A proposta do governo federal de um novo pacto federativo no Brasil, incluindo a incorporação de pequenos municípios com menos de 5 mil habitantes e receita própria insuficiente, pode afetar em Santa Catarina especialmente cidades que conhecem a poucos anos o gosto da independência. Dos 39 municípios catarinenses que se enquadrariam nos parâmetros do governo, conforme um levantamento do Tribunal de Contas do Estado (TCE-SC), 25 foram emancipados na década de 1990.
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O levantamento do histórico das cidades foi feito pelo NSC Total com base no levantamento do TCE, que usa dados financeiros dos municípios em 2017 e estimativas populacionais do IBGE. A lista mostra que, das 39 cidades em risco, 30 nasceram a partir da Constituição de 1988. Todas fazem parte de um boom de emancipações que se seguiu a partir da redemocratização do Brasil, e que viu em Santa Catarina uma média de novas cidades acima da nacional.
— Na ditadura era muito difícil criar novos municípios. Tinha 3991 municípios no Brasil antes de 88. Aquele boom com a Constituição foi muito positivo naquele momento. A população entrou no movimento e em Santa Catarina foi ainda maior que no país. No Brasil houve um aumento de 40% no número de cidades, em SC foi de 48% — conta o professor de arquitetura e urbanismo da Universidade Regional de Blumenau (Furb) e especialista em planejamento urbano e regional, Christian Krambeck.
Com o caminho aberto a partir de 1988, Santa Catarina viu em 1995 a assinatura de diversas emancipações de municípios que já brigavam por anos para deixar o status de distrito. Agora, a proposta da PEC do novo pacto federativo no Brasil põe em dúvida se alguns desses municípios vão manter a independência.
— Foi um movimento muito importante para a democracia no Brasil, para a aprendizagem da população do interior. Além da transferência de recursos, eram municípios que jamais teriam a condição de oferecer qualquer qualidade de vida para as pessoas, os sistemas jamais chegariam naquelas populações — analisa Krambeck.
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Quatro das cidades em risco foram desmembradas de Chapecó
Caso a PEC seja aprovada e sancionada, o texto original explica que as cidades com menos de 5 mil habitantes terão até junho de 2023 para provar a sustentabilidade financeira. Caso não comprovem, serão incorporadas pelo município vizinho de melhor condição financeira (com um limite de três incorporações para cada cidade). Ou seja, não necessariamente as cidades voltariam a fazer parte do município da qual se desmembraram no processo de emancipação.
Conforme o levantamento do NSC Total, entre das 39 cidades catarinenses em risco, quatro eram distritos de Chapecó: Cordilheira Alta, Águas Frias, Guatambú e Nova Itaberaba. Maravilha e São Miguel do Oeste, também no Oeste, são as origens de outras seis pequenas e novas cidades que estão na lista do TCE.
"Não é só com dinheiro, isso fala com pessoas", diz professor
Para Christian Krambeck, que coordena através da Furb no Vale do Itajaí um projeto de consultoria com pequenos municípios, é fundamental que o governo discuta um novo pacto federativo e inclusive com a chance de extinção de municípios, mas com mais critérios do que apenas população e situação financeira:
— Isso não mexe só com dinheiro, fala com pessoas, tem que ter muito cuidado. É preciso ter sustentabilidade financeira como fator de análise, mas tem que considerar também distância do centro urbano, tipo de economia, grau de geração de receita do município. O movimento em si é correto e o primeiro passo tem que ser proibir a criação de novos municípios, o segundo é fazer um amplo estudo para ver onde faz sentido fundir. Fazer isso sem audiência pública, participação da comunidade, é um retrocesso democrático. Seria mais moroso, mais demorado, mas é fundamental reforçar, defender e respeitar os processos democráticos desse país.
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