Treze fuzileiros navais americanos avançam por uma aldeia no Afeganistão. Ao passarem por uma espécie de corredor, uma criança aparentando ter 10 anos cruza o caminho e lança uma mochila. Uma bomba. A explosão fere gravemente três fuzileiros que iam na dianteira do grupo. O médico Christopher Mesnard entra em ação. Em segundos ele identifica quem está mais ferido. O pior deles teve o braço dilacerado, com rompimento da artéria braquial. Em dois minutos, Chris faz o torniquete, coloca gaze, um curativo com produtos químicos especiais para estancar o ferimento, aplica 20 miligramas de morfina para que o sujeito suporte a dor e o retira da área. O rapaz não só sobreviveu, como manteve o movimento do braço. No último Natal, Chris recebeu uma lembrança da avó do soldado.

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A habilidade em salvar vidas em situação de combate e a experiência de 16 meses no Afeganistão _ entre 2012 e 2013 _ trouxe o americano até São José, na Grande Florianópolis, onde ministrou esta semana o curso Combat Trauma para profissionais da área de segurança pública e especialistas em primeiros socorros, no Clube e Escola de Tiro .38. Depois da troca de experiências com os profissionais brasileiros, o veterano de guerra traçou um paralelo com a realidade deste país.

– Os cenários são muito parecidos. A diferença está nos tipos de ferimento, pois aqui são poucos casos de explosão. São mais comuns ferimentos a bala. O princípio é o mesmo: salvar a vida do companheiro, o mais rápido possível, sem se abalar com a situação de tensão ao redor – disse Mesnard.

O delegado da Diretoria Especial de Investigação Criminal (Deic) de Santa Catarina, Rodrigo Green, um dos alunos no curso, destacou a agilidade e a qualidade dos recursos que os americanos contam.

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– Tivemos contato com o que há de melhor em termos de ferramentas e ações em situação de combate e muita coisa a gente pode trazer para o nosso trabalho aqui – destacou Green, um dos quatro delegados na capacitação.

Na linha de frente

Pela segunda vez no Estado, o ex-fuzileiro naval americano Jake Engelen, 25, é o responsável pelas capacitações de Combate a Curta Distância e Manutenção de Armas, que seguem até o dia 11 de janeiro no Clube e Escola de Tiro .38. No Afeganistão, Engelen atuou como líder de esquadrão e chefiou a segurança pessoal do comandante do batalhão. Voltou da guerra no primeiro semestre de 2013 e teve um choque de realidade.

– É muita disciplina o tempo todo. Quando não está em combate, está em treinamento. Nos deparamos com um país muito pobre, em uma realidade culturalmente baseada na submissão da mulher e das crianças. Você volta é vê pessoas preocupadas com qual é a melhor capinha do celular, então passa a dar mais valor para a vida – relatou ele, que estuda atualmente na Universidade de Miami.

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A especialidade de Engelen é o combate de frente, o choque e a invasão. Antever as situações é uma das táticas e, neste caso, o veterano recomenda treinamento.

– São táticas de combate em ambiente urbano. Você não consegue prever tudo, mas com treinamento o nível técnico se eleva. Então tem que treinar e treinar. E não sozinho, mas em equipe, para que no combate você saiba o que o companheiro vai fazer em qualquer situação – orientou.

Sobre esse ponto, o organizador do curso e proprietário do clube, Tony Eduardo, faz ressalvas sobre o comportamento brasileiro.

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– Esta cultura de conhecimento compartilhado não existe nas polícias do Brasil. Cada um tem a sua técnica e guarda para si, não ensina ao outro. Diferente deles. O Engelen tem conhecimento em primeiros socorros e o Mesnard sabe técnicas de combate. Evoluem juntos – destacou ele.