Na Copa do Mundo que se aproxima Paulo Cezar Caju não vai torcer pela Seleção Brasileira. Da preferência ao futebol vistoso, por isso anda inclinado a acompanhar a Espanha. Foi campeão com o escrete de 1970, mas o sentimento virou pó. A medalha e a réplica da taça foram trocados por cocaína em algum momento dos 17 anos de “loucura”, como define o período em que era viciado na droga e na bebida. Limpo há quase duas décadas, o sentimento pelo time nacional também inexiste. Contestador desde os primeiros momentos como atleta, não consegue conceber que o técnico Tite e seus comandados, estrelas do futebol mundial, não se posicionem contra a corrupção na Confederação Brasileira de Futebol (CBF) e no País. Atitude compreensiva para quem o conhece. Foi o primeiro jogador de futebol no Brasil a extrapolar o noticiário esportivo. Fruto da personalidade marcante que o fez o mais notório representante do movimento Panteras Negras por aqui. Colunista do jornal O Globo, deixa claras as opiniões contundentes também na fala. Desfia a vida que começou no barraco de favela carioca, foi craque do futebol nacional e na França, passando pela maior vitória de todas, livrar-se da droga. A trajetória de 68 anos é passada a limpo e permeada por posições duras que o acompanham da infância no Rio de Janeiro aos últimos anos, vividos em Florianópolis.

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Como veio para Florianópolis?

Conhecia bem antes, vim em uma folga quando jogava no Grêmio (1978-1979). Tenho amigos aqui, o Renato Sá, o Oberdan e o Cacau (Menezes). E têm meus enteados, o Felipe e o Diogo, paulistanos, que vieram para estudar porque gostavam de surfar, alugaram uma casinha na Joaquina. Em 1998 me mudei para São Paulo, tava saindo de um período ruim no Rio de Janeiro, saindo das drogas e do álcool. Foram quase 17 anos nessa loucura. Na época eu vinha com frequência para vê-los. Quando realmente parei, consegui sair da loucura, fui para São Paulo. Precisava sair do Rio de Janeiro, porque lá tem muito diabo ao redor. Morava no Leblon, repleto de bares, tudo perto da minha casa. Fui para São Paulo por causa da minha mulher. Mas ela foi assaltada três vezes, ficou traumatizada e decidimos vir para cá. Foi um alívio para ela e eu adorei também. Faz três anos. O desenho é muito parecido com o Rio de Janeiro e o espírito das pessoas também. Tenho grandes amigos aqui. Até porque você aturar doidão, alcoólatra e cheirador não é mole. Mesmo famoso.

Você não perdeu tudo o que tinha por causa do vício.
Minha sorte é que eu tinha muito dinheiro. Cheirei imóveis, mas era meus. Ninguém tinha nada a ver com isso, ninguém podia falar nada. Não roubei. Cheirei dois apartamentos no Rio de Janeiro, acho que valem R$ 12 milhões atualmente. Mas nunca tive preocupação de ter perdido. Não perdi. Estou vivo, eu saí. Vou fazer 70 daqui dois anos. Sai dessa em 2000, vão fazer 18 anos, uma vida. Quase o mesmo tempo que eu levei cheirando e bebendo, eu estou limpo. Acho que isso é fundamental. Não lamento a perda dos imóveis. O que ganhei foi a minha recuperação, minha saúde, minha qualidade de vida. As pessoas que estão comigo estão felizes.

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É verdade que vendeu a medalha e a réplica da taça da Copa de 70 para comprar cocaína?
Eu não vendi, eu cheirei. É diferente. Eu troquei por cocaína. Nem sabia quanto valia. Honestamente, nunca fui ligado a troféu e essas coisas. Sou desprendido. Mas aquilo era quase uma obra de arte. Gostava da Jules Rimet, é linda. Eu tinha um amigo colecionador dessas coisas. Eu entreguei para ele: “Leva e me traz o pó”. Não lembro mais quem era, nem ideia de quem tenha sido. É algo sem explicação. Você está fora de si. Não me arrependo de nada. O mais legal é que estou vivo e limpo.

