Se o mundo flerta com a erradicação da poliomielite, doença que provoca a paralisia infantil e faz você correr com seu filhinho aos postos de saúde para “tomar a gotinha”, saiba que por trás disso está um homem nascido há 72 anos, em Rio Pardo, às margens do Rio Jacuí. Ciro de Quadros, epidemiologista formado na atual Universidade Federal de Ciências da Saúde, projeta um mundo sem pólio em apenas dois anos e se diz “100% otimista” quanto a isso. Hoje, 99% do planeta está livre da doença – incluindo toda a América Latina.
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O reconhecimento ao gaúcho não conhece fronteiras. Referência mundial, receberá no final de junho, em Madri, o Prêmio Fundação BBVA Fronteiras do Conhecimento.
Um dos líderes da campanha mundial pela erradicação da pólio, Quadros é vice-presidente do Instituto Sabin e mora em Washington, de onde conversou por telefone com ZH. A cada frase ele demonstra, no conteúdo, a humildade de quem não sente necessidade de alardear conquistas. Na forma, o sotaque, especialmente nos finais das frases, indica: já faz décadas que vive nos EUA, onde teve suas duas filhas.
Sempre alerta
Quadros teme o lado perverso da globalização. Se por um lado, atualmente, “o sistema de vigilância epidemiológica é muito mais amplo”, por outro o vírus também transita com mais facilidade.
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– Angola, por exemplo, havia ficado sem a pólio durante três anos, até que o vírus chegou da Índia e reinfectou o país. De Angola, foi para a República Democrática do Congo, a Nigéria, o Chade, a Etiópia. É fundamental manter alta cobertura vacinal, para evitar a reinfecção. No Brasil, é natural que frequentemente entrem africanos com o vírus, por isso a vacinação.
Fé na ciência
Desde 1966, quando deixou o Estado para trabalhar em meio ao verde inóspito da Amazônia, ele sabe o que fazer com as dificuldades: vencê-las. Até por isso, acredita piamente que os últimos países onde há pólio – o Afeganistão, a Índia, a Nigéria e o Paquistão – deixarão de tê-la em breve.
– Nós temos os instrumentos para a erradicação – sustenta.
Até os conflitos em alguns países, que dificultam o acesso de profissionais da saúde e impedem a vacinação, são vistos como algo a ser superado pelo médico gaúcho.
– Na América Latina, havia guerras em El Salvador e Nicarágua, terrorismo no Peru, mas conseguimos a erradicação. São problemas superáveis – confia.
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Tanta fé na ciência e no homem pode justificar a calma que Quadros transmite. Com voz pausada e segurança no que diz, ele conquistou galardões vida afora. Já são diversos prêmios, no Brasil (a Ordem do Rio Branco), no Chile, na Tailândia e por aí vai.
Força de Gates
O milionário e filantropo americano Bill Gates, fundador da Microsoft, sensibilizou-se pela causa de Quadros e abriu a carteira. O anúncio foi feito na casa onde um dos mais importantes líderes da história mundial, o presidente americano Franklin Delano Roosevelt, tratou-se da pólio. Roosevelt, aliás, foi uma exceção: pegou a doença aos 39 anos. Na maior parte das vezes, quem a contrai são crianças, o que a leva a ser conhecida também pelo nome de paralisia infantil – sua letalidade alcança entre 5% e 10% dos infectados pelo vírus.
A entrada de Gates na campanha elevou o otimismo do gaúcho, que teve um encontro com o “mecenas da pólio”. Por essas e por outras, a previsão de dois anos para a erradicação. Depois, mais alguns anos, segundo ele, para a tal da gotinha se tornar página virada da história familiar de cada um de nós.
Gates significa vontade política e recursos financeiros. E o homem que saiu de Rio Pardo para o mundo assegura:
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– Os principais problemas têm sido a falta de recursos e a má gestão. O compromisso é importante.