confira o diálogo acima). Titon e o empresário ainda trocam mensagens e o deputado afirma que um homem chamado Evandro iria buscar.

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“A sequência de mensagens e ligações telefônicas, captadas a partir dos terminais telefônicos utilizados por Titon e Luciano, aponta de forma veemente na direção da alta probabilidade de que o parlamentar investigado tenha recebido do proprietário da Água Azul Poços Artesianos valores/dinheiro de origem duvidosa”, conclui o MP-SC.

:: Entenda a denúncia do MP:

– Empresários combinavam a licitação entre si e procuravam agentes públicos para ajudar a vender os projetos de construção de poços artesianos às prefeituras. Os agentes públicos influenciavam na abertura das licitações.

– As prefeituras abriam a concorrência em forma de carta-convite e as empresas agiam conforme combinado, apresentando propostas muito altas para que a empresa prevista ganhasse.

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– Ao final, a empresa vitoriosa desviava parte do dinheiro recebido para a construção do poço para pagar os agentes políticos e os representantes das prefeituras que auxiliaram no esquema

– Três pessoas continuam presas, entre elas Luciano Dal Pizzol.

:: Contrapontos

Em entrevista ao DC, o deputado Romildo Titon desafia qualquer um a provar seu envolvimento no caso:

Qual o seu posicionamento sobre a denúncia do MP-SC na operação Fundo do Poço?

Romildo Titon – O que existe é que foi oferecida uma denúncia pelo MP-SC, mas ainda não foi aceita pelo TJ-SC. Não tenho receio nenhum com relação a isso, não pratiquei nenhum ato ilícito.

A denúncia aponta que os prefeitos recorriam ao seu gabinete para ter acesso a uma verba que lhe é permitida e que parte dessa verba depois voltaria para o diretório ou alguém envolvido com o senhor.

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O que tem a dizer sobre isso?

Romildo Titon – Desafio qualquer prefeito a provar algo de meu envolvimento com relação de parte desse recurso ter voltado. Não existe no inquérito nenhuma palavra com relação a isso.

O senhor foi grampeado e em algumas dessas escutas aparece falando com o Luciano Dal Pizzol, o dono da empresa que realizava obras no Meio-Oeste e região Serrana. Por que o senhor mantinha tanto contato com ele?

Romildo Titon – Os contatos que eu tinha com o Luciano era porque eu trabalhava nessa área ao longo dos anos com poços artesianos comunitários para a associação de agricultores. E todas as vezes que me comuniquei com ele foi no sentido de solicitar orçamento para que pudesse discutir com a comunidade.

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O que diz o advogado de Luciano Dal Pizzol, Gastão da Rosa Filho:

– O que eu verifiquei através de perícia é que as escutas telefônicas e arquivos das conversas foram excluídos. Ou seja, não se sabe o contexto em que os diálogos foram travados. Eu não pude verificar todas as escutas, pois elas não me foram entregues no formato devido. Não vou comentar o conteúdos das escutas por uma proibição legal. Não vou infringir a lei e também não vou me pronunciar sobre uma matéria que eu prefiro que seja examinada com tranquilidade pelo Tribunal de Justiça de Santa Catarina