Quando começou a usar cocaína?
Tinha uma festa em Saint Tropez de um amigo. Eu não jogava mais bola, não devia nada a ninguém, era famoso e querido. Jogava em time de veterano. Já bebia champanhe, que era minha bebida preferida. Foi quando experimentei a cocaína e gostei. Foi um inferno. Ninguém me colocou. Nas festas fazia parte do coquetel, tinha as bebidas e tinha a coca, a maconha.

 FLORIANÓPOLIS, SC, BRASIL, 04/05/2018: Entrevista com Paulo Cézar Cajú. (Foto: CRISTIANO ESTRELA / DIÁRIO CATARINENSE)
Foto: Cristiano Estrela / Diário Catarinense

E como foi para sair?
Começou em Marselha (na França) tenho muita ligação (jogou em clube local). Fui o primeiro brasileiro a jogar na França, primeiro campeão do mundo. Não havia ninguém nos anos 1970. Eles queriam me prestar uma homenagem, uma festona. Eu estava inchado, mal pra caramba. Já estava com a Ana (esposa), querendo sair. Uma cardiologista que estava no evento me levou para a clínica dela para fazer um exame. Começou a me examinar e falou que eu iria morrer ou de infarto fulminante ou teria um derrame com sequelas graves. Me veio a lembrança do meu pai, que passou por isso. Mas sempre fui saudável, minha sorte é que nunca fumei, nunca coloquei um cigarro na boca, era um atleta mesmo. Acho que isso me salvou. Não bebia e fumava quando atleta. E tive uma ajuda importante do Adão. Ele me colocou por um ano dentro da casa dele e não me deixava ir para lugar nenhum, logo depois dessa consulta. Ele me tirou da noite. Eu queria ir para São Paulo, viver com a Ana. Mas eu precisava da ajuda de alguém. Ainda tive uma pequena recaída. No outro dia eu pedi desculpas. Minha mulher também foi decisiva. Disse que não queria ter alcoólatra e viciado em drogas do lado dela.

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Como lida com isso hoje?
Vou para a França pelo menos uma vez por ano. Tenho amigos em Marselha, Paris, Saint Tropez que são sócios de vinícolas. Hoje eu sou sócio de uma delas, já levei para o Rio de Janeiro e vou trazer para Florianópolis e para São Paulo. Eu vou pra lá, tem degustação e fico lá sem beber. Quando vou a algum evento com bebida não me tira do sério há 18 anos, mantenho o equilíbrio. É uma vitória. Voltei ao meu normal.

Você ficou conhecido por frequentar festas, era conhecido por ser boêmio ainda quando jovem.
Tinha 18 anos, jogava no melhor time do país (Botafogo), junto com o Santos. Ia para boates, tinha dinheiro, gente bonita do lado. Era famoso e querido. Tinha um circuito de boates e ia com amigos torcedores do Botafogo e outros clube, que me levavam. Saia do Maracanã e ia com eles. Eu era apaixonado por Guaraná, que tem a cor do uísque.

Aí diziam que você bebia.
Era visto nas boates com o copo cheio de guaraná, e no outro dia os jornais diziam que eu bebia até cair. Aquilo incomodava a mim e à família. Era guaraná, e com gelo fica igualzinho ao uísque. Bebia guaraná até cair e no jogo arrebentava (risos). Foi quando peguei fama de boêmio, de bebedor, e nunca bebi. Não gostava.

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Logo depois da Copa que venceu em 1970, passou a ser representante do movimento Panteras Negras do Brasil.
Acho que nenhum negro teve a coragem que tive de chegar a Los Angeles nos anos 70, já campeão do mundo, sabendo o que eu representava, de onde vinha. O movimento Panteras Negras era para alertar que nós, da favela, também temos condições. Fui por causa do Sérgio Mendes (músico e compositor), que nos convidou para um torneio nos Estados Unidos. Já tinha visto o movimento em 68, nas Olimpíadas na Cidade do México, do punho direito levantado, de costas para as bandeiras. Fazíamos isso no Rio de Janeiro, sem afrontar ninguém Frequentava a elite. Por que não poderia ir à boate? Vão no Maracanã bater palmas para mim e eu não podia ir na boate? Fui quebrando sem afronta ou agressão. Enfim, estávamos em Los Angeles a convite do Sérgio, o Jairzinho e eu em uma limusine junto com uma cantora negra maravilhosa que cantava com ele. Ela nos levou aos bairros dos negros da cidade. Foi uma pancada. Via os caras com black power, vestidos de diferentes cores, calça boca de sino. Eu entrei em uma loja e gastei uma fortuna. Entrei em um salão e fiz o penteado black panther (penteado black power tingido). Quando cheguei ao hotel o treinador não entendeu nada. Todos os jogadores negros dos anos 1970, com exceção do Pelé usavam black power.

