O novo presidente do Paraguai, Federico Franco, é um homem que mede as palavras, mede a segurança e mede o tempo.
Continua depois da publicidade
Tanta cautela se reflete nesta entrevista que concedeu ontem a Zero Hora. Por medir palavras e pensar muito na segurança pessoal em um país que tenta deixar para trás sua atual crise política, ele marcou quatro conversas por telefone nas últimas semanas. Cancelou-as sempre no instante em que ia falar. E decidiu: receberia as perguntas de ZH por um assessor e as responderia enviando o áudio, via e-mail.
Assim foi feito. Nesta conversa em que a tréplica não era possível, Franco, um cardiologista que completará 50 anos no próximo dia 23, reclamou da ausência do direito de defesa no episódio que levou o Paraguai a ser suspenso do Mercosul. Também contou que ainda não conversou com autoridades brasileiras, mas que chegou a hora da reaproximação, até porque há, segundo ele, 500 mil brasileiros vivendo no Paraguai (os brasiguaios) e 100 mil paraguaios vivendo em diversas cidades brasileiras. Outra medida que ele define como “ilegal” é o ingresso da Venezuela no bloco sul-americano. Já o impeachment de Lugo, apesar do pouco tempo para a defesa do ex-presidente, classifica como legítimo.
Na última pergunta, a contagem do tempo e as reticências: Franco diz que, em 14 meses de governo, não poderá tomar decisões como a de buscar mercados alternativos ao Mercosul. Pondera que isso caberá ao futuro presidente, seja quem for. No Paraguai, a reeleição é proibida. Franco foi eleito vice em 2008. Esse político, então, pode ser qualquer um. Tecnicamente, até ele. Confira a entrevista ao lado.
Zero Hora – O senhor já fez contato com alguma autoridade brasileira desde 22 de junho, quando assumiu a presidência?
Continua depois da publicidade
Federico Franco – Não. Não tive ocasião de falar com autoridades do Brasil.
ZH – No Brasil, dizem que a presidente Dilma Rousseff foi determinante para que não houvesse sanções econômicas contra o Paraguai – como seria a intenção da Argentina -, em razão das relações estreitas entre os dois países. Por isso, agiu com mais discrição que a Argentina. Como o senhor vê isso?
Franco – Não tenho conhecimento, não tenho ideia. Não participamos da reunião de Mendoza. Logo, não temos conhecimento do que realmente se passou. Com o Brasil, temos vínculos muito sólidos, a construção de Itaipu (hidrelétrica binacional), a Ponte da Amizade (que une os dois países nas cidades brasileira de Foz do Iguaçu e paraguaia de Ciudad del Este), a presença de 500 mil paraguaios de origem brasileira que vivem e trabalham no meu país, a presença de cerca de 100 mil paraguaios que estão radicados em diferentes locais do Brasil e uma história de tradição, de laços de amizade que sempre tiveram os povos de Paraguai e Brasil. Vamos trabalhar para que as relações melhorem e, daqui para a frente, se normalizem.
ZH – Se em termos econômicos não houve punições, em termos políticos o Paraguai foi suspenso do Mercosul. O que o senhor acha disso?
Franco – A suspensão é absolutamente ilegal e injusta e ilegítima. Foi feita sem o legítimo direito de defesa.
Continua depois da publicidade
ZH – Dizem que houve um golpe parlamentar no Paraguai com o impeachment do ex-presidente Fernando Lugo. O que o senhor diz disso?
Franco – Negativo. Não. Aqui, houve um juízo político. É o mesmo impeachment que foi feito a Collor no Caso Collor, no Brasil (o afastamento do ex-presidente Fernando Collor, em 1992). Nossa Constituição estabelece os passos que devem ser dados em um juízo político.
ZH – O ex-presidente Lugo teve menos que dois dias para se defender das acusações, em um processo de 31 horas. Houve direito de defesa no seu caso?
Franco – Foi dado o direito de defesa ao acusado. Abriu-se um prazo para as alegações. Foi um processo absolutamente constitucional.
Continua depois da publicidade
ZH – E a inclusão da Venezuela no vácuo do Paraguai (Brasil, Argentina e Uruguai decidiram aceitar a entrada do país de Hugo Chávez, que vinha sendo negada pelo Congresso paraguaio), provocado pela sua suspensão? Como o senhor vê isso?
Franco – Foi uma decisão tomada também de forma ilegal e injusta pelos outros países sócios do Mercosul. O Paraguai já apresentou seu protesto, que está nos tribunais do Mercosul. Assim, o tempo vai definir essa situação.
ZH – Mediante essa situação, o senhor vai buscar mercados alternativos ao Mercosul?
Franco – Não, porque não houve qualquer sanção econômica. Em um período de 14 meses (o tempo que Franco terá de governo, entre o impeachment de Lugo e as próximas eleições presidenciais), é muito difícil tomar uma decisão. Seguramente, o próprio governo, seja qual for o político que seja o presidente, vai tomar uma uma ou outra decisão.