As mulheres cada vez mais ocupam posições de liderança em empresas do Brasil e do mundo, porém certos resquícios do comportamento do passado feminino ainda as acompanham. Por que isso acontece e como contornar o problema? Com base em estudos já publicados e livros sobre o assunto, a consultora Regina Camargo escreve o artigo abaixo destinado a mulheres em altos cargos.
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Modestas demais
(*) Por Regina Camargo
As mulheres já são responsáveis por 55% da força de trabalho nos Estados Unidos. Elas já detém mais da metade das posições gerenciais no mercado americano, embora estejam presentes em menos de 10% das posições de liderança das organizações, uma realidade que se aproxima bastante da nossa, diga-se de passagem. As mulheres também já são maioria lá como aqui nos trabalhos tidos como informais, ou seja, aqueles que não necessitam de diploma de nível superior. Mas, dentro desse contexto, como elas vêem suas carreiras e quais são suas expectativas e perspectivas profissionais?
Segundo uma pesquisa recém concluída pela consultoria norte-americana Novations, representada no Brasil com exclusividade pela Across, elas se consideram pouco demandadas para contribuições independentes, ou seja, não se vêem assumindo responsabilidades maiores em projetos estratégicos para as organizações – uma realidade que também é compatível com o universo masculino. Não é à toa que, tanto elas quanto eles, se avaliam em um estágio mais elevado que seus superiores diretos de fato consideram, embora, nesse quesito, pode-se dizer que os homens mostrem uma auto-estima mais elevada. E é justamente aí que identificamos o ponto nevrálgico dessa história toda: entender porquê as próprias mulheres se valorizam menos nas organizações e quais são as implicações disso.
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As mulheres tendem a se comportar de uma maneira mais modesta do que os homens, sobretudo em trabalhos tidos como ?men?s work?. Partindo do pressuposto de que ambos se consideram ?mal utilizados? dentro das organizações, eles só levam vantagem com uma auto-estima mais elevada: contam com mais feedback para se desenvolver profissionalmente, estão ou parecem estar mais dispostos a assumir maiores riscos, assim como são mais assertivos na hora de assumir desafios.
No seu livro Seduncing the boys club: Uncensored tactics from the woman at the top, a escritora Nina DiSesa provoca: ?Será mesmo que a maior parte das mulheres é muito tímida para levar os créditos pelo que faz, ou há alguma coisa genéticamente errada conosco?? Na verdade, esse comportamento tem mais a ver com a socialização do que com a genética, e o resultado é que as mulheres não se promovem e, consequentemente, têm menos visibilidade nas organizações.
As mulheres normalmente são reconhecidas por possuírem uma inteligência emocional mais apurada, o que proporciona resultados bastante consistentes em trabalhos em equipe, bem como são mais detalhistas e menos sugestionadas nas suas decisões, procurando se basear sempre por fatos concretos. Se isso explica um incremento significativo na participação feminina em posições gerenciais dentro das organizações, por outro lado, também pode ser considerado um fator determinante para sua não presença um cargos de liderança mais alta. Por quê?
O que se espera de um executivo líder é que ele defina os rumos da organização, o que se dá, na maior parte das vezes, a partir de projeções, até mesmo por se tratar de ações com resultados à médio e longo prazo. Ao mesmo tempo, essa peculiaridade faz com que muitas vezes ele tenha que caminhar sozinho, já que em uma posição de liderança o contato com os colaboradores tende a ser menos próximo e, consequentemente, mais objetivo e menos afeito a ?manejos emocionais? do que em cargos gerenciais.
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Enfim, a maneira como as mulheres demonstram poder e influência dentro das organizações se difere da dos homens, basicamente, no seguinte sentido: elas têm buscado concretamente serem percebidas como influências positivas dentro do grupo e tendem a superestimar a segurança dos relacionamentos com os colegas; enquanto eles se esmeram em se destacar individualmente com posições mais firmes e, não é fato raro, se sobrepõem ao grupo em que estão inseridos. O grande dilema, segundo Caitlin Friedman e Kimberly Iorio, autoras da obra The girl?s guide to be a boss, é que ao tentar se posicionar de uma maneira mais assertiva, a mulher é vista como arrogante, ao passo que se ela tenta agir de uma maneira menos emocional e mais contida, é percebida como fria e distante.
Decerto, há desafios e, sobretudo, estereótipos a serem derrubados, tanto para homens como para mulheres, o que não significa que se tenha que colocar por terra o jeito de ser e de ver o mundo de um e de outro. Contudo, é preciso adotar uma atitude mais voltada para ?a must-do thing? do que ?a nice do thing?. E, sem sombra de dúvida, ser modesto ou mesmo tímido nesse universo, não levará ninguém a lugar algum.
(*) Regina Camargo é sócia diretora da Across, consultoria de desenvolvimento organizacional com foco em gestão de pessoas.