 FLORIANÓPOLIS, SC, BRASIL, 04/05/2018: Entrevista com Paulo Cézar Cajú. (Foto: CRISTIANO ESTRELA / DIÁRIO CATARINENSE)
Foto: Cristiano Estrela / Diário Catarinense

Foi nessa época que ganhou o apelido de Caju.
Quando voltei ninguém entendeu nada no Brasil. Os paulistas passaram a me chamar de Caju. P*** nenhuma. Nada a ver com caju. Não entenderam nada. Foi por causa do movimento negro, dos Panteras Negras. Não apenas a cor de cabelo. Um ato meu para mostrar aos negros brasileiros que tínhamos de correr atrás, que não devíamos depender de ninguém. Eu dava minha opinião. Acho que isso é por causa da pele. Hoje na televisão tem poucos negros, inclusive no jornalismo esportivo.

Você foi um dos primeiros jogadores a falar sobre outros temas.
Não queria nascer debaixo de um barraco, com goteira, ver sua mãe trabalhar como escrava. É de mim, é coragem. E tinha algo forte que era o talento, minha arma. Em 2016, nas recebi do presidente da França François Hollande, na época das Olímpiadas, homenagem gratificante. Fui condecorado com a medalha de cavaleiro da Ordem Nacional da Legião de Honra do país. Foi comenda criada por Napoleão Bonaparte e tem outros dois brasileiros, Santos-Dumont e Sebastião Salgado, fotógrafo. Um cara que nasceu na favela, no barraco, é da legião da honra. Acho que é pela minha coerência.

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Você foi o primeiro jogador atleta do Brasil que foi além das páginas do noticiário esportivo.
Tiveram outros, mas não com mesmo comportamento. Porque eu sou um cidadão. Queriam que eu ficasse lá no barraco.

Considera que seja marketing esportivo que constrói atletas, como existe hoje?
Não era marketing algum. Jamais fiz publicidade no meu próprio país. O marketing sou eu. Tudo que conquistei foi com meu trabalho, minha educação, minha fraternidade, minha igualdade. Nunca fui rancoroso. Faz parte da minha natureza.

O envolvimento com o movimento foi nessa viagem aos Estados Unidos ou já tinha a atitude?
Reforçou o que tinha comigo. Eu tinha nome com 18 anos, tinha sido campeão, era campeão de uma Copa do Mundo. Minha mãe era doméstica, parceiro. Ninguém quer nascer em barraco de tábua e com goteira, passar fome. Eu não conheci meu pai. Morreu quando eu tinha um mês de nascimento. Mas isso nunca me incomodou. Eu tinha o dom de jogar bola. Eu era bom com a bola quando criança, sem contar vantagem. Era um prazer e uma arma para seguir em frente. Depois eu fui adotado e por sorte cai em uma família boa. Meu pai (Marinho Rodrigues de Oliveira) era ex-jogador de futebol e treinador, meu irmão também jogava.

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Foi uma adoção formal?
Eu tinha o dom para jogar bola e meu irmão me escolheu, o Fred. Eu tinha 10 anos e ele pedia para que eu fosse adotado porque era muito talentoso.

Era um dos amigos que você jogava bola?
Jogava futebol de salão juntos. Falou com o pai e me convidou para passar as festas de fim de anos com eles. Minha mãe era contra e eu pedia para ir, que seria bom, que queria me adotar. “A senhora é doméstica, trabalha o dia todo. Não vai conseguir sustentar eu e minha irmã mais velha”, eu disse. Passei o Natal e Réveillon com eles. Passei mal de tanto comer. Não queria mais sair. Para nossa felicidade, minha mãe permitiu.

