Chiara Gadaleta viveu quase todos os setores do mercado de moda. Entrou como modelo, é stylist, consultora de moda das mais requisitadas, designer, empresária (teve a grife Tarântula), apresentadora do GNT e, claro, consumidora.
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Hoje ela juntou todo seu conhecimento para um projeto mais ousado, mexer, verdadeiramente, em pilares fundamentais deste mercado. Da produção, à concepção, passando pela venda, ela prega um comércio criativo, justo e o mais desafiador, que respeite o meio ambiente.
Fundadora do Instituto Ser Sustentável com Estilo (sersustentavelcomestilo.blogspot.com), ela se comunica por meio do blog, de palestras em todo o país, oficinas de reciclagem e uso de materiais orgânicos, visitando e interagindo diretamente com produtores.
Chiara sonha em mudar este mercado para que, na hora de comprar uma roupa, você compre também um mundo melhor. O sonho já é realidade para esta italiana nascida em Nápoles, criada em São Paulo e formada em moda pelo incensado Studio Berçot em Paris. Casada com o o fotógrafo Daniel Klajmic, mãe de dois filhos, ela é dona de um estilo bem próprio. Alta, magra, tatuada, com personalidade a altura de carregar qualquer produção, Chiara abraça uma causa que é transformadora.
Dia 18 de junho, ela estará na Fenac participando do 2º E-Blogs, encontro somente para convidados, especialmente 60 blogueiras de moda do Estado, quando alertará para os impactos sociais e ambientais do consumo sem consciência ecológica. Mas antes, direto de uma sessão de fotos para a revista Vogue Brasil, ela bateu um papo com a coluna.
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Estilo Próprio: Você já trabalhou de uma certa maneira em todas as pontas nesse mercado de moda?
Chiara: Não sei te dizer em qual eu não trabalhei.
EP: E nessa nova função, com o Instituto, algo lhe surpreendeu neste trabalho?
Chiara: Hoje em dia, viajo o Brasil inteiro dando palestra que falam sobre essa nova maneira de ver a moda, uma maneira mais criativa, mais conectada com as questões ambientais. O algodão convencional que a gente costumava achar que era super maravilhoso, no fundo a gente sabe que é o mais cancerígeno. Aí vem as opções orgânicas, com materiais reciclados. É uma questão de cidadania também. Realmente comecei a levantar a bandeira de tentar fazer com que a moda e a beleza se transformem em agente de mudança. Como é que através da moda, vou conseguir conscientizar as pessoas. Mas penso numa moda mais clean, sem deixar de ser uma moda glamourosa.
EP: Sua bandeira é a do consumo consciente?
Chiara: Exatamente. É muito legal você pode comprar uma peça maravilhosa, caríssima. Só que e aí ? Sabe se é de uma indústria mais limpa? Precisamos pensar a moda mais profundamente, mas sem nunca deixar de lado o glamour e o estilo.
EP: O início da cadeia da moda, o artesão, é muito desvalorizado. De alguma maneira o Brasil, tão famoso pelos trabalhos manuais, sofre de baixa autoestima neste setor?
Chiara: Claro, mas é um ciclo vicioso. Os artesãos, de certa forma, são desvalorizados e ficam com a autoestima baixa. Para você ter uma ideia, as avós não querem mais passar suas habilidades para filhas nem as netas. Elas batalham outra coisa, vão trabalhar em telemarketing mas não mais como costureiras, nem piloteiras. Quem faz corte (de roupa) também não, elas não querem mais porque se sentem desvalorizadas. Isso é uma pena, porque a nossa cultura vai embora, os ofícios vão se perdendo.
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EP: E os estrangeiros estão crescendo nisso?
Chiara: Aí vem uma marca estrangeira, usando o puramente artesanal, o tricô, crochê. São trabalhos lindos, só faríamos no Brasil 30 vezes mais bonito. Só que não fazemos justamente por causa da desvalorização. O artesão se sente desvalorizado primeiro, porque não conhece o valor do seu trabalho. Ele também não se valoriza para o intermediário, e são muitos intermediários nesta cadeia de moda. O estilista, lá no topo, não quer pagar muito e a distribuição também não tem muito lucro. É um capitalismo que ficou um pouco exagerado, não estabelecendo relações honestas, pois sempre alguém sai perdendo. E quem sai perdendo mais é o produtor, é o artesão lá da pontinha. Acredito que existe uma outra maneira de ver as coisas, em que todo o mundo sai valorizado.
EP: Alguém lendo esta entrevista pode pensar: “Ok, gostei da proposta da Chiara, mas como devo fazer?”. Como iniciar um consumo consciente?
Chiara: Primeiro de tudo, a gente tem que parar para pensar. A gente está tão acostumada a comprar no impulso, sem se tornar um consultor ativo. O mercado costuma jogar um produto e o consumidor pega. O que digo é que antes de pegar esse produto, é preciso parar e pensar, olhar a etiqueta, ver onde foi feito, pesquisar que marca é aquela, olhar. É preciso pensar: “Eu tenho um papel maior em cima disso”. Tem que questionar o que estou comprando, de quem é a roupa, como ela é feita, com que material. Existem vários sites que falam sobre moda, como o meu, e por meio deles pode se dar a conexão com milhões de outras informações.
EP: Outra crítica frequente neste mercado de moda é que as roupas no Brasil são muito caras. Você concorda com essa crítica?
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Chiara: É o pensamento super capitalista, um pouco anos 80, de que a pessoa tem que ganhar muito dinheiro custe o que custar. E pensar que aquela roupa na loja é tão cara, mas quanto realmente o cara ganhou lá no começo da cadeia de produção? A resposta pode ser quase nada. Isso não é possível. Questões como o tipo de escala, a margem de lucro, cabem a todos nós, o a gente pode dizer que está escrevendo essa história juntos. Na Alemanha, na Inglaterra, na Áustria, enfim, na Europa principalmente, eles já estão há 30, 40 anos pensando dessa forma. E no fundo, tudo isso tem um impacto ambiental. Eu, pelo menos, gostaria que a moda tivesse menos impacto prejudicial e começasse a gerar mais benefícios. O mais interessante e também apaixonante é que cada vez que você conversa sobre isso, já expande está discussão. Este é um tema em constante expansão. São coisas simples que, no fundo, foram esquecidas.