Imagine a expectativa que a vinda de um grupo francês ao Festival de Dança causaria aos joinvilenses, que todos os anos fi cavam surpresos com os espetáculos da abertura. Depois de “Lamento dos Escravos”, em 1988, a sétima edição do Festival só podia superar aquele show com a vinda da primeira companhia internacional, o Balé Lolita, da França.

Continua depois da publicidade

Mas o que os joinvilenses viram na noite de 14 de julho não era nada do que esperavam. Com a coreografi a “Mouse Art”, o Balé Lolita passou quase duas horas fazendo um espetáculo com requintes de expressionismo alemão – e o público achou tudo muito chato.

– Muita gente não entendeu nada. Era um grupo que estava à frente do seu tempo – avalia Albertina Tuma, coordenadora geral do Festival.

A jornalista Tusi Helena, que apresentava o festival, lembra-se da reação da plateia.

– Ficou um silêncio e uma expressão de “ah, era isso?”. Acho que o público esperava outra coisa, a apresentação era muito vanguardista – conta Tusi.

Continua depois da publicidade

Para piorar a situação, os bailarinos mostraram uma antipatia com a qual a organização não estava acostumada, já que as companhias brasileiras vendiam sorrisos.

E a sorte não estava do lado do Festival: quando foram buscar os bailarinos no restaurante Zopp, depois do jantar, deu tudo errado: a artista plástica Odete Nery, que dava uma forcinha como tradutora, viu o trinco da porta da kombi cair bem na hora em que o motorista abria o veículo para os franceses entrarem. Pra terminar, o assoalho do teto do carro caiu assim que a primeira bailarina entrou.

– Com esses erros é que pudemos aprender para deixar as outras edições bem redondinhas – afirma Albertina.

A primeira vez de Cecilia

Entre as principais lembranças de Cecilia Kerche em 1989 está o frio daqueles dias. Mas se a bailarina era o que ela mesma defi ne como “uma ilustre desconhecida” do público, isso mudou para sempre depois daquele dia gelado. Ainda sob aplausos, ela saiu do palco e correu para o camarim.

Continua depois da publicidade

– Como estava muito frio, eu queria me vestir depressa. Enfiei os tênis, vesti um casaco e enrolei um xale na cabeça. Aí já não escutava mais nada – conta.

O que Cecilia não escutava era a ovação do público. Já desabotoando o corpete, ela viu entrar Albertina Tuma, Margit Olsen e Sônia Borges.

– A Albertina me perguntou: “Cecilia, você não vai voltar? Eles ainda estão aplaudindo!” Mas eu não acreditei que eram pra mim – revela.

Ao voltar ao palco, as luzes se acenderam e o público, extasiado, gritou e aplaudiu mais ainda. Depois disso, Cecilia perdeu a conta de quantas vezes voltou ao festival, para dançar, ensinar e avaliar. Hoje, ela é conselheira do Instituto Festival de Dança.

Continua depois da publicidade

Você sabia?

Foi neste ano que começou pra valer o projeto Palco nas Empresas, que até hoje permite aos funcionários das empresas ter acesso aos espetáculos que eles nunca assistiriam – por não poderem pagar as entradas, por trabalharem no horário das apresentações ou simplesmente porque não usariam seu horário de folga para a dança. Montado em cima de um caminhão, o palco volante chegava às empresas na hora dos intervalos e emocionava muitos operários.

Finalmente a imprensa nacional descobria a grandiosidade do Festival de Dança e abria espaço para grandes reportagens em jornais como o “Jornal Nacional”, o jornal “Hoje” e até o “Fantástico”. O palco nas indústrias, aliás, chamou a atenção do jornalista Maurício Kubrusli, que fez uma reportagem especial com os operários.