Base para o orçamento do governo estadual, a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) para o ano que vem chegou à Assembleia Legislativa (Alesc) nesta semana e começou a tramitar, oficialmente e em regime normal, nesta quarta-feira (17). A expectativa é de que o projeto seja votado antes do recesso parlamentar.

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Em geral a LDO não costuma causar grande furor no Legislativo, mas este ano a apreciação ganha um novo enredo. Discussões mais acirradas podem ser impulsionadas pela decisão do governador Carlos Moisés da Silva (PSL) de reduzir a fatia da Receita Líquida do Estado repassada anualmente para manter os poderes, entre eles a própria Alesc. A parcela mensal desses repasses são os chamados duocécimos.

Na situação atual, Alesc, Ministério Público Estadual (MPSC), Tribunal de Justiça (TJ-SC), Tribunal de Contas do Estado (TCE-SC) e Universidade do Estado de Santa Catarina (Udesc), podem contar, juntos, com 21,88% da receita líquida do Estado prevista para este ano. Já se o projeto de Moisés for aprovado, esse total cairia para 19,69%, podendo gerar folga de até R$ 400 milhões por ano no duodécimo, calcula a Fazenda.

Ano passado, conforme recente prestação de contas apresentada na Alesc pelo Secretário de Estado da Fazenda, Paulo Eli, as cinco entidades receberam cerca de R$ 3,59 bilhões do Estado — crescimento de 7,94% em relação a 2017, quando foram repassados R$ 3,30 bilhões, também conforme cálculos da Fazenda.

Mesmo com a redução do percentual para o ano que vem, ainda assim o cálculo usado atualmente — de percentuais fixos na receita — abre brecha para variações entre o que é arrecadado e o que é usado na execução orçamentária de cada instituição. Por exemplo, caso a arrecadação de SC supere a inflação, todos os poderes poderão ter mais dinheiro que o previsto. Agora, se houver baixa arrecadação, esse cálculo de inverte.

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Não é lei, mas normalmente o governo pede que, no fim do ano, quando há sobras, essas quantias sejam devolvidas aos cofres públicos. Não há diretriz para balizar de que forma o governo irá usar essas quantias, mas, em alguns casos, os próprios órgãos já carimbam o destino das devoluções. Segundo a Fazenda, por exemplo, ano passado o Tribunal de Contas do Estado (TCE) teria devolvido R$ 20 milhões, pedindo que desse total, R$ 5 milhões fossem destinados para a Polícia Militar de SC. Ao todo, segundo a Fazenda, entre 2011 e 2018, teriam sido devolvidos R$ 592 milhões.

Duodécimo já sofreu outra tentativa de mudança em SC

Em 2015, o agora ex-deputado Gelson Merísio (PSD), na época presidente da Alesc, propôs uma alteração na base de reajuste dos valores do duodécimo que iria engessar essa dinâmica. Ao invés de percentuais fixos sobre o total da receita, os poderes ficariam à mercê de um percentual reajustado conforme a inflação. A pressão das entidades e da própria Casa fez com o que projeto não andasse e tudo continuou como é hoje.

Agora, Moisés aposta que o cenário seja outro. Questionado que a proposta do governo pode enfrentar resistência dos parlamentares, o presidente da Casa, deputado Júlio Garcia (PSD), pondera que não:

— A redução vai ser avaliada pelo Judiciário, pelo Ministério Público, Udesc e pelo Tribunal de Contas, mas independe disso, não vai interferir em nada na aprovação, nem do projeto como um todo nem dos outros projetos do governo.

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A justificativa do governo

Na justificativa do PL 89/2019, o secretário de Estado da Fazenda, Paulo Eli, aponta que o cenário para 2020 é de recuperação lenta para a economia do país, a exemplo do que ocorre atualmente. Ele ressalta que as projeções de crescimento do PIB para 2019 foram revistas para baixo.

