O ano era 2020 e, em meio às matas de Urubici, na região serrana de Santa Catarina, o pesquisador e biólogo Luis Funez avistou por acaso um minúsculo fungo de cor azul, crescendo em meio ao musgo. Ele guardou um exemplar para ver mais tarde do que se tratava. Quatro anos depois, ele publicou a descoberta: uma nova espécie do raro gênero Microglossum, avistado pela última vez no Brasil há mais de 90 anos.
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O biólogo apelidou a nova espécie de Microglossum azeurum, em referência à cor do fungo. Ainda não é possível determinar por que a pigmentação é azul, mas o gênero costuma ter cores vibrantes, como vermelho, roxo e amarelo, encontradas principalmente no Hemisfério Norte. O azul vivo da espécie catarinense jamais foi registrado em nenhum outro lugar.
O pesquisador diz que o achado foi pura sorte, já que esse gênero só aparece em longos intervalos de tempo. Por isso, apelidou sua descoberta de “unicórnio fúngico”.
— É um negócio que provavelmente nunca mais vou ver durante a minha vida toda. Foi um momento único. Experiências na Europa e na América do Norte mostram que, uma vez que você viu essas espécies, você só vai vê-las daqui a 10, 20, 30 anos ou mais. Esses fungos não têm um período de aparecimento regular.
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Infográfico destaca detalhes sobre a vida no reino dos fungos
Descoberta rara
A descoberta do Microglossum azeurum ocorreu durante o doutorado de Luis, quando ele se envolveu no projeto de Pesquisa Ecológica de Longa Duração (Peld), da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), com o intuito de estudar a biodiversidade de fungos no Estado. Durante meses de expedições regulares ao Parque Nacional de São Joaquim, Luis e seus colegas vasculharam o solo em busca de evidências desses organismos.
O parque foi escolhido por conta de seu ambiente único, caracterizado por altitudes de mais de mil metros, baixas temperaturas e envolto em neblina. São árvores baixas, cobertas de musgo, que favorecem o surgimento de espécies raras.
— A área de pesquisa foi em manchas de florestas “escondidas nos vales”, onde vemos as nuvens entrando e trazendo a constante umidade do mar que faz essas matas estarem sempre super úmidas, repletas de musgos gotejantes — descreve o pesquisador.
Veja imagens das novas espécies de fungo
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Outras espécies
Depois de encontrar o fungo azul, Luis decidiu fazer buscas na internet, em fóruns que incluíam pesquisadores e “caçadores de fungos” — pessoas leigas que “caçavam” espécies por conta própria.
Até então, um exemplar de Microglossum só havia sido coletado no Brasil por Johannes Rick, em 1931, no Rio Grande do Sul, e descrito 11 anos mais tarde, pelo japonês Sanchi Imai.
A pesquisa na internet deu certo e Luis achou mais duas pessoas que também haviam achado Microglossuns, um na Bahia e outro no Mato Grosso do Sul. Ambos exemplares eram amarelos.
— Quando eu comecei a analisar esse material, eu estava considerando os dois amarelos como uma espécie só, mas a gente mandou sequenciar na Coreia do Sul, tiramos o DNA e quando as sequências voltaram, a gente viu que eram coisas diferentes.
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O estudo de Luis registra, então, três novas espécies de Microglossum: um foi o azul que ele encontrou e os outros dois vieram dos “caçadores de fungos”. A descoberta foi publicada em março na revista científica internacional Phytotaxa e pode ser acessado neste site.
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