O destino das cerca de 150 famílias despejadas de um terreno na Avenida das Torres, há dois dias, em São José, virou a principal preocupação da prefeitura e de movimentos sociais, nesta quinta-feira. Mas outra questão – ainda mais polêmica – também veio à tona: o motivo que levou aquela gente a ocupar a área, uma semana antes.

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Segundo os envolvidos, a invasão teria relação com um comício feito semana passada, no Bairro José Nitro, pelo prefeito Djalma Berger, então candidato à reeleição.

Assinatura e aplausos

Na ocasião, ele dizia estar ali para “cumprir um compromisso assumido com a comunidade” e lê um decreto que “desapropria o terreno e o destina a programas habitacionais de baixa renda”. Em seguida, assina o documento, sob aplausos e gritos de “ele liberou terreno para nós” e “tem bastante terra aí”. No dia seguinte, o local amanheceria tomado de barracos e a prefeitura noticiaria, no site oficial, que o decreto fora revogado (perdeu validade).

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Toda a cena foi gravada, e o vídeo, de quase oito minutos, foi entregue anonimamente ao Ministério Público. A investigação, iniciada semana passada, ganhou força após o despejo. O promotor eleitoral Jadel da Silva Júnior apura se a conduta de Djalma teria responsabilidade sobre os fatos transcorridos a partir de então.

– Estamos investigando a possível prática de crime eleitoral e a relação dos fatos entre si. Principalmente porque essas famílias passam por situação constrangedora por causa disso.

Ação chega ao Fórum em breve

Além do vídeo e da transcrição do áudio, a ação do promotor está baseada em depoimentos de testemunhas e na tentativa frustrada do proprietário do terreno de desapropriar o local há anos – o que, até então, nunca teria sido interesse da prefeitura. A denúncia deve ser protocolada no Fórum, semana que vem.

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Grupos estão abrigados em ginásio

Depois de serem retiradas do terreno pela PM, quarta-feira, cerca de 70 pessoas encontraram abrigo no Ginásio Municipal do Bairro Jardim Zanellato.

O local foi cedido provisoriamente pela Secretaria de Assistência Social de São José, numa negociação feita por movimentos sociais, que passaram a acompanhar o caso. Junto com a Defesa Civil, o órgão distribuiu colchões, cobertores e comida.

– Eles não têm nada. E o pouco que tinham ficou no terreno, porque não tiveram tempo para levar tudo. São vítimas dessa situação que se formou e precisam de ajuda – afirma um dos integrantes do Movimento Moradia, Jonathan Jaumont.

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A família de Cimara Camargo, 20 anos, nem pensou duas vezes em sair do aluguel, que suava para conseguir pagar todos os meses. Usou o dinheiro que seria destinado às despesas do mês para construir um pequeno barraco no novo terreno. Todo o material comprado ficou lá, inclusive móveis e roupas.

– Não sei o que fazer, nem o que vai acontecer agora – lamenta Cimara Camargo.

“Não tenho nada a temer”

Por telefone, o prefeito Djalma Berger (PMDB) conversou com a Hora sobre o caso. Confira os trechos da entrevista:

O que aconteceu naquele dia?

Djalma Berger – Foi uma reunião política normal. Estivemos lá com a intenção de conversar com as pessoas do bairro. Na ocasião, comuniquei sobre a regularização daquele terreno, mas deixei claro que se tratava da área já ocupada há muitos anos, aquela que tem autorização dos proprietários para receber algumas famílias.

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Mas naquela ocasião o senhor teria assinado um decreto de desapropriação.

Djalma – Não assinei nada naquele dia. Falei apenas da regularização daquele trecho, assim como estou fazendo com tantos outros terrenos irregulares do município.

Esse trecho pode receber mais moradores?

Djalma – Não. Deixei isso claro.

As pessoas que estavam na reunião não moram no terreno. Isso não poderia confundi-las?

Djalma – De maneira alguma. Só se confundiram aqueles que quiseram se confundir. Jamais quis ter a intenção de tumultuar o processo.

E por que o decreto foi revogado no dia seguinte?

Djalma – Justamente porque teve essa interpretação equivocada e gerou problemas. Só o que faltava agora era incentivarmos invasão.

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Mas o Ministério Público está investigando…

Djalma – Eu nem sei o que estão investigando. Ninguém me comunicou nada. Mas, se solicitado, vou dar a nossa versão dos fatos. Não tenho nada a temer.