Primeiro, o presidente Federico Franco, do Paraguai, declarou, na noite de quarta-feira: iria cessar o repasse para o Brasil da energia elétrica excedente de Itaipu. Logo, a interpretação imediata: havia ali uma ameaça de romper o acordo bilateral.

Continua depois da publicidade

Mais adiante, nova interpretação: o que Franco queria era dar uma satisfação doméstica para o isolamento internacional resultante do polêmico impeachment de Fernando Lugo em 22 de junho. E suas palavras se referem não a um rompimento, mas à busca de industrialização do país, que o faria consumir a energia que lhe cabe e que fica ociosa.

Quem explica é Wagner Weber, diretor geral do Centro Empresarial Brasil-Paraguai (Braspar):

– O que o governo quer é fazer um projeto de uso interno maciço da energia elétrica. O Paraguai importa 100% do petróleo que consome, mas poderia usar a energia elétrica no transporte público. Por nossa sugestão, estudam substituir o gás de cozinha por fogões elétricos. O governo faz estudos para desenvolver uma cozinha elétrica nacional.

Explica-se: a quantidade da energia gerada em Itaipu é dividida entre os dois países, meio a meio. Ocorre que o Paraguai consome cerca de 5% dos seus 50%. Pelo contrato, tudo o que o país não consome deve ser vendido ao Brasil em um valor determinado. Assim, compensa o capital inicial investido pelos brasileiros na hidrelétrica. Se o Paraguai der vazão à produção que lhe cabe, vai utilizá-la.

Continua depois da publicidade

Um estudo da Braspar mostra que, se o Paraguai continuar aumentando seu consumo elétrico ao ritmo de 9,2% anual do período 1992-2011, em 2026 consumirá a metade que lhe corresponde em Itaipu.

Já na quarta-feira, o Itamaraty fazia a leitura de que Franco pretendia dar uma satisfação ao público interno. Até ontem, o governo não havia sido comunicado da eventual intenção do Paraguai de suspender o repasse de energia excedente de Itaipu.

Do governo paraguaio vem a confirmação de que não há interesse em romper contratos com o Brasil. O diretor de Comunicação da presidência, Christian Vázquez, ponderou que as declarações não são uma ameaça ao documento de 1973.

– Se industrializarmos o país, utilizaremos a energia que não utilizamos. Vamos incentivar a industrialização – esclareceu Vázquez.

Continua depois da publicidade

Como funciona o acordo

1 – Financiamento da construção, de US$ 27 bilhões, é assumido pelo Brasil.

2 – Paraguai se compromete com venda da energia não consumida ao Brasil.

3 – A partir de 2023, quando a dívida da construção de Itapu será quitada, o Paraguai se torna oficialmente dono de 50% da usina.

4 – No ano passado, a presidente Dilma Rousseff cumpriu promessa do ex-presidente Lula e triplicou a remuneração da “cessão de energia” de US$ 120 milhões para US$ 360 milhões ao ano. É 1,64% do PIB do Paraguai.

5 – Brasil se comprometeu em construir linha de transmissão para reforçar o abastecimento de Assunção, investimento de US$ 450 milhões.

6 – Itaipu ainda é a maior hidrelétrica do mundo em geração de energia – a usina de Três Gargantas, na China, tem mais potência. Fornece 18% da energia consumida no Brasil e abastece 72,91% do consumo paraguaio.

Continua depois da publicidade

7 – Em janeiro, o Paraguai fez pedido de novo reajuste do valor pago pelo Brasil, de US$ 22,60 para US$ 24,30 por quilowatt mês. Não é um preço de venda, mas uma contrapartida que nem estava prevista no contrato. Em tese, a entrega da energia não consumida no Paraguai quitaria a parte do país na dívida contraída na construção.