As prévias eleitorais argentinas do último domingo, em tese, definiriam listas partidárias para o pleito legislativo de outubro. Apenas em tese, porque os partidos já tinham listas únicas. Também serviriam como “pesquisa”, mostrando a tendência do eleitorado, o que de fato ocorreu.
Continua depois da publicidade
É outro fator, porém, que a torna mais importante. Fica virtualmente inviabilizada a intenção de a presidente Cristina Kirchner mudar a Constituição para conseguir sua re-reeleição e desponta um novo pré-candidato presidencial em 2015: o prefeito do município de Tigre, Sergio Massa.
Massa, 41 anos, era ferrenho kirchnerista. Foi chefe do gabinete de Cristina. Tornou-se dissidente em junho, quando criou a Frente Renovadora e se declarou candidato a deputado. As prévias de domingo, pelas quais ele oficializou a candidatura a deputado em outubro, eram a prova de fogo para dar um salto maior: consolidar-se como pré-candidato presidencial para 2015.
– Massa tem respaldo dos prefeitos da província de Buenos Aires (Tigre fica 30 quilômetros ao norte da cidade de Buenos Aires). Os prefeitos acreditam nele, e são os prefeitos que fazem a política local. Seu gabinete em Tigre funciona como santuário para onde recorrem empresários, políticos e sindicalistas – diz o analista político Joaquín Morales Solá.
Depois da morte de Néstor Kirchner, o peronismo se viu fragmentado. Cristina não tem a mesma habilidade para conciliar interesses políticos. Quando se aproximou do grupo juvenil La Cámpora, abriu mão dos sindicalistas, e isso provocou ressentimentos. Tido como moderado, que, como ex-presidente das Anses (Previdência), conhece a máquina
Continua depois da publicidade
kirchnerista, era o “queridinho da presidente”. Mas se distanciou. Adotou o discurso de que “prefeitos estão mais perto das pessoas para resolver seus problemas” e “devem ser criadas políticas municipais de proximidade e descentralização da Justiça”.
Cristina detestou. Acusou-o de “não ter linha ideológica clara”. Pelo jeito, porém, isso não o impediu de superar por mais de cinco pontos, nas prévias, o candidato kirchnerista, Martín Insaurralde.
– Massa não tem discurso ideológico forte, mas, identificado com as linhas mestras do peronismo, aparece como renovação – diz Patricio Giusto, analista da Pontifícia Universidade Católica argentina.
Formado em Direito, Massa foi, por 10 anos, kirchnerista fiel. Mesmo jovem, era interlocutor sistemático de Néstor e Cristina. Foi Néstor quem, em 2003, o fez chefe da Anses. Ele, então, organizou uma moratória que permitiu a inclusão de 2,5 milhões de idosos ao sistema.
Continua depois da publicidade
Ofensas e casa invadida
Tanto sucesso teve a moratória previdenciária promovida pelos então kirchnerista Sergio Massa que, em julho de 2008, ele passou a ser chefe de gabinete da presidente, em meio a uma crise política apenas um ano depois de Cristina ter tomado posse. O desgaste entre os dois teria começado ali. Documentos do site WikiLeaks relataram que, já como prefeito de Tigre, ele se referiu a Cristina como “monstro covarde e psicopata”. Massa sempre negou, de forma até enfática, ter falado isso.
Como prefeito de Tigre, uma cidade turística de 360 mil habitantes, Massa costuma alardear seu orgulho por ter derrubado os índices de violência locais.
O marketing em torno disso é tão forte que tomou grandes dimensões o episódio em que, três semanas atrás, sua casa foi arrombada. Soube-se depois que o autor da invasão era um guarda da polícia costeira de Tigre, ligado ao Ministério de Segurança. Portanto, ligado ao governo federal.