A figura da avó sentada com os netos ao seu redor é uma das imagens mais recorrentes quando falamos em contação de histórias. Esta arte é tão antiga quanto o desenvolvimento da humanidade. Qualquer pessoa pode contar uma história, mas há quem faça da narrativa um instrumento profissional. A atuação do contador é tão importante que desde 2001 ganhou uma data comemorativa. Nesta terça-feira, 20, é celebrado o Dia Internacional do Contador de Histórias e, em Florianópolis, a recém-criada Setorial da Arte da Contação de Histórias do Conselho de Política Cultural promove até quinta-feira, 22, a 1ª Semana do Contador de Histórias, no Teatro da Ubro. A programação é aberta ao público e gratuita.

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— A contação de histórias tem a função de manter vivas algumas tradições, ensinamentos que vem de séculos atrás, as histórias populares. A contação, tanto para a criança quanto para o adulto, ativa a imaginação. É uma arte da imaginação. Por mais que você use objetos, ela é uma arte da narrativa e cumpre o mesmo papel da leitura. Cada leitor, ao ler, imagina a cena, na contação de histórias acontece a mesma coisa. A voz é o principal instrumento do contador para manter essa tradição viva — explica Lieza Neves, contadora de histórias há 10 anos.

Em uma época em que crianças e adultos são rodeados pelas imagens, sejam de celulares ou televisores, a contação de histórias assume um papel ainda mais importante na formação da criança. A contação ajuda a criar um mundo imaginário, melhorar o vocabulário, enriquecer o universo dos pequenos, segundo Lieza. Mas para os adultos, ela também tem uma função respeitável.

— Quando os adultos assistem eles ficam com os olhos vidrados. É um momento de sair da sua rotina da imagem, do tudo pronto para ficar imerso num lugar distante, numa história que dura oito minutos e, de repente, ele acorda — diz.

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A 1ª Semana do Contador de Histórias começou nesta segunda, 19, e segue até quinta-feira, 22. Uma das propostas da setorial, criada em setembro de 2017, é aprovar um projeto de lei que institui a Semana Municipal do Contador de Histórias para comemorar o Dia Internacional do Contador de Histórias, em 20 de março. O projeto deve ser apresentado à Câmara de Vereadores em abril. O evento tem parceria com a Fundação Cultural Franklin Cascaes. Confira a programação abaixo.

Profissão: contador de histórias

Felícia Fleck, 34 anos, é formada em biblioteconomia, mas ainda na faculdade conheceu a arte de contar histórias e se apaixonou. Desde então, estudou e se profissionalizou. Hoje, ela atua em escolas, feiras de livros, na formação de professores e público em geral. Pesquisadora da área, Felícia também estuda a questão da identidade e profissionalização do contador de história, uma profissão nova, que está conquistando cada vez mais um espaço no mercado.

— Num primeiro momento, as pessoas tem uma reação de estranhamento quando eu digo que sou contadora de histórias. “Como assim contadora de histórias? Mas o que você faz? Você ganha pra isso?” E depois que conhecem, essa relação muda. Sabem que realmente há uma preparação, um empenho de valorizar essa prática como uma atividade artística, que não se faz de qualquer jeito — diz.

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Apesar de a contação de histórias ser uma prática antiga, é uma profissão nova e não é regulamentada. Segundo Felícia, há uma discussão que gira em torno da regulamentação e valorização deste trabalho.

— É muitas vezes questionável se precisa ter uma regulamentação, isso porque qualquer um pode ser um contador de histórias e o que é ser um contador de histórias? É fazer um curso, é ter uma formação? Tem muitos contadores que se formam na própria vida, nas suas experiências. Por outro lado, tem a questão da valorização, é uma figura que está aparecendo cada vez mais e as pessoas estão conhecendo o que é um contador de histórias, o seu trabalho, estão respeitando mais.

Santa Catarina é referência no país

Um dos nomes mais conhecidos de Santa Catarina ao falar em contação de historias é Sergio Bello, 61 anos. O dinossauro da narrativa oral, como ele mesmo se define, iniciou seu trabalho em duas escolas da Capital em 1995, com o projeto “A hora do conto”. Quatro anos depois, Bello começou a ministrar oficinas, que formou cerca de seis mil contadores na época. Segundo Bello, estes cursos foram primordiais para que Santa Catarina se tornasse o estado referência em contação de histórias.

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— Eu tenho a impressão que isso fez com que o nosso estado tenha uma realidade diferenciada. Quando comecei esse trabalho as pessoas perguntavam o que eu fazia, o que era contador de história? Hoje em dia todo mundo já sabe o que é isso. O que não acontece em outros estados, essa linguagem não é reconhecida e popularizada — afirma.

Mas o que não muda de um estado para outro é a dificuldade que os artistas, seja da contação de histórias, do teatro, da dança, enfrentam pela falta de políticas públicas voltadas para a arte e a cultura.

— A arte não sobrevive sem um forte envolvimento do Estado. A arte que sobrevive de forma independente do Estado é a comercial, como a música e o cinema, e você não pode depender disso para manter a qualidade, a inovação e o desenvolvimento de novas linguagens. Justamente por não ter um apelo comercial, ela depende muito do Estado e precisa, porque ela é fundamental no desenvolvimento humano.

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Em uma época dominada pelas redes sociais, Bello acredita na contação de histórias, e outras artes, como meio de promover encontros entre pessoas para alimentar a alma, algo necessário desde a origem da humanidade.

Programação:

19/03 – segunda-feira, das 18h30min às 21h

Conversa da Setorial da Contação de Histórias: “O papel dos fóruns setoriais na garantia das políticas públicas para a cultura” com Marcelo Seixas

20/03 – terça-feira, das 14h às 17h

Seminário: “Tradição, formação e profissionalização do contador de histórias” com os palestrantes Felícia Fleck, Gilka Girardello e Sergio

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22/03 – quinta-feira, das 15h às 17h

Roda de Causos da Ilha – Contadores de Histórias homenageando Florianópolis

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