Zé Dassilva entra na redação de um jornal em Florianópolis com uma pasta preta debaixo do braço. Mostra seus desenhos aos dois editores. Se gostarem, se dispõe a colaborar com algumas ilustrações. Proposta aceita. Falta só combinar o prazo de entrega para fechar o negócio. O danado sorri para eles e tira da pasta uma história em quadrinhos nas medidas exatas da página da publicação.
Continua depois da publicidade
Zé Dassilva: “Saí de SC, mas SC não saiu de mim”
Questionário Proust com Zé Dassilva
Na verdade, a cena ocorreu na sala do apartamento em que um dos editores vivia com a mãe. O jornal era um pasquim alternativo & informal criado, trabalho de conclusão do curso de Jornalismo da UFSC (nota 10 com louvor). Não havia menção a pagamento. Talentoso aluno da terceira fase, 19 anos, morando com os pais e a irmã mais moça, solteiro e sem maiores contas a pagar, Zé Dassilva nem precisaria mostrar tanta proatividade, confiança e senso de oportunidade para conseguir o que queria.
Imagine quando fosse para valer.
Continua depois da publicidade
O outro editor de 1993 assina esta página. Não é a primeira vez que escrevo sobre Zé Dassilva. Em 1996, o assunto foi a estreia dele como escritor, com Histórias que a Bola Esqueceu. No ano seguinte, a contracapa da segunda edição do livro reproduzia um trecho da reportagem publicada em O Estado de S. Paulo: “Experimente contar a história do Metropol para um grupo de amigos. Depois de eles rirem e te chamarem de mentiroso, esfregue o livro de José da Silva Jr. na cara dos bastardos”.
É, nome completo e tudo, herdado do pai, ex-mineiro e ex-bicheiro, caçula de uma família de 13 irmãos. Nascidos na roça, todos foram registrados depois de adultos e, por razões ignoradas, adotaram sobrenomes diferentes. A José, restou Silva, prontamente adaptado pelo Júnior para Zé Dassilva em sua carreira de desenhista – que recebeu um belo empurrão depois que ele encontrou Pedro Sirotsky, do Grupo RBS, em uma festa e o desenhou.
O executivo guardou o desenho. Em 1998, os leitores do Diário Catarinense deparavam-se com um novo chargista. Zé Dassilva estava contente. Ainda morava com os pais, embora já ajudasse nas despesas. Ganhava um dinheirinho com o que gostava, colecionava notícias de josés da silva de todo o país, aproveitava a night e era mimado pela mãe, uma ex-freira que largou o hábito e casou. Até que em 2000 a Rede Globo promoveu um concurso de roteiros.
Dos 1,6 mil inscritos, sobraram 12. Entre eles Zé Dassilva, que nunca havia escrito para TV. No início, ia ao Projac somente para participar das oficinas e reuniões de trabalho. Em 2003, percebeu que para dar um passo adiante não bastaria mais enviar os textos para a emissora, teria de se mudar. Botou a cobertura financiada na Carvoeira, em Florianópolis, à venda e embarcou com a mulher grávida para o Rio de Janeiro.
Continua depois da publicidade
No mesmo ano, voltei de São Paulo para a Ilha – e nossos caminhos voltaram a se cruzar. Em 2006, Zé Dassilva cometeu o desatino de me indicar para criar quatro roteiros para o Globo Ciência. Fiz, ele consertou, a Fundação Roberto Marinho bancou. Em 2011, dividimos a autoria do Almanaque do Futebol Catarinense, uma das realizações das quais mais me orgulho. Acho que o Zé também, nem que seja pelo espaço generoso dedicado ao Criciúma.
Mas, como diz Emicida na sonzeira Salve Black, “a vida levou cada um de nós prum canto”. O foco de Zé Dassilva está em criar personagens, desenvolver tramas e subtramas, inventar as falas dos atores. Ele sempre disse que gostaria de fazer novela. Fez, e logo a das nove, logo sob a orientação do consagrado Aguinaldo Silva, logo um sucesso de audiência. Vai fazer outra. Depois, mirou no cinema. Seu filme estreia em abril. Hollywood que abra o olho.