A televisão brasileira é o principal meio de comunicação de massa do país, e as telenovelas são os programas de maior audiência da televisão brasileira. Elas influenciam de forma direta o cotidiano das pessoas, criam modismos, tendências e expressões. Têm a capacidade social de falar com todas as camadas da sociedade. Partindo dessa premissa, dá para ter uma ideia da grandiosidade artística do trabalho da figurinista de novelas da TV Globo, Marília Carneiro.
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Marília tem a formidável capacidade de captar o que as mulheres gostam, ou mostrar a elas o que ainda vão gostar. Foi dela a ideia de colocar meias de lurex com sandália de salto na personagem de Sonia Braga em Dancin’ Days (1978). O conjunto virou uniforme nas discotecas do Brasil. Coube a ela o guarda-roupa da muçulmana Jade, em O Clone (2002), o que provocou uma febre nas mulheres de Norte a Sul, que passaram a se enroscar em panos coloridos.
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São tantos os exemplos bem-sucedidos que ela publicou um livro sobre o assunto, Marília Carneiro – No Camarim da Oito. Sua inspiração há 37 anos de carreira na televisão vem da capacidade de estar constantemente em estado de alerta para tudo o que acontece à sua volta.
– Presto atenção na passarela, sempre. Mas posso dizer que as viagens são um grande estímulo. As ruas de Paris, Tóquio e Nova York são uma fonte maravilhosa – conta.
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Responsável pelo figurino do remake da novela Ti-Ti-Ti, Marília tem se dividido entre os bastidores das gravações e um novo projeto em parceria com a Grendene. Ela é a mais nova blogueira do site da Grendha e escreve semanalmente dicas de moda para as internautas.
Nascida no Rio de Janeiro, prestes a completar 70 anos, Marília esteve em Porto Alegre e aceitou o convite de Donna para reinterpretar, em um editorial de moda, cinco personagens cujos figurinos foram um marco em sua carreira pela capacidade de influenciar a moda das ruas. O resultado está nas imagens a seguir.
“A grife Lanvin é uma grande paixão da Cláudia Raia, e minha inspiração partiu daí. As peças da Lanvin caem muito bem nela, com todas aquelas transparências e drapeados. Só uma mulher que tem 1m80cm de altura consegue levar bem essa moda.
A novela Ti-Ti-Ti foi um tremendo sucesso nos anos 1980, e eu acho muito interessante resgatar algumas tendências daquela época, como o macacão, que fiz questão de incorporar ao figurino da Jaqueline.
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A personagem da Cláudia é minha atual paixão. É delicioso você conseguir colocar ‘tudo ao mesmo tempo agora’ em uma mulher e ainda ser feliz, ver que funciona. Jaqueline usa turbante junto com 10 correntes, casaco de pele e fica tudo certo. A Cláudia também ajuda muito nessa composição. É daquelas atrizes em que eu grito ‘mata!’, e ela, ‘esfola!’. É absurdamente companheira na hora de compor o figurino, e isso contribui muito com meu trabalho.
Na versão com a modelo deste editorial, fiz questão de manter o macacão como peça-chave e usar a referência de transparências da Lanvin para combinar a peça com uma camisa grafite. O estilo ‘tudo ao mesmo tempo agora’ da Jaqueline aparece nessa interpretação com o cinto largo marcando a cintura, os brincos gigantes e o conjunto de colares. A diferença é que a modelo desceu do salto para encarar a vida real de rasteirinha”.
“Tudo comecou quando eu estava andando na Rua Oscar Freire, em São Paulo, e parei em frente à vitrine da loja Miss Sixty. Ali estava a menor saia que eu já tinha visto na minha vida. Entrei na loja, comprei a saia e pensei: ‘Tudo vai começar por aqui’. Darlene era uma manicure do subúrbio do Rio de Janeiro, completamente louca e desvairada. Combinava com a peça.
Mais tarde, com a novela no ar, fiquei sabendo que o pessoal da Miss Sixty havia ficado muito zangado comigo, pois acharam que eu usaria a saia para vestir um personagem digno e, na ótica deles, a Darlene não era digna. Mas o tiro saiu pela culatra, porque o guarda-roupa usado por Deborah Secco virou mania nacional. E a própria Deborah ajudou muito, porque é bastante animada.
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Uma vez, eu estava na TV Globo e me ligou uma menina bem jovenzinha dizendo: ‘É uma questão de vida ou morte, mas eu preciso saber quantos centímentros tem a minissaia da Darlene’. Fui medir. Tinha 20cm.
