Um dia para celebrar a união, o amor e a amizade. Para tentar esquecer, nem que seja por algumas horas, dos problemas, do preconceito e das dificuldades de se viver em um país que não é seu. A saudade da família, a falta de emprego e dinheiro para ajudar com as despesas, foram deixadas de lado durante um encontro que reuniu haitianos que vivem em Navegantes e Florianópolis, no último dia 24 de abril, no Centro Comunitário de Capoeiras, na Capital.

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Em Santa Catarina hoje vivem cerca de seis mil estrangeiros, com predominância de haitianos, segundo dados da Secretaria de Assistência Social do Estado. Os imigrantes chegam ao Estado em busca de uma oportunidade de trabalho, para juntar algum dinheiro e poder enviar para os familiares que ficaram no Haiti. Eles fogem da miséria daquele país e buscam reconstruir as suas vidas, ou o que sobrou delas. Em 2010, um terremoto destruiu o Haiti deixando mais de 300 mil mortos. Desde então, milhares têm saído do país caribenho em busca de melhores condições de vida.

O clima era de descontração. Uma caixa de som e um microfone animavam o almoço. Música alta, dança, sorriso no rosto e muito estilo. Todos bem arrumados e ansiosos para a atividade principal do encontro: um jogo de futebol entre a equipe Haiti F. C, de Florianópolis, e o Galaxy Haiti, de Navegantes.

– Esse encontro é um gesto de aproximação entre os haitianos. Viemos retribuir uma visita que eles (haitianos de Florianópolis) nos fizeram em Navegantes. Na atual conjuntura em que vivem os haitianos, em que há uma grande concentração de desemprego, nada mais justo que um encontro desses para aproximar esses irmãos. São nesses encontros que a Associação (dos Haitianos em Navegantes) tenta amenizar um pouco todo o sofrimento deles – explica João Edson Fagundes, diretor da Associação.

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Desde 2012 morando no Brasil, James Ymbert está desempregado há um ano e cinco meses. Vivendo de bico, ele lamenta não poder ajudar a família que ficou no Haiti e ainda lida com a dor de ter perdido a filha há pouco mais de dois meses.

– Lá no Haiti tem pouco serviço e é por isso que a gente vem para o Brasil, para poder ajudar a nossa família. É um momento difícil para muitos de nós. Minha mulher vive comigo; minha mãe e minhas irmãs estão todas no Haiti. Tivemos um neném, mas a enfermeira não segurou e minha filha caiu e morreu. Fui à Justiça, mas não resolveu nada. Agora estou esperando Deus me mandar outra – diz o haitiano de 28 anos.

É no futebol e em encontros como esses que muitos haitianos encontram forças para seguir em frente. É também por voluntários como Ivan Nunes, 57 anos, que doam seu tempo para tornar mais feliz a vida dos imigrantes. Quando chegou ao Centro Comunitário, Ivan colocou calça, camisa e gravata. Apesar do forte calor, ele quis deixar a partida a mais oficial possível, já que os jogadores fazem questão da solenidade. Assim, não podiam faltar trio de arbitragem, concentração no vestiário e Hino Nacional do Haiti.

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– Para nós seria um jogo simples, uma pelada, mas para eles é uma solenidade, eles vão cantar o hino e há uma disputa de um troféu. Então a gente tem que encarar de forma séria também. Hoje eu trabalho com 30 haitianos, mas eles não têm apoio esportivo nem social. Eu ganho bola de alunos e amigos, cada um ajuda como pode. Outros parceiros do Morro da Caixa (Centro da Capital) ajudaram com a comida – conta Ivan.

Desejo é seguir lema da bandeira do país

Samuel Jeanbaptiste vive em Santa Catarina há um ano e nove meses. Empregado em uma fábrica de embalagens, ele conta que chegou ao Brasil por acaso. A ideia inicial era estudar na República Dominicana. Ele espera um dia poder voltar ao Haiti e ajudar no desenvolvimento do país. Enquanto isso não acontece, torce para que mais encontros como esse sejam feitos.

– O meu objetivo algum dia é ver todos os haitianos de Santa Catarina unidos para tomar café juntos, almoçar, jantar, brincar igual era no nosso país. Mais para frente acho que vamos conseguir concretizar isso. Na nossa bandeira está escrito que ¿Juntos somos mais fortes¿, e se a gente se junta, a gente pode fazer uma verdadeira união para fazer grandes coisas.

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Ao final da partida, o Galaxy Haiti, de Navegantes, venceu por 4 a 0. Apesar da comemoração da vitória, o resultado foi o que menos importou. O que eles queriam mesmo, como lembrou Jeanbaptiste, era festejar a união entre eles. Perguntado se é feliz no Brasil, ele respondeu:

– Eu sou muito feliz!