Abrir o armário e ter a sensação de que não há nada para vestir. Mesmo entulhado de peças, nenhuma parece adequada. O sentimento é comum em meio ao ciclo moderno de compra e consumo no mundo da moda, em que as roupas se tornam cada vez mais descartáveis – seja por qualidade ou tendência. Quanto mais se compra, mais se produz. A indústria têxtil é uma das maiores do Brasil. Em 2018, foram fabricadas 8,9 bilhões de peças, entre vestuário e acessórios para casa, uma produção média de 1,2 milhão de tonelada. Os dados são da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção. Tudo isso, no entanto, causa um impacto no meio ambiente e é em meio a essa cadeia produtiva gigante que surgem iniciativas voltadas à produção de peças artesanais, que causam menos danos, e à conscientização para a redução do consumo.

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Com o objetivo de trazer novos conceitos sobre moda e sustentabilidade, a Universidade do Estado de Santa Catarina (Udesc) realiza, entre os dias 9 e 12 de fevereiro o 2º Floripa Eco Fashion. O evento acontece na Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC), em Florianópolis, em paralelo ao Fik 2020 (Festival Internacional de Arte e Cultura José Luiz Kinceler). É possível se inscrever nas atividades por meio do link .

Nesta edição, o evento conta com um tripé: educação (através de palestras e workshops), pop up store e desfile das marcas. Fazem parte da programação nomes como Goya Lopes, Agustina Comas, Lilyan Berlim, Mônica Horta e Nara Guichon, além de marcas como Marisol, Damyller, Armário Coletivo (projeto de Florianópolis). Além disso, o Floripa Eco Fashion contará com rodas de conversa sobre moda e sustentabilidade, com a participação de marcas, instituições de ensino e comunidade. A realização é da Udesc, Ceart Udesc, Ecomoda Udesc, Instituto Trama Ética, Instituto de Negócios da Moda, Croqui Comunicação e Zaveo Design.

"A maioria das pessoas tem mais roupas do que precisa"

Se vestir bem e ainda assim levar um estilo de vida mais consciente é um dos obstáculos que a professora do curso de moda da Udesc, Neide Schulte, já conseguiu ultrapassar. A coordenadora do programa de extensão Ecomoda Udesc e presidente do Instituto Trama Ética acredita que a moda sustentável pode ser acessível a todas as pessoas. Para ela, que não compra uma roupa nova há anos, o autoconhecimento é o segredo.

— É preciso olhar para si, de acordo com a nossa personalidade e o nosso biotipo, e descobrir o que nos representa no vestuário. A partir dessa reflexão fica mais fácil comprar e usar o que de fato nos representa em termos de personalidade e de identidade. Eu não me lembro a última vez que comprei uma roupa nova. A maioria das pessoas tem mais roupas do que precisa.

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Reduzir é o primeiro passo. A dica é pensar se a compra realmente é necessária. Caso seja é importante escolher bem o produto, tentar descobrir onde foi produzido e se for possível procurar marcas que sejam transparentes. Neide também indica comprar peças de qualidade e atemporais, que não estejam tão ligadas às tendências do momento fashion, que provavelmente durarão pouco.

— A partir do momento que você comprou, decidiu, levou, você se torna responsável pelo encaminhamento dessa roupa. Se ela durar muito tempo, ótimo. Se durar pouco tempo, o que você vai fazer com ela? É preciso dar um destino correto, assim como todo nosso lixo. Na verdade, essa atitude de compra não deveria ser apenas no vestuário. Não basta ser sustentável para se vestir e ignorar o restante do nosso consumo. Está tudo interligado. Saber o que a gente compra, de onde vem, como é produzido, é fundamental.

Em Santa Catarina, seguindo uma tendência mundial, tem aumentado o número de marcas que trabalham com sustentabilidade. Entretanto, é preciso ficar de olho para perceber quando a publicidade é mesmo verdadeira.

— As empresas têm se preocupado mais, têm feito mais ações, porque é um processo sem volta. Essa cobrança da população vem num crescente cada vez mais acelerado. O que é muito bom, porque vivemos num estado lindo e precisamos preservar a natureza, que gera outras receitas econômicas, como o turismo. Nós já temos no estado empresas que trabalham com reciclagem têxtil, mas elas não dão conta do volume. É uma indústria que polui muito, gera muito resíduo e ainda temos muito que fazer.

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Neide cita a Grande Florianópolis e o Vale do Itajaí como as regiões com o maior número de iniciativas voltadas à moda sustentável. São diversas marcas de slow fashion e ateliês preocupados com a questão. Para ela, o aumento no número de empresas com esse perfil só vai crescer quando o consumidor passar a prestar atenção no setor.

— A moda barata tem danos muito sérios e ainda temos coisas a melhorar no nosso estado. Cabe a nós, enquanto consumidores, fazer as escolhas certas. Com isso vamos obrigar a indústria a fazer mudanças. No fim das contas é o consumidor que manda.