Passados quase 30 anos da redemocratização do país, o Estado continua a imprimir o mesmo tipo de repressão às manifestações políticas que eram feitas na época da ditadura militar. A avaliação é da representante do Alto Comissariado de Direitos Humanos das Nações Unidas e presidente da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil Seccional Rio de Janeiro (OAB-RJ), Margarida Pressburger. Ela participou nesta quarta-feira de um debate, na Associação Brasileira de Imprensa (ABI), sobre a violência da polícia contra manifestantes e jornalistas durante os protestos que tomaram as ruas das principais cidades do país.
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– As manifestações têm sido um levante da juventude, o que é maravilhoso. Mas o que é intolerável é a violência policial que está sendo gerada. A polícia tem que ser preparada para defender a população e o que a gente está vendo é a barbárie, com a militarização e o uso de armas não letais, que deixam pessoas cegas e aleijadas. A polícia de hoje usa os mesmos meios (da época da ditadura) que a gente gostaria de ver afastados de nosso país – disse Margarida.
O sociólogo Paulo Baía, do Instituto de Filosofia e Ciências Sociais da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), defendeu a desmilitarização da polícia como forma de garantir a defesa da população.
– A violência policial contra os jornalistas é emblemática, porque atinge todas as formas de liberdade. Toda a organização da Polícia Militar foi contra o povo, porque ela foi preparada para proteger o Estado e não a população. É preciso uma nova estrutura, porque convém às elites ter uma polícia que encare as pessoas como inimigas e por isso enxerga a imprensa e os advogados como inimigos – declarou.
A presidente eleita do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Município do Rio de Janeiro, Paula Máiran, ressaltou que cabe aos policiais e também aos manifestantes respeitarem os profissionais de imprensa.
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– Nós temos uma situação muito grave, que é os jornalistas estarem sendo atacados tanto pelo Estado como por alguns manifestantes. No caso do Estado, temos vários ataques com spray de pimenta, com balas de borracha, agressões físicas e cerceamento ao trabalho. No caso dos manifestantes, percebemos um rechaço, com a não aceitação e até a expulsão da presença dos jornalistas nas manifestações. Em ambos os casos, é uma grave ameaça à liberdade de imprensa, que é um dos pilares da democracia – disse.
O presidente da ABI, Maurício Azêdo, fez um apelo à diminuição de violência de todas as partes.
– É um irracionalismo muito grande. Por parte dos manifestantes, eles não têm clareza dos métodos que devem utilizar para fazer valer suas reivindicações. Do ponto de vista da repressão, há uma violência a que agride o Estado Democrático de Direito. A tropa é deseducada e desinformada e não distingue os jornalistas, que estão cumprindo uma atividade profissional a fim de informar a sociedade, que é a principal missão da imprensa – destacou.
O debate sobre a atuação policial nas manifestações ocorreu na sede da ABI, no centro do Rio, e reuniu jornalistas de várias gerações, além de profissionais que vêm cobrindo quase diariamente as manifestações nos últimos meses, incluindo representantes do grupo Mídia Ninja, que transmitiram ao vivo o encontro.