Do mundo da Lua para o da programação de jogos. A qualidade de vida de crianças com transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH) aumenta na contramão das dosagens de Ritalina quando eles aprendem a se concentrar a partir de algo que desperte o interesse delas. Em Joinville, a Escola de Tecnologia Ampla resolveu abrir o curso de programação em Minecraft. O jogo, que tem por base a sobrevivência em um mundo hostil, faz a cabeça, principalmente, de meninos entre oito e 12 anos, como Willian Felipe Kuhnen.

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– Não sabia nem mexer em computador – relata Willian, que sempre gostou de jogar Minecraft e Payday no videogame.

Para ele, as aulas de informática não são tão boas na escola regular quanto no curso de programação. Ele mal pode esperar pela próxima aula, na qual aprenderá a animar um desenho que fez a mão. Para isso, aprendeu a usar o Photoshop e vai dominar as artes do Adobe Flash, que dá alma às criações dos alunos.

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Aos 12 anos, Willian ainda não aprendeu a programar jogos, mas os efeitos da introdução ao domínio da técnica necessária para programar já surtiram um efeito positivo na vida dele. As doses de Ritalina diminuíram drasticamente. Antes, Joseane Kuhnen, mãe de Willian, tinha que usar a dosagem prolongada do remédio para manter o filho focado nas atividades do dia. Ele já tomava de manhã a medicação. Hoje, além de a dose ter sido reduzida, ele só é medicado antes de ir para a aula.

– Quero tirar totalmente o remédio – planeja a mãe, que via o filho muito apático sob domínio de altas dosagens.

Além de um ganho à saúde, o curso foi uma forma de Willian aprender como funciona um computador, em vez de passar o dia entretido com jogos. Toda hora, o filho chamava a mãe com medo de algum vírus diante das mensagens que sempre pipocam em frente à tela. A ansiedade diante da máquina deu lugar à intimidade. Hoje, ele usa sozinho o computador, mas a paixão ainda continua sendo os jogos. Enquanto Joseane fala sobre o tratamento médico de Willian, ele comenta ao jogar Agar.io:

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– Olha como a bolinha tá grande.

O jogo pode ser considerado releitura do Pacman. Você é uma bolinha colorida, movimentada por meio do mouse. Seu objetivo é comer a bolinha dos outros jogadores. Quanto mais come, maior fica e melhor jogador é.

Por que Minecraft?

A ideia do curso, quando pensado pelo professor André Vidal dos Santos, era cativar os alunos a partir daquilo que eles já gostavam. O Minecraft e os desenhos animados que eles mais apreciam passaram a fazer parte do método de ensino. Ao invés de somente jogar ou assistir, os alunos percebem que têm o poder de programar o próprio jogo e criar os próprios desenhos. Para o professor, eles veem e escolhem desde cedo o que querem fazer no futuro.

– Eles têm o jogo como recompensa. Se fizerem as atividades em 1h45, o professor deixa eles jogarem Minecraft por 15 minutos. É a recompensa em formato de aprendizado e estudo.

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Além de ser um prêmio, na concepção de André, o jogo é um estímulo ao aprendizado da programação, que envolve conhecimentos multidisciplinares. Eles aprendem inglês, treinam a construção de histórias na elaboração de roteiros, precisam dominar a matemática e a lógica para trazer o roteiro imaginado à realidade. No Minecraft, eles desenvolvem projetos arquitetônicos com blocos, semelhantes aos do Lego. O professor garante que eles conseguem reproduzir projetos como o da Casa Branca, nos Estados Unidos.

O trabalho de conclusão do curso, que dura um ano, pode ser um roteiro, uma arte, uma animação e até um jogo para baixar como aplicativo de celular. A vontade de André é de que a metodologia das aulas de programação chegue às escolas regulares, para que os alunos aprendam e tenham o interesse despertado a partir daquilo que gostam. Assim, segundo ele, muitos talentos poderiam ser reconhecidos em meio a crianças que podem apresentar déficit de atenção.

Existem turmas de programação que chegam a ter 25% dos alunos com diferentes níveis de TDAH. Para André, a tecnologia tem muito a ver com isso. O professor considera que as crianças brincam cada vez menos na rua e se socializam mais virtualmente. Mas a tecnologia não é só vilã. O desafio de professores é descobrir o melhor modo de usá-la a favor do aprendizado.

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