O sujeito que põe em ação o verbo romper está condenado a uma experiência traumática. Nem almas petrificadas passam incólumes por uma ruptura. Mas isso nem sempre é ruim. O trauma distribui dores e ensinamentos variáveis com a sensibilidade de cada um.

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Descobrimos a pedagogia do rompimento logo cedo, quando alguém adverte que crescemos demais para andar de balanço. A sensação de perda é dilacerante. Nunca mais sentiremos o vento contra o rosto, o formigamento na barriga e o ranger da corrente enferrujada. O parquinho torna-se então um lugar proibido.

E o que dizer do primeiro amor juvenil? Não é possível explicar como vivemos 13, 14, 15 anos sem aquele hálito agridoce, sem o ar reconfortante expelido por aquelas narinas. Tornamo-nos siameses unidos por mãos e lábios. São cumplicidades efêmeras, desfeitas sem motivos razoáveis, mas pelas quais derramamos um dilúvio de lágrimas. Nossa! Como dói.

Resta um consolo, pelo menos. Ao estilo do adestramento de cães, aprendemos por reflexo condicionado. Captamos os sinais do rompimento a léguas, de modo que, quando o vazio se instaura, cortante, já não parece tão assustador. Assim, pessoas entram e saem de nossas vidas como frentes frias com campos de Urupema. Amizades tidas como indissolúveis se revelam sazonais. Nem sequer notamos o fim desses ciclos de superficialidade, que se desfazem aos poucos, como fumaça.

A sucessão de episódios descartáveis alimenta a sensação de imunidade às rupturas. A prepotência só desmorona quando deparamos com novas modalidades de rompimentos, como, por exemplo, a perda da fé na Seleção Brasileira.

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Os canarinhos sempre me criaram problemas, porque meu clube do coração também se chama Brasil. Quando eu respondia para quem torcia, nunca faltou alguém para dizer “eu também”. Já cheguei a pensar que o Xavante detinha a maior legião de fãs do país. É um tentação ficar com a pureza da resposta das crianças. É a vida. É bonita.

Mais tarde, fui estranhando a quantidade de moradores da Europa nos defendendo, às vezes sem ter jogado em nenhum de nossos clubes. Porém, Dom Pedro consolidou nossa independência pagando caro por almirantes mercenários. Não seria eu a alimentar pretensões de pureza maiores do que as do imperador.

Aí veio a reeleição de Dilma, decidiram que a mulher não governaria e uma gente saída das academias e dos salões de beleza elegeu a camisa da CBF como símbolo da luta contra a corrupção que o PT não inventou, mas usufruiu com extrema competência. Foi uma demonstração de insanidade tamanha que, ali, rompi com a Seleção Brasileira.

Resolvi abraçar a simpatia pela Celeste, a brava seleção do Uruguai. Até me assanhei nas redes sociais, o que, em tempos de acirramento de ânimo, se mostrou um equívoco.

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Um sujeito que julgava amigo, catarinense, me chamou de “gaúcho safado”, me aconselhou a “sair daqui e ir para casa”. Enfim, há muito a Seleção reflete o mais insano de nós.

Não culpem o Dunga.