Evelise de Fátima Gomes, 32 anos, levou três anos para achar um emprego de quatro horas diárias. Moradora do bairro Saco Grande, em Florianópolis, pega quatro ônibus, com uma viagem de duração de duas horas, para chegar ao Hospital Regional de Biguaçu, onde trabalha pela manhã. O marido, Tiago Rodrigues de Oliveira, 33, ainda está na luta. Deixa currículos, pede ajuda. Mas a resposta que ouve é sempre a mesma.

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— A empresa diz que não tem estrutura para me empregar — lamenta ele.

Tanto Evelise como Tiago são cegos. O casal tem dois filhos, um de dois e outro de 10 anos. Uma luta diária para se manter, financeiramente e psicologicamente. Ela tem Ensino Médio completo e ele termina os estudos do Ensino Fundamental, que foram prejudicados pela condição quando adolescente.

— Apesar de estar empregada, tenho o desejo de trabalhar mais horas e mais perto. Nós fazemos entrevistas, a empresa até chega a nos dar esperança durante a conversa, mas quando ligam, a resposta continua sendo a falta de estrutura — conta Evelise.

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João de Abreu Neto, de 70 anos, apesar de ter renda de um salário mínimo como aposentado, precisa trabalhar. Pagar contas, se manter ocupado. Sobrevive de bicos. Ainda almeja uma carteira assinada. Há dez anos ele perdeu a perna direita por conta de uma elefantíase.

— Quando me ligam depois de uma entrevista, me falam que, como não tenho o membro inferior direito, é mais complicado. Eles acham que seria mais difícil a minha locomoção e adaptação da empresa para isso — relata o aposentado.

Ele é formado em administração e administração hospitalar. Apesar de não ter uma perna, se locomove facilmente com bengala. Mesmo com ensino superior, está disposto a aceitar qualquer oferta.

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— O grande problema é o preconceito em relação à pessoa com deficiência. As pessoas e as empresas precisam começar a olhar a pessoa com deficiência de maneira diferente. Só assim vamos quebrar barreiras e achar emprego — avalia.

A opinião é compartilhada pela procuradora do Ministério do Trabalho de Santa Catarina (MPT-SC), Quézia Araújo Duarte Nieves Gonzalez. A instituição, em parceria com outros órgãos, realiza pela primeira vez na cidade a ¿Semana Inclusiva¿, que ocorre até o próximo domingo. Neste sábado será realizado o 2º Feirão de Empregos para Pessoas com Deficiência, que está sendo chamado de ¿Dia D¿.

— A cidade tem pessoas com deficiência muito qualificadas, com currículos muitas vezes melhores que outros candidatos. Os trabalhadores com deficiência têm os mesmos direitos e deveres que qualquer outro. Mas os desafios para eles acessarem o emprego ainda são muito maiores. Eles encontram barreiras na mobilidade, no transporte público para chegar até o trabalho, os prédios não são acessíveis. A cidadania da pessoa com deficiência precisa, antes de tudo, ser assegurada — disse a procuradora.

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Momento para abrir os olhos das empresas

— Se de um lado temos empresas que alegam ter vagas para pessoas com deficiência, de outro temos as pessoas procurando emprego. O que queremos é colocar em um mesmo local estas empresas e as pessoas que estão procurando — complementou a procuradora do MPT-SC.

Atualmente, segundo legislação, empresas com mais de 100 funcionários precisam ter 2% das vagas destinadas para pessoas com deficiência. Mesmo assim, somente o Sine de Florianópolis possui 700 pessoas com deficiência cadastradas que estão à procura de um emprego. No Instituto de Geração de Oportunidades de Florianópolis (Igeof), outros 100 currículos aguardam uma chance.

Para o presidente da Associação Catarinense para a Integração do Cego (Acic) Jairo Silva, por exemplo, será um momento para esclarecer dúvidas, mostrar que é possível quebrar barreiras e diminuir o preconceito.

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— Os empresários de uma forma geral não tem conhecimento das potencialidades da pessoa com deficiência. Muitas vezes elas são mais comprometidas e concentradas. As adaptações que precisam fazer, no caso para pessoas cegas, por exemplo, é a compra de um software específico e um scanner. Às vezes é só falta de informação, que nós chamamos de preconceito — explicou Silva.

O presidente da Associação Florianopolitana de Deficientes Físicos (Aflodef), José Roberto Leal, também lembra que inclusão não é somente obedecer a legislação.

— Tem empresas que contratam pessoas com deficiência para obedecer a lei, mas pagam para trabalhar de casa. Não é isso que queremos. Queremos que a comunidade se sensibilize, que inclua as pessoas com deficiência na sociedade — disse Zezinho.

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O que vai rolar no Dia D

O feirão vai ser realizado no sábado no Instituto Federal de Santa Catarina (IFSC) da Avenida Mauro Ramos, das 9h às 17h. Serão 20 stands com 40 empresas presentes que estarão atendendo os interessados.

Cerca de 260 empresas da Grande Florianópolis que têm mais de 100 empregados foram chamadas para as reuniões de sensibilização que antecederam o Dia D e as participantes mostraram interesse em participar de forma voluntária no evento, informou ainda a procuradora Quézia Gonzalez.

Tanto Sine e Igeof também estarão presentes nos dias para receber currículos. Eles encaminharão os cadastros para demais empresas que possuem vagas para pessoas com deficiência. Ainda durante o sábado serão oferecidos serviços como confecção de Carteira de Trabalho e de Identidade, assessoria jurídica pela Comissão de Direito das Pessoas com Deficiência da OAB/SC, esclarecimentos a respeito de serviços previdenciários, além de informação e aconselhamento aos pais e atendimento de pessoas com síndrome de down, que serão prestados pela Associação Amigo Down.

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A iniciativa funcionou muito bem no ano passado. A ação de 2015 viabilizou a admissão de 744 trabalhadores com deficiência em 191 empresas da Grande Florianópolis, entre junho de 2015 e julho 2016, segundo dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged).

Confira a programação da Semana Inclusiva

Nesta sexta:

– Shopping Beiramar – Exposição fotográfica “Inclusão através da Arte – Amigo Down¿, no Piso L1 – em frente a Tech Masters.

– Biblioteca Municipal Professor Barreiros Filho – Oficinas Culturais e Exposição de Tecnologias Assistivas. Inscrições pelo telefone (48) 3271-7914. Entrada gratuita. Endereço: Rua João Evangelista da Costa, 1160, Estreito.

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Domingo

Parque de Coqueiros – Atividades Esportivas Adaptadas, das 9h às 13h. Gratuito. Em caso de chuva, as atividades serão transferidas para o Cefid/Udesc. Rua Pascoal Simone, 358 – Coqueiros.