— A opinião predominante do mercado, representado pelas principais instituições financeiras do país, é de que esse fraco desempenho econômico é explicada pela dificuldade do governo federal em implementar reformas fiscais, consideradas como essenciais para reequilibrar as finanças públicas e propiciar um crescimento econômico sustentável no longo prazo — escreve o secretário.

Para fazer frente a esse cenário, aliado ao déficit nas contas públicas registrado em 2018, o Estado, conforme o secretário, limitará o crescimento das despesas primárias no orçamento de 2020 à variação da inflação oficial, o IPCA, conforme o teto de gastos aprovado em 2018 pela Assembleia, como parte do acordo para a renegociação das dívidas de Santa Catarina com a União.

— Acreditamos que essa medida, em conjunto com a aprovação da reforma administrativa em tramitação no parlamento catarinense e com o êxito das reformas estruturais, que estão sendo propostas pelo Governo Federal, notadamente a reforma da previdência, propiciarão, no médio prazo, um Estado mais equilibrado orçamentária e financeiramente — escreveu em outro trecho.

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O que dizem os órgãos envolvidos

Alesc

De acordo com o deputado e presidente da Casa, Júlio Garcia (PSD), nesse primeiro momento a proposta está sendo analisada.

— Estamos primeiro avaliando os números propostos pelo governo sob dois aspectos: financeiro e da Lei de Responsabilidade Fiscal. Só quando nós acabarmos esses estudos é que vamos apresentar uma posição — disse.

Tribunal de Justiça de SC (TJSC)

Por nota, a assessoria informou que o presidente do TJ, desembargador Rodrigo Collaço, já recebeu a proposta e que encaminhou para análise da equipe técnica, que fará estudos, e que, somente após isso, deve se pronunciar sobre a viabilidade da medida.

Universidade do Estado de Santa Catarina (Udesc)

Por nota, a assessoria da Udesc informou que a instituição “é contra qualquer redução do repasse de recursos via duodécimo, o que prejudicaria sobremaneira as atividades da universidade”. Ponderou que a instituição cresceu muito nos últimos anos, mantendo 12 unidades de ensino em todas as regiões do Estado, 35 polos de apoio ao ensino a distância, 170 grupos de pesquisa, 700 ações de extensão gratuitas voltadas à comunidade, 59 cursos de graduação e 48 de mestrado e doutorado e que “a manutenção dessa estrutura e da qualidade do ensino, da pesquisa e da extensão, que representa valioso investimento na educação, depende do atual repasse”.

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Ministério Público (MP-SC)

Por nota, a assessoria do MP-SC afirmou que vai analisar o projeto “para avaliar todos os possíveis impactos da pretendida alteração da Lei de Diretrizes Orçamentárias nas atividades da Instituição”. Disse ainda que se mantém “disposto a colaborar na busca por uma alternativa que contribua para o enfrentamento dos problemas financeiros do Estado sem prejuízo aos serviços prestados, pelo MPSC, à população catarinense”.

Tribunal de Contas do Estado (TCE)

Informou por nota que “a previsão de um percentual fixo da receita líquida destinado ao Tribunal de Contas constitui uma conquista histórica e propicia autonomia e independência na sua atuação”. Reforçou que tem demonstrado o que chamou de esforço colaborativo com o Executivo no repasse de valores. O Tribunal calcula que entregou R$ 80 milhões em 20141; R$ 46 milhões em 2015; R$ 22 milhões em 2016; R$ 25 milhões em 2017 e R$ 20 milhões em 2018. Apesar disso, informou que “tal situação não significa, porém, que o Tribunal de Contas dispense ou anua com a redução do seu repasse, pois nem sempre há essa disponibilidade”.

Disse ainda que, ao longo dos anos, cortou gastos, mas que há necessidade de investimentos, “em especial os relacionados à modernização do parque tecnológico, medida essa considerada imprescindível para a melhoria contínua de sua atividade de fiscalização”. Concluiu que “compreende-se a relevância das discussões suscitadas com a proposta de LDO, porém, necessário destacar a importância dos serviços prestados pelo poderes e órgãos e, em especial no que se refere à atuação do Tribunal de Contas”.