No Morro do Baú, em Ilhota, qualquer um entra livremente, o prédio na entrada segue abandonado e o cenário mais remete a Chernobyl sem radiação do que a um lugar que pode virar parque natural. Se lá, em meio à Mata Atlântica, o espaço não evoluiu nos últimos meses para voltar a ser uma grande área dedicada à preservação, pelo menos nos bastidores algumas movimentações indicam que o projeto sairá do papel.

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Com verba garantida pela compensação da construção de uma fábrica da BMW em Araquari, a prefeitura finalizou o plano de trabalho no local, que é pré-requisito para dar sequência ao projeto.

O documento dita o que será feito, quando e quanto custará. Levantamento fundiário, elaboração do plano de manejo, contratação de pessoal, aquisição de materiais, de um veículo 4×4 para fiscalização e monitoramento, sinalização do parque, entre outros itens necessários para o funcionamento do local, fazem parte do relatório. A papelada foi aprovada em setembro pela Fatma, o que rompe mais um obstáculo burocrático.

Fechado para visitação desde a catástrofe climática de 2008, o Morro do Baú foi transformado em parque no ano passado, por meio de um decreto-lei. Porém de lá para cá, devido à mudança na gestão municipal, adaptações foram feitas, o que adiou o processo. Abrir o local para que as pessoas possam frequentar, tal como o Spitzkopf, em Blumenau, requer um pouco mais de trabalho, já que é preciso antes seguir o que prevê o plano para o parque.

– É superficial pensar que ele esteja aberto para visitação sem antes cumprir tudo o que obriga o Sistema Nacional de Unidades de Conservação. Um parque como esse precisa respeitar uma série de itens, como plano de manejo, levantamento topográfico… Tudo isso já está previsto no processo ambiental – relata o secretário de Agricultura e Meio Ambiente de Ilhota, Antônio Robson Dias Filho.

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Para poder executar o que foi previsto, porém, o município de Ilhota precisa comprar os 546 hectares onde hoje fica o Parque Municipal Natural Morro do Baú. Esse espaço pertence ao Herbário Barbosa Rodrigues, de Itajaí, que já teria sinalizado interesse em vender o terreno por valores acertados verbalmente, o que ainda não se concretizou. De todo o montante de R$ 2,15 milhões do valor da compensação que é destinado ao parque, 34,8% (R$ 750 mil) é referente ao terreno.

Basta o Herbário querer receber, a Fatma autorizar e a BMW pagar – explica o secretário de Agricultura e Meio Ambiente de Ilhota.

O Santa fez contato com o Herbário para saber como estão as negociações, porém foi informado que o presidente da instituição, Aloisius Barth, é o único que pode falar sobre o caso e está na Alemanha. Ele não retornou ligações nem e-mail até o fechamento desta edição.

Decreto prevê possibilidade de desapropriar a área

Um decreto publicado no Diário Oficial de Ilhota no dia 23 de agosto prevê que o município possa desapropriar a área onde fica o parque “amigável ou judicialmente” – dependendo do desenrolar das negociações. O texto aponta que o terreno, de 5,45 milhões de metros quadrados será comprado pela BMW do Brasil a título de compensação, cujo valor será destinado ao Herbário.

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“Tem contexto de sobra para preservar”, aponta Acaprena

Para o presidente da Associação Catarinense de Preservação da Natureza (Acaprena), Leocarlos Sieves, motivos não faltam para cuidar do Parque Municipal Natural Morro do Baú. Além do crescimento do ecoturismo no Vale do Itajaí, ele aponta o local como um patrimônio para a região e potencial para estudos, sejam com ares pedagógicos aos mais aprofundados a respeito da fauna e flora.

– Tem dias em que chega a ter mais de 300 visitantes subindo o Spitzkopf e o Baú tem o mesmo charme, uma questão até cênica. Não importa de qual ponto se veja, ele sempre oferece um visual bonito. Tem contexto de sobra para preservá-lo. Naquela região não há uma área tão bem cuidada como essa – conta o presidente da Acaprena.

Outro motivo bem específico para garantir proteção ao parque é o jaó-do-sul, uma ave que vive em florestas mais altas, como é o caso do Morro do Baú e é considerada ameaçada de extinção, conforme o veterinário Vanderlei Schmitt. Além dela, mamíferos como gato-do-mato, graxaim e mão-pelada também habitam o local, embora em menor quantidade. Até uma espécie endêmica de sapinho dourado (Brachycephalus fuscolineatus) foi descoberta na região, o que por si só já motivaria a preservação.

Relembre o caso

– Em 2012, quatro anos após ser tomada pela avalanche de lama de 2008, a área é abandonada.

– Em 2013, a Pequena Central Hidrelétrica Passos Maia começa a negociar com o Herbário Barbosa Rodrigues a compra da área para doá-la à Fatma como compensação.

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– Em novembro de 2013, o Ministério Público é contrário à compra por entender que os recursos têm de ficar no Oeste de Santa Catarina.

– Em agosto de 2014 a Fatma determina que Ilhota receba a compensação ambiental do Estaleiro P2 (R$ 1 milhão), instalado em Itajaí. O projeto fica parado com os vereadores e o recurso é perdido.

– Em fevereiro de 2015 o então prefeito de Ilhota, Daniel Bosi, assina um decreto-lei para a criação do Parque Natural Municipal do Morro do Baú.

– Em janeiro de 2016 a prefeitura de Ilhota entrega à Fatma versão do plano do parque no Morro do Baú.

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– Em fevereiro de 2017 a Secretaria de Turismo de Ilhota refaz o plano de trabalho, com previsão de ser entregue à Fatma em agosto.

– Em julho de 2017, a Secretaria de Agricultura e Meio Ambiente de Ilhota encaminha o plano de trabalho à Fatma, com verba garantida pela BMW do Brasil como compensação ambiental pela fábrica construída em Araquari. Dois meses depois, o documento é aprovado.