A preocupação com o número de servidores afastados por problemas de saúde não é apenas uma constante no cotidiano de secretários e lideranças do governo catarinense. Em levantamento feito pelo DC com sete dos dez maiores estados brasileiros, cinco informaram que os transtornos mentais e comportamentais representam a maior parte das licenças concedidas a seus funcionários no ano passado.
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Com o maior número de servidores – são 709 mil -, o Estado de São Paulo estima que os transtornos mentais representam 35% das 193 mil licenças aprovadas em 2012. A proporção é semelhante à realidade catarinense, onde 34,6% dos afastamentos ocorreu pelo mesmo motivo. No Rio de Janeiro, o número é ainda maior. Dos 43 mil funcionários licenciados no ano passado, aproximadamente 60% recorreram à perícia alegando sofrer de problemas como stress, depressão e outros transtornos comportamentais. Entre as áreas que mais afastam, Educação e Saúde despontam como as mais preocupantes, ainda que o número de servidores nas duas pastas seja habitualmente maior do que nas demais secretarias.
Os dados coletados mostram que a perícia age de formas diferentes pelo Brasil. Enquanto São Paulo criou uma regra onde é possível faltar até um dia por mês durante seis meses por motivos de saúde, levando os demais casos para a perícia, os funcionários públicos do Estado da Bahia só são encaminhados para a perícia caso seu atestado médico determine um afastamento maior do que 15 dias. Em outros estados, costuma-se observar casos onde o atestado concede mais do que três dias de licença. No Rio de Janeiro, é preciso que o documento seja fornecido por um médico credenciado pelo Estado.
A relativa facilidade em conseguir um afastamento por motivo de saúde no serviço público seria um ponto de convergência nas perícias estaduais. Para o professor Leonardo Secchi, que atua no mestrado em Administração Pública da Universidade do Estado de Santa Catarina (Udesc) e possui doutorado em Estudos Políticos pela Universidade de Milão, a concessão de licenças médicas é um problema de gestão grave para os governos, se comparado com a realidade da iniciativa privada.
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– O número de licenças preocupa principalmente se compararmos com as estatísticas do setor privado quando se observadas categorias profissionais similares. A questão das licenças está associada a questões de produtividade, assiduidade, pontualidade e qualidade no serviço. È uma questão de gestão de pessoas no serviço público. Em outros países e mesmo outros estados brasileiros que estão adotando modelos de gestão de pessoas mais preocupados com o bem-estar e o significado do trabalho para os servidores, conseguem reduzir taxas de absenteísmo, licenças médicas, e melhorar a produtividade e qualidade dos serviços prestados – afirma
Desafio é unificar dados
Com metodologias diferentes de coleta de dados, os próprios diretores de perícias médicas consultadas pela reportagem alegam que é difícil estabelecer comparativos com outros estados porque não há informações suficientes no meio. Segundo o gerente da Divisão Medicina e Saúde Ocupacional do governo do Paraná, Carlos Rose, o tema já chegou a ser sugerido em reuniões do Conselho Nacional de Secretários de Administração (Consad), numa tentativa de estabelecer um padrão nas informações repassadas pelos estados.
– As licenças médicas preocupam todos nós, e é até difícil de saber qual a realidade de outros lugares porque não conseguimos chegar a um consenso sobre quais modelos podem ser usados. Há estados que estão bem avançados nesse assunto, outros que já ficam atrás. Seria um avanço em termos de administração pública se conseguíssemos fazer um retrato fiel do processo de adoecimento do servidor – afirma.
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Sem chegar a um consenso, cada Estado tem procurado desenvolver modelos diferentes de perícia. Enquanto em Minas Gerais técnicos da Secretaria de Planejamento ainda buscam criar um programa que acompanhe o número de licenças em tempo real, o governo da Bahia adotou há sete anos um software que reúne prontuários digitalizados, informações sobre as avaliações médicas e sobre o agendamento das consultas.
Indicações políticas x servidores concursados
Em sua dissertação de mestrado, a especialista em Sociologia Política Simone da Gama Silveira estudou o processo de saúde-doença no Hospital Universitário da UFSC e diz que, para diminuir o número de licenças, é preciso repensar a cultura do funcionalismo público no Brasil, principalmente no que diz respeito às indicações políticas que costumam influenciar no meio.
– Está cada vez mais difícil passar em um concurso, e o profissional que é concursado normalmente é muito qualificado. Aí ele entra em um sistema onde normalmente quem manda não tem qualificação, porque ainda se priorizam as indicações políticas no lugar das técnicas. Esse ambiente acaba sendo desestimulante, e é comum que muitos servidores apresentem quadros de depressão, ou que acabem preferindo por se sentirem desmotivados e sem perspectivas em seu ambiente de trabalho – diz.
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