Na interpretação que fiz exclusivamente para o caderno Donna, acrescentei um casaquinho jeans, porque o jeans é tendência forte hoje em dia.
A camisetinha permanece, assim como o tamanquinho, que acho colorido e prático para o verão, a bolsinha atravessada e o colarzinho bem rente ao pescoço.”
“Ela era dona de uma galeria de arte, então pensei em um estilo minimalista, que considero característico das curadoras e de pessoas que lidam com arte.
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Achava a Dafne uma figura bem nova-iorquina e aproveitei que a Flávia Alessandra vinha de uma exposição muito sexy da personagem anterior, dançarina de pole dance, na novela Senhora do Destino, para sugerir essa transformação.
A partir desse trabalho, coincidência ou não, a Flávia comecou a usar um cabelinho mais curto, uma roupinha mais básica. Ou foi impressão minha, ou o figurino da personagem influenciou o guarda-roupa da atriz na vida real.
O editorial de moda mudou muito pouco o jeito de vestir da personagem. A base do estilo da Dafne é preto.
Mesmo os vestidinhos de verão ela usava com legging preta e sempre priorizava as joias ou bijuterias que tinham um apelo de design.”
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“Cláudia Abreu é uma atriz excepcional, e eu acredito que não há figurino que transforme uma alma tão boa, como a dela, em uma alma tão má, como a da Laura, se não houver, junto com a roupa, um talento imenso da atriz. Ela foi uma vilã impecável, uma das personagens que mais marcaram a minha carreira.
O curioso é que o guarda-roupa da Laura não apresentava muito esse signo da maldade. A moda que realmente pegou foi a combinação de jeans com as batinhas bordadas, com brilhantinhos. Antes mesmo de a novela começar, a Laura era minha principal aposta como a dona da moda que vingaria nas ruas. O lencinho no pescoço e as sandálias de cordas altas e salto anabela usados por ela, assim como a coleira de ouro que passou a ostentar após ficar rica, também chamaram a atenção. A modelo do editorial é praticamente a réplica do que foi usado na época da novela.”
“A Júlia Matos foi o começo de tudo, foi quando a moda entrou na minha vida. Levei um susto com a repercussão. A inspiração para o figurino partiu da Fiorucci, uma marca que a Gloria Kalil estava trazendo para o Brasil. Já tinha ouvido falar que a Fiorucci usava muito dourado nas peças e achei interessante a proposta.
Fui visitar a loja e, quando vi a calça de cetim vermelha, me apaixonei. A Júlia estava voltando da Europa, depois de ter cumprido pena na cadeia, e era uma mulher tão revoltada que, se voltasse vestindo Chanel, não teria a menor graça (risos). O cabelo era completamente rebelde. A Sonia tem um cabelo muito crespo e nós tiramos partido disso em vez de tentar alisar. Em 1978, era o cúmulo da vanguarda.
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A modelo está menos nua que a personagem, que usava apenas um sutiãzinho. Achei que, hoje em dia, uma camiseta de paetê ficaria mais bonito. O detalhe do lurex saiu da meia e foi para o pescoço, para incrementar o look.”
Fotos: Letícia Remião. Assistente de fotografia: Glauco Arnt e Gabriel Lopes. Tratamento de Imagem: Alessandro Castro Fialho. Criação e direção: Mauren Motta – MM Conteúdo (www.maurenmotta.com.br). Estilo: Marília Carneiro. Assistente de Marília Carneiro: Paula Carneiro. Produção de Moda: Fergs Heinzelmann (MM Conteúdo, tel. 3072-6875). Assistente de Produção: Fernanda de Jesus e Mari Korman (MM Conteúdo). Beleza: Sergio Zurita e Hortência Guterres (Sexton, tel. 3346-2916). Modelos: Tatiane De Conto, Deborah Ahrens, Leticia Kleemann e Sabrina Monteiro (Way Model, tel. 2827-5500), Jessica Gaio (Joy Model, tel. 3312-5672). Lojas: Renner (2101-3200), Pé de Meia (3209-1030), Twin Set (3311-6972), Le Lis Blanc (3367-5958), Bob Store (3222-2239), Espaço Fashion (3257-9124), Paquetá Esportes (3901-1951), Maria da Praia (3018-7582), Marília Capisani (3346-9358), Showroom Azzarini e Marx (3264-5005). Sapatos Grendha (www.grendha.com.br).