Um levantamento da prefeitura de Blumenau mostra uma redução de 60% no número de estudantes usando o transporte coletivo na cidade atualmente. Nem mesmo a retomada 100% presencial das aulas na rede pública conseguiu trazer de volta todo esse público para dentro dos ônibus. A falta de dinheiro para pagar a passagem e a dificuldade com os horários das linhas são os principais responsáveis por essa queda, apontam Seterb e diretores de escolas.

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Na casa de João Felipe, de 16 anos, o dinheiro que a mãe ganha é para sustentar a família. Apenas a mulher está trabalhando e precisa pôr comida na mesa para três filhos e o marido. O que sobra vira crédito nos cartões de vale-transporte do trio, mas nem sempre é o suficiente. O garoto consegue economizar os passes pegando carona de moto com um primo, mas o irmão de 10 anos e a irmã de 18 não têm a mesma sorte. 

Eles estudam na Escola de Educação Básica Emílio Baumgart, na Itoupava Central. A casa deles fica a cerca de cinco quilômetros dali. Fazer esse trajeto a pé leva cerca de uma hora na poeira ou na lama. 

É inviável. 

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Na última semana, em pleno fim de mês, o caçula e a jovem não foram à escola. João Felipe conta tirar notas boas e está mais perto do sonho de chegar à faculdade e cursar Arquitetura, mas teme que os irmãos reprovem por falta. 

— A gente precisa muito de passe para as crianças, mas no momento só eu estou trabalhando, aí pesa muito para a gente. E o que eu ganho só dá para comprar alimento — conta a madrasta de João, Erica de Oliveira.

Após ser procurada pela reportagem do Santa, a Secretaria de Estado da Educação informou que irá procurar a família de João e fornecer vale-transporte a ele e aos irmãos. 

Infelizmente, o caso de João não é o único no colégio e explica em partes por que antes da pandemia cerca de 20 mil alunos usavam os ônibus diariamente e agora esse número fica em 8 mil. 

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A diretora conta que já presenciou situações em que as crianças tinham aderido à bicicleta por falta de dinheiro para o ônibus. Quando a bike estragou, o aluno não apareceu na escola. Quando a unidade ligou para família para entender o motivo, veio a dura realidade:

— Nós temos crianças vindo de bike porque não têm como pagar o ônibus. Temos famílias que relatam que o aluno não pôde vir para o colégio porque não tinha o que comer, tinha acabado o kit fornecido pelo Estado, e a bicicleta tinha quebrado, e não tinha como arrumar — conta a diretora pedagógica Maria Isabel Pereira de Carvalho Medereiros. 

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Mas nem toda a redução no número de alunos no transporte coletivo está relacionada a questão econômica. A dificuldade com horários de ônibus que se encaixem com os horários de entrada de saída dos colégios é reclamação recorrente entre os pais. Quando Maria Luzia precisou trocar a escola perto de casa por outra mais longe, imaginava que poderia e voltar usando o ônibus. 

Só que a realidade é outra.

A que existia antes da pandemia e transportava os alunos logo após o fim das aulas foi retirado pelo Seterb. Agora os estudantes do colégio Adolpho Konder que moram no Morro do Concórdia precisam esperar cerca de 30 a 40 minutos no ponto, relata a mãe da garota. 

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Como Glasiela Ramos Nardes não acha seguro, vai buscá-la de carro. Nesse retorno, a costureira garante uma carona para outros dois alunos. Na prática, isso quer dizer três alunos a menos dentro dos ônibus simplesmente porque o serviço como está hoje não atende a real necessidade das famílias.

— É bem complicado. Eu acho que deveria voltar o horário de antes — diz a mãe. 

O que diz a Seterb

A Seterb conhece o problema que não é exclusivo da região e se repete em outros locais de Blumenau. O argumento da secretaria, porém, é de que o processo para restabelecer os horários pré-pandemia é gradativo e ocorre no compasso do aumento da demanda. No começo deste mês, por exemplo, 38% dos horários ainda não tinham sido reativados. Isso levou não só estudantes, mas o usuário comum a encontrar alternativas para se locomover na cidade.

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