Neste sábado a greve dos servidores públicos chega a 32 dias e se estabelece como a mais longa da história de Blumenau, sem sinais de que vai terminar em breve. A última mobilização deste vulto ocorreu há 11 anos, em 2003, e durou 31 dias. A queda de braço entre trabalhadores e prefeitura tem sido dura, mas a dor está afetando quem não está diretamente envolvido na briga: a população, que precisa se virar do jeito que dá e quando dá. Depois de tanto tempo, Romilda, Meridiane, Natalício e tantos outros precisam apenas que se chegue a um acordo.

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O coração apertado acompanhou Romilda no trabalho quase um mês. Ela não queria, mas deixar o filho mais velho de 11 anos cuidando da irmã pequena foi a única solução para a falta de creche e escola. Quando os ponteiros chegavam ao número 11, era hora do beijo nas bochechas e o reforço nas recomendações. Nada de ir para a rua, Douglas. Portão trancado e chave ao alto para que a branquinha e geniosa Emily não alcance. Paciência, Douglas, ela só tem três anos. Douglas, a mamadeira está pronta, é só esquentar no micro-ondas. Não briguem. Deixem a TV ligada em algum desenho. Brinca com ela, Douglas.

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Romilda saía da Itoupavazinha rumo ao trabalho e via o relógio parar. A cada meia hora, uma ligação para conferir se estava tudo bem com os dois. O relógio só voltava a tiquetaquear depois das 15h, quando o marido de Romilda chegava em casa. A solução parcial para o problema veio justo de onde ela não esperava e, na verdade, até tinha receio. Tentando desde janeiro fazer uma cirurgia por conta de uma endometriose, o procedimento foi feito há poucos dias. Sob atestado médico, ela pôde ficar em casa com as crianças. Na segunda-feira o marido entra em férias para ficar com eles. Com o carnê do IPTU que teve 110% de reajuste nas mãos, Romilda desabafa:

– Nós pagamos nossos impostos. Eu paguei meu IPTU. O que a gente ganha em troca? Os servidores têm direito de reivindicar o que acham certo, mas eles tinham que ter chegado a um acordo há muito tempo.

Meridiane de Lara encontrou uma solução diferente, mas não menos angustiante que a de Romilda. Naquele 21 de maio, quando a greve começou, Meridiane pensou que a paralisação seria rápida. Faltou ao trabalho para cuidar do pequeno Marlon, 4 anos. Sem ter a quem recorrer, ficou em casa nos demais dias. Pensou em pagar alguém, mas numa creche improvisada e já cheia cobravam quase o mesmo que ela ganha por dia na indústria que trabalha na produção. Ela pagaria para trabalhar.

Na última segunda-feira a creche que Marlon frequenta, na Velha Central, voltou a atender. Meridiane pôde voltar ao trabalho e contabilizou o prejuízo. O salário virá pouco mais de R$ 100. Tentou negociar um parcelamento no desconto dos dias em que faltou, mas não foi aceito. Agora teme o futuro do emprego.

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– Só quem passa por isso sabe como é difícil. Quem não tem filho que vai para a creche não tem ideia do que a gente passa. Fiquei em casa com ele, mas não fiquei tranquila. Não foram férias – desabafa Meridiane.

Como Meridiane e Romilda, há um mês o desassossego acompanha Natalício Nolli. Dois carimbos. É o que ele precisa para que se dê continuidade ao tratamento da esposa, Merendina Machadio Franzen. Acamada e debilitada, Merendina depende do marido, que depende do poder público para que a esposa acometida por câncer há três anos possa ter esperanças de melhora. Além de não conseguir fazer os exames por falta de encaminhamento do posto de saúde da região onde mora, que está fechado,

Natalício agora precisa peregrinar em busca dos medicamentos. Alguns teve de comprar. Sem carro e com um problema na coluna que adormece as pernas, sairá da Itoupavazinha na segunda-feira para tentar a liberação de novo dos exames na Policlínica e vai a postos de saúde nos bairros vizinhos para buscar os remédios que faltam.

– Ela precisa dos remédios e dos exames. Se ela não fizer, vai prejudicar a quimioterapia. O jeito é pegar o ônibus e ir atrás em outros lugares – conta Natalício, 62 anos.

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