O presidente Jair Bolsonaro (PL), candidato à reeleição, mudou após quatro anos seu discurso sobre o uso de dinheiro vivo para a compra de imóveis, prática apontada por especialistas como meio para lavagem de dinheiro.

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Ao comentar reportagem do UOL, que apontou uso de recursos em espécie por ele e seus familiares na compra de imóveis, ele disse nesta terça-feira (30) não ver problemas nesse tipo de pagamento.

— Qual é o problema de comprar com dinheiro vivo algum imóvel. Eu não sei o que está escrito na matéria… Qual é o problema? — disse, após participar de uma sabatina em Brasília.

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Há quatro anos, em entrevista à Folha de S.Paulo sobre sua evolução patrimonial, ele descartou ter usado dinheiro vivo nas transações.

— Levar em dinheiro e pagar? Geralmente é DOC. Levar em dinheiro não é o caso. Pode ser roubado. Tira do banco direto e manda para lá. Eu não guardo dinheiro no colchão em casa — disse em janeiro de 2018.

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Ele também ironizou na ocasião a ex-presidente Dilma Rousseff (PT), que havia declarado na eleição de 2014 possuir R$ 152 mil em espécie:

— Eu não guardo dinheiro no colchão em casa. Tem muita gente que declara. Até a Dilma disse que declarava uns cento e pouco mil dentro de casa. Eu nunca declarei isso aí.

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Na entrevista em janeiro de 2018, ele também se queixou do fato de a reportagem, na ocasião, também abordar a evolução do patrimônio de seus três filhos políticos. Ele citou a mãe, Olinda Bolsonaro, como exemplo.

— Você tem que divulgar é o meu patrim ônio. Daqui a pouco você vai querer pegar minha mãe, com 91 anos de idade. Levantar a vida dela. Meu pai já morreu. Meus irmãos. Tem que pegar o meu. Esquece meus filhos — afirmou.

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A reportagem do UOL, divulgada nesta terça, afirma que, desde os anos 1990 até os dias atuais, o presidente, irmãos e filhos negociaram 107 imóveis, dos quais pelo menos 51 foram adquiridos total ou parcialmente com uso de dinheiro vivo. O valor gasto desta forma foi, segundo a reportagem, de R$ 13,5 milhões.

A prática foi identificada a partir do uso da expressão “em moeda corrente nacional” para descrever o meio de pagamento da transação em escrituras públicas. Ela costuma ser usada para indicar o uso de recursos em espécie.

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O uso de dinheiro vivo não é crime, mas é apontado por especialistas como um meio de lavagem de valores obtido por meios ilícitos em razão da dificuldade de rastreio pelas instituições financeiras.

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De acordo com o Ministério Público do Rio de Janeiro, essa foi a forma de captação de recursos de ex-assessores pelo senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) no esquema da “rachadinha”. Promotores afirmam que o filho do presidente recolheu esse dinheiro e praticou lavagem por meio da compra de dois imóveis em Copacabana.

Flávio foi denunciado sob acusação de peculato, lavagem de dinheiro e organização criminosa, mas o caso foi arquivado após o STJ (Superior Tribunal de Justiça) anular as principais provas do caso. O MP-RJ afirma que pretende reabrir a investigação.

Dados da investigação, contudo, mostraram que Bolsonaro teve, quando deputado federal, transações e práticas semelhantes às que levantaram suspeita contra o seu filho mais velho.

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Áudios divulgados pelo UOL em julho do ano passado sugeriam atuação direta de Bolsonaro no esquema. Nas gravações, a fisiculturista Andrea Siqueira Valle, ex-cunhada do presidente, afirma que ele demitiu o irmão dela porque ele se recusou a devolver a maior parte do salário dele como assessor:

— O André deu muito problema porque ele nunca devolveu o dinheiro certo que tinha que ser devolvido, entendeu? Tinha que devolver R$ 6.000, ele devolvia R$ 2.000, R$ 3.000. Foi um tempão assim até que o Jair pegou e falou: ‘Chega. Pode tirar ele porque ele nunca me devolve o dinheiro certo’.

*Reportagem de Italo Nogueira e Matheus Teixeira