Se não ficar na promessa, a conta de luz dos brasileiros poderá ficar pelo menos 10% mais barata. O alívio no bolso poderá vir da intenção anunciada na quinta-feira pelo governo federal de encaminhar, em até 30 dias, medida provisória para renovar as concessões do setor elétrico e eliminar encargos que deixam mais cara a fatura dos consumidores.
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Um levantamento do Instituto Acende Brasil mostra que os encargos setoriais representam quase 8% do valor da conta de luz. O ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, adiantou na quinta-feira que o objetivo é acabar com as cobranças de Consumo de Combustíveis (CCC) e de Desenvolvimento Energético (CDE), além da Reserva Global de Reversão (RGR) e, possivelmente, do Programa de Incentivo a Fontes Alternativas (Proinfa), já extinto. Juntos, só os três primeiros encargos – de um total de 14 em vigor- equivalem a 6,5% do total da fatura.
Por outro lado, a renovação das concessões poderia diminuir as tarifas de geração das usinas mais antigas que já recuperaram o investimento. As medidas beneficiariam a indústria, que reclama da perda de competitividade devido ao alto custo da energia em comparação a outros países, e os consumidores.
– Vejo com alegria o fato de que, pela primeira vez em muitos anos, inverteu-se a lógica de aumentar os impostos que tem feito parte da história do setor elétrico – diz Claudio Sales, presidente do Acende Brasil, centro de estudos do setor elétrico que há anos cobra a redução da carga tributária na conta de luz.
Da perspectiva das indústrias, o aceno do governo federal significa a possibilidade de produzir mais barato. De acordo com a Associação Brasileira de Grandes Consumidores Industriais de Energia e de Consumidores Livres (Abrace), o preço da energia para produção no Brasil é o segundo maior do mundo, atrás apenas da Itália. As fábricas desembolsam, em média, US$ 180 por megawatt hora. Metade desse valor é representada por encargos e impostos federais e estaduais.
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– Indústrias de plástico ou componentes metalmecânicos têm uso intensivo de energia, que pode chegar a 65% dos custos de produção. Com tributos altos, seus produtos ficam mais caros e menos competitivos – explica Paulo Ludmer, professor de Política Energética da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) e ex-diretor executivo da Abrace.
Mais cético é o presidente do conselho de consumidores da Companhia Estadual de Energia Elétrica (CEEE), Leodomar da Rosa Duarte.
– Torço para que seja verdade, mas não confio. Quanto mais baixar o custo da energia, melhor, mas não sei se vai ser tudo isso. Este é um ano eleitoral – pondera Duarte.
O ânimo trazido pela notícia de que o preço da energia deverá cair vem acompanhado de dúvidas quanto às saídas para compensar a perda de arrecadação. Com renúncia fiscal estimada pelo Instituto Acende Brasil em R$ 5 bilhões ao ano, o governo teria de recorrer a outras receitas para manter programas como o Luz Para Todos, subsidiado com recursos de um dos encargos, o CDE.
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Para Gabriel Leal de Barros, especialista em finanças públicas da Fundação Getulio Vargas (FGV), o governo tem duas formas de compensar a renúncia fiscal. Um dos caminhos seria via dividendos de empresas estatais, como Petrobras e Banco do Brasil. A outra alternativa seria uma alteração na programação financeira do orçamento, postergando despesas com a rubrica de restos a pagar, onde há margem de manobra.
– Mas isso seria ruim, porque impactaria o investimento. Creio que o governo vai utilizar um pouco das duas medidas – avalia Barros.
Lobão disse que os programas sustentados pelos encargos serão assumidos pelo Tesouro. No entanto, a arrecadação do governo federal vem caindo, e por consequência, as condições de investimento: em junho, a arrecadação da Receita Federal foi 6,5% menor do que no mesmo mês do ano passado, o que é atribuído pelo governo à redução da atividade industrial e aos cortes de impostos neste ano.
Há ainda no governo uma discussão para diminuir o peso de tributos federais como PIS e Cofins na conta de luz, além da negociação com os Estados sobre a possibilidade de redução de ICMS sobre a energia. No entanto, a relevância da arrecadação com energia, estimada em R$ 50 bilhões ao ano para governos federal e estadual, pode dificultar cortes tributários mais ousados.
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O governo gaúcho, por exemplo, avisa que só cogitará cortar o ICMS se houver renegociação das dívidas com a União.
– Para a indústria, seria muito importante a redução de tributos, mas é preciso saber como o governo compensará a perda de receita – afirma Carlos Faria, coordenador do Grupo de Energia da Federação das Indústrias do Estado (Fiergs).
As 14 cobranças penduradas na fatura
CDE (Conta de Desenvolvimento Energético): 2,35%
CCC (Cotas da Conta de Consumo de Combustível): 2,81%
CFURH (Compensação Financeira pela Utilização de Recursos Hídricos): 1,40%
RGR (Cotas da Reserva Global de Reversão): 1,23%
TFSEE (Taxa de Fiscalização de Serviços de Energia Elétrica: 0,20%
Cosip ou Cip (Contribuição para Custeio de Serviço de Iluminação Pública)**
UBP (Uso de Bem Público)**
ESS (Encargo de Serviços do Sistema)**
ONS (Taxa do Operador Nacional do Sistema) ***
CCEE (Taxa da Câmara de Comercialização de Energia Elétrica)***
ECE (Encargo de Capacidade Emergencial)**
EER (Encargo de Energia de Reserva)**
Proinfa (Rateio de custos do Proinfa)**
Observação: dados de 2008
**Dados não abertos, mas que somam 0,78%
***Dados de 2008 desconhecidos
Fonte: Instituto Acende Brasil
O peso na tarifa de energia no Brasil: 8,77% da conta é de encargos setoriais
A composição da fatura no país
Custo do serviço: 55%
Tributos e encargos: 45%
Composição dos 45% da carga tributária do setor elétrico
Tributos estaduais: 47%
Tributos federais: 31%
Encargos setoriais: 19%
Encargos trabalhistas: 3%