Os gritos de gol, na largada da Copa das Confederações, vieram acompanhados por ruídos de natureza nada festiva: palavras de ordem, estouros de bomba e vaias à presidente Dilma Rousseff na abertura do evento, sábado à tarde, no Estádio Mané Garrincha.
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Estádios de futebol costumam ser ambientes cruéis para pernas-de-pau, mas também para líderes políticos. Assim foi na inauguração do Maracanã, na década de 1950, ou quando o presidente Luiz Inácio Lula da Silva compareceu ao mesmo local para a abertura dos Jogos Pan-Americanos, em 2007. As vaias enfrentadas por Dilma, porém, somam-se a uma série de protestos que vêm sacudindo o país.
Por que, então, protestava quem estava do lado de dentro do Mané Garrincha, e qual a relação com a recente onda de inconformidade que tomou as ruas de várias cidades? Para a cientista política e professora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) Maria Izabel Noll é preciso lembrar que o público no interior do estádio pagou centenas de reais pelos ingressos e representa um estrato social mais abastado, com prioridades específicas.
– Essa classe média consolidada não teve ganhos tão significativos com a estabilidade econômica. Já tinha casa própria, carro. A vaia deixa claro que há uma insatisfação no ar – avalia Maria Izabel.
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Inconformidade inclui várias bandeiras
Essa insatisfação inclui o desconforto com a corrupção, a ameaça da inflação, carências em saúde, educação e segurança pública, além da elevada carga tributária brasileira – tema bastante caro para as classes média e alta. Embora os protestos de dentro e de fora do estádio tenham diferenças, para Maria Izabel todos traduzem inconformidade popular e tendem a se reforçar mutuamente em um ambiente geral de contestação.
– Como há um descontentamento genérico em relação aos governos, não só ao governo Dilma, há um processo de retroalimentação entre esses protestos todos – analisa.
Para o cientista político e diretor do Instituto de Pesquisas e Projetos Sociais (InPro), Benedito Tadeu César, os apupos a Dilma não devem ser superdimensionados.
– Lula também foi vaiado, e a aprovação da presidente ainda é superior à de Lula e à de FH nos mesmos períodos de governo. Há sempre uma parcela de descontentes – pondera o cientista político.
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Para César, a insatisfação popular explica os fenômenos verificados dentro e fora dos estádios, mas o grau de descontentamento nas ruas é maior do que o vislumbrado no Mané Garrincha na tarde de sábado.
– As pessoas estão lá no estádio para um evento esportivo, não para ficar homenageando político. Em relação aos protestos nas capitais, são deflagrados por um somatório de coisas, como a inflação e o comportamento das polícias militares – avalia.
Os próximos dias deverão mostrar o que seguirá soando mais alto no país: os gritos de gol, as bombas ou as palavras de ordem.