Escolas de Santa Catarina estão adotando novas comemorações para valorizar a diversidade das famílias. Unidades de ensino têm deixado de lado as homenagens tradicionais de Dia das Mães, neste domingo (14), para celebrar o Dia da Família — ou até o “Dia de quem cuida de mim”. Dessa forma, novos arranjos familiares ganham espaço no ambiente escolar e, conforme especialistas, garantem a inclusão das crianças que vivem diferentes realidades.

Continua depois da publicidade

Receba notícias de Santa Catarina pelo WhatsApp

Esse movimento acontece há décadas no Brasil, segundo a professora Jimena Furlani, doutora em Educação e docente na Universidade do Estado de Santa Catarina (Udesc). Ela avalia que datas mais amplas de comemoração, ou novos formatos para prestigiar as famílias, são alternativas que as redes escolares encontraram para abranger alunos criados por mãe ou pai solo, casais homoafetivos, avós e outros parentes ou responsáveis legais.

— A escola reflete muito a sociedade brasileira e há muito tempo a gente vem discutindo novos arranjos familiares. Não é que se está negando o Dia das Mãe ou dos Pais, mas é que esse modelo não existe mais para muita gente. Quase 40% das famílias são monoparentais e quase sempre são com mulheres responsáveis. Então, comemorar o Dia dos Pais para essas crianças seria excludente — argumenta Furlani.

Casal consegue registrar filha com duas mães após luta na Justiça em Florianópolis

Continua depois da publicidade

A professora ainda explica que reconhecer a diversidade é um dos princípios educacionais, ao lado da cidadania, para a formação na escola. O conceito “inclusão”, que já esteve ligado a classes sociais e pessoas com deficiência, agora é usado sobre a identidade das pessoas, contabilizando também questões religiosas, de gênero e orientação sexual. Furlani considera que isso é importante para a formação integral da criança e também para que ela se sinta confortável para aprender em um lugar seguro e receptivo.

— Dessa forma, a criança se sente reconhecida. Quando você reconhece vários modelos de famílias, todos se sentem reconhecidos. Você abandona o conceito de “normal” e “o que é certo”, e fala termos no plural, dando espaço para que as pessoas apresentem a própria realidade — justifica a professora.

Projetos pelas instituições de ensino em SC

Em unidades de ensino em que não há uma comemoração focada nas figuras maternas e paternas, a preferência é por promover festas onde qualquer pessoa responsável pelos alunos possa comparecer. Alguns locais ainda optam por adotar uma postura mais próxima das famílias, de forma que não seja necessária uma homenagem em um dia específico.

Projeto de lei para proibir linguagem neutra em SC gera polêmica e é inconstitucional

Na rede pública de São José, na Grande Florianópolis, a Festa da Família é organizada pela Escola Básica Municipal Professor Altino Corsino da Silva Flores há anos. O evento acontece neste mês e, em 2023, o projeto é intitulado “Normal é ter uma família diferente”. Segundo a diretora Silvia Bastos, a iniciativa busca ressaltar as diversas relações familiares de forma positiva para os alunos.

Continua depois da publicidade

— A nossa comunidade aqui é bastante diversificada, tem famílias tradicionais, pais que criam filhos sozinhos, tias que cuidam das crianças, avós. A gente não costuma chamar “Dia das Mães” para não deixar que a criança se sinta excluída e diferente de uma forma negativa caso ela não tenha essa figura na vida dela — afirma a diretora.

Já o “Dia de quem cuida de mim” é uma iniciativa da Escola Autonomia, em Florianópolis, desenvolvida ao longo de oito anos. Anualmente em setembro, as famílias se reúnem para brincar e confraternizar em uma festa no começo da primavera. Porém, as manifestações de homenagem dos alunos para quem cuida deles também acontece por meio de projetos pedagógicos implementados ao longo do ano letivo.

Avós que querem a guarda de criança de SC encontrada em SP passarão por análise, diz Justiça

— A gente dá espaço para que tenham manifestações de afeto, que podem ir para qualquer pessoa. Utilizar o “quem nos ama, nos cuida, nos protege” contempla uma diversidade gigante de composições familiares — afirma Eloiza Schumacher, fundadora e coordenadora da unidade.

Em Blumenau, a Escola Infantil Ser Brincante adota outro modelo, de valorizar a presença dos responsáveis pelos alunos no dia a dia da educação. Atividades coletivas entre famílias e crianças fazem parte da programação da unidade e, na semana de comemoração de datas como Dia das Mães e dos Pais, nada muda na dinâmica da comunidade escolar.

Continua depois da publicidade

Famílias de SC receberão o maior valor médio do Bolsa Família do sul do Brasil

— Um dia alusivo não dá conta de compreender a grandeza que é viver e construir diversidade. Acredito que um caminho possível para isso é a garantia ao acesso nas vivências diárias, onde humanos se conectam e constroem juntos conexões de respeito. Necessitamos de um dia após o outro — observa Camila Corradi Moraes, dona da escola.

Engajamento das famílias e alunos

Cada uma das instituições enfrentou diferentes desafios para fazer essas novas celebrações acontecerem. No geral, as especialistas em educação afirmam que o retorno é positivo, com engajamento das famílias e alunos. Porém, o recebimento da dinâmica diferente às vezes é difícil para alguns pais, conforme relato da proprietária da escola em Florianópolis.

— Não é uma tarefa fácil fazer famílias aceitarem, teve alguma resistência. Mas a gente entende que é uma construção e que faz parte de uma mudança geral da sociedade. Os pais têm uma idealização, fizeram apresentações para os seus pais e queriam receber algo assim. E às vezes, não pensam que o colega do filho não tem mãe, ou tem duas mães — afirma Schumacher.

Mais da metade das mães brasileiras sentem culpa na maternidade, diz estudo

Na escola pública de São José, a avaliação é que tanto os profissionais da educação quanto as famílias estão gostando muito do projeto. Conforme a diretora, a comunidade escolar criou um vínculo forte porque, além do ensino ser integral, todos desenvolveram uma relação de respeito. O contexto de diversidade favorece ainda mais, já que famílias que não possuem o formato tradicional valorizam ainda mais essa abertura para a inclusão.

Continua depois da publicidade

Em Blumenau, a proprietária da unidade de ensino explica que os pais já sabem que fazem parte de uma escola com uma outra proposta. Por isso, há uma participação dos adultos envolvidos na educação das crianças para garantir a presença na rotina dos alunos, sem necessidade de marcar um dia para isso.

— A criança quando quer agradar, ou um carinho, com uma palavra dela já resolve, ou ela faz um desenho e dá para a família. Não depende tanto do vínculo e incentivo da escola. Essas festas acabam sendo mais uma demanda dos adultos e uma expectativa dos pais, quando as crianças podem demonstrar todos os dias a importância que eles têm na vida delas — reflete Schumacher.

Leia também

Mãe, filha e neto vão a show de Roberto Carlos em SC por um amor que ultrapassa gerações

SC tem 36,7% da população inadimplente em 2023, segundo menor percentual do país

Dia das Mães: economize no presente utilizando milhas aéreas