Os bombeiros militares que resgataram as duas primas mortas soterradas em Camboriú, no Litoral Norte, foram os mesmos que salvaram uma criança de nove anos, que estava na cama com elas. O difícil trabalho arrancou lágrimas mesmo de quem está acostumado a atuar em tragédias.

Continua depois da publicidade

Receba notícias de Balneário Camboriú e região por WhatsApp

O subtenente de Balneário Camboriú, Jorge Batista, conta que ele e outros quatro colegas de equipe foram escalados para ajudar nas ocorrências de alagamentos na cidade vizinha, na noite de segunda-feira (19). Horas depois, por volta das 2h de terça (20), um chamado no bairro Monte Alegre mobilizou os profissionais.

Ao chegar, o grupo se deparou com o deslizamento de terra que destruiu parcialmente a casa localizada em um morro, ao lado de um barranco. A situação era totalmente desfavorável e havia risco de um novo desmoronamento. A fiação exposta indicava também que o local estava energizado. Porém, se desligassem a luz, os bombeiros não tinham como trabalhar.

Em um primeiro momento, sabendo da situação de risco, os profissionais cogitaram nem sequer começar o resgate. Até que ouviram a voz de uma criança.

Continua depois da publicidade

— Eram três jovens deitadas na cama. A menor delas estava no meio. Ela respondeu quando a gente chamou e isso nos fez continuar. Se não tivesse respondido, teríamos desistido, tamanho era o risco — revela o subtenente.

Jovens mortas soterradas em Camboriú dormiam quando deslizamento aconteceu

De imediato, eles conseguiram tirar o barro que tapava o rosto da pequena. Mesmo sem conseguir abrir os olhos por causa da sujeira e com uma barra de ferro prensando a cabeça dela, a menina falava normalmente.

— Ela segurava a minha mão e dizia: “Tio, vocês não vão me deixar aqui, né?! Falta muito? Está acabando?”. Eu prometi que tiraríamos ela — emociona-se o bombeiro.

A promessa quase não foi cumprida.

Os bombeiros não conseguiam retirar a barra de ferro de cima da garota, que a mantinha presa à cama. O desencarcerador, equipamento usado nesses casos, chegou a quebrar em uma tentativa. Eles corriam contra o tempo, porque além da criança havia Elaine Marques, 17, e Ketelhem Arno Ribeiro, 16, deitadas na cama. Elas, no entanto, já estavam mortas quando foram removidas.

Continua depois da publicidade

Depois de mais de uma hora de escavação, que teve o apoio de populares, e da chegada de um outro desencarcerador, os profissionais conseguiram expandir a barra de ferro e livrar a cabeça da menina.

— O risco era de ceder de novo e cair tudo na cabeça dela. E, se caísse, seria fatal — detalha.

“Não podemos perder ela”

A parede e o ferro de uma porta caíram sobre as jovens durante o deslizamento. Chovia no momento do resgate e a água dificultava não só o trabalho, como trazia um novo perigo: o de matá-la afogada.

Quando finalmente retiraram o primeiro corpo e conseguiram chegar até a pequena, um novo problema surgiu. O cabelo dela ficou preso às pedras. Lá se foram mais pelos menos 30 minutos para cortá-lo, usando uma faca. A todo momento Batista lembrava de outro atendimento feito na semana passada: foi ele e o sargento Murilo Pinheiro que tentaram salvar Benjamim Vieira, de seis anos, que se afogou na Praia Central. O menino não resistiu.

— Eu dizia para o Murilo: a gente não pode perder ela, não pode. Quando ela ficava quietinha, batia um desespero — desabafa.

Continua depois da publicidade

Depois do corte do cabelo e de duas horas de empenho da equipe, Pinheiro conseguiu puxar a criança, que saiu feliz e sem machucados graves.

— Assim que terminou, o sargento Murilo chorou. Foi forte.

Logo depois, o corpo da outra adolescente foi retirado. Batista avalia que ter ficado no meio das duas ajudou a menina, que acabou tendo barreiras de proteção. O colchão amorteceu o impacto da barra de ferro na cabeça dela, analisa também.

Ao sair dos escombros, a menina não disse nada, lembra Batista. O sorriso só veio ao ouvir uma frase do bombeiro, já na ambulância:

— O tio não prometeu que você sairia de lá?

Mortes e estragos em Camboriú

A menina dormia ao lado de Elaine e Ketelhem quando o desmoronamento aconteceu. Naquele mesmo dia, a prefeitura decretou situação de emergência depois de chover mais de 200 milímetros em 24 horas. Nesta quarta-feira, 120 pessoas continuavam em abrigos.

Continua depois da publicidade

A Defesa Civil deve preparar os relatórios necessários para buscar ajuda humanitária e fazer novas vistorias para interdição ou não de imóveis.

Leia também

Itajaí, Balneário Camboriú e região somam prejuízos e limpam ruas um dia após enchente

Mãe tirou filho do quarto segundos antes de deslizamento matar jovens em Camboriú