 FLORIANÓPOLIS, SC, BRASIL, 04/05/2018: Entrevista com Paulo Cézar Cajú. (Foto: CRISTIANO ESTRELA / DIÁRIO CATARINENSE)
Foto: Cristiano Estrela / Diário Catarinense

O preconceito racial no futebol é mais presente hoje ou na época em que jogava?
Sempre existiu. Vou te dar um exemplo: há duas semanas o Flamengo fez homenagem ao Júlio Cesar, como se nada tivesse acontecido, jogo de despedida. O Benfica e a Inter de Milão não fizeram despedida. O Flamengo faz como se nada tivesse acontecido. Ele tomou 10 gols nos últimos dois jogos da Copa do Mundo (7 a 1 da Alemanha e 3 a 0 da Holanda), e o Barbosa foi vice-campeão e nunca ganhou homenagem. O Jefferson (goleiro do Botafogo) foi eliminado da Seleção pelo Dunga. Dois negros. Falam Salah, mas ele está arrebentando desde quando jogava na Roma. Ele é muçulmano e egípcio, tem cara de terrorista. Mas o Cristiano Ronaldo, mesmo perdendo, continua a vender produtos com a marca dele. Eu nunca fui chamado para fazer alguma publicidade no meu país.

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E fez na França?
Fiz. E aqui nunca fiz, o que é isso? Mercado tem. Olha o feito do Salah, de levar o Egito para a Copa do Mundo. Ele vende no oriente. Dos treinadores, o Andrade foi campeão brasileiro e não trabalha, o Jayme (de Almeida) foi campeão carioca e da Copa do Brasil e foi demitido, o Adílio treinava na divisão de base. Tem um monte. Os maiores jogadores da Seleção Brasileira são da raça negra. Você nunca viu o Brasil ter um treinador negro em time de cima. Nunca teve e nem cogitam.

E os negros que são estrelas do futebol mundial e vão defender o Brasil na Rússia?
Nesse último ano, quando apareceu a nojeira de corrupção na Confederação Brasileira de Futebol e federações, você não vê ninguém, não vê Neymar, Daniel Alves, Thiago Silva, Marquinhos, caras que têm nome e estão consolidados lá fora, ninguém fala. Nem a imprensa pergunta sobre a situação do país, se eles concordam com a corrupção, com o banimento ao Marco Polo Del Nero e ao Ricardo Teixeira do futebol, com a prisão de José Maria Marin. O candidato do Del Nero é eleito à presidência da CBF e nenhum jogador fala. O Tite também não fala, logo ele que foi um dos fundadores do Bom Senso FC (movimento entre jogadores e treinadores para tentar melhorar o futebol nacional). Ele está lá e é amigo do Marco Polo Del Nero.

O Tite defende que a Seleção Brasileira é diferente da CBF.
Mas você é cidadão brasileiro. Ninguém está contente em conviver com ladrão. Isso é nojeira, imundice total.

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PC, você já pensou em liderar um movimento com contra o racismo no futebol?
Não, não… Uma coisa que aprendi quando morei nos Estados Unidos, jogando (no California Surf), é que ninguém te obriga a nada. Tem segmentos de comportamento. Malcolm X, Muhammad Ali e outros fizeram pela raça e isso deve seguir. E a gente não consegue seguir. Não quero ser precursor de nada. Gostaria que a raça negra se impusesse e que tivesse condição de melhor educação, melhor moradia. Não tem e não faz por onde, não luta ou briga. Mas no Carnaval a gente consegue reunir um milhão de negros para desfilar, juntar gente para a Copa do Mundo. Em benefício da classe, a gente não vê. Não vê nem do branco. As pessoas se reúnem para ir no bloco todos os anos, mas para mudar salário e os auxílios que os políticos têm, ninguém se junta.

E na política, pensou em entrar?
Não. Sou uma pessoa muito limpa. Não gosto de sujeira. Apesar de vir da favela, minha educação foi linda. Tive duas mães severas, a legítima e a adotiva.

Então o que pensa sobre o Romário, senador, e o Danrlei, deputado federal?
Prefiro não opinar sobre eles porque estou decepcionado com todo mundo. Mas os jogadores brasileiros que estão na Europa, como o Neymar, o melhor do país que joga lá e tem potencial para ganhar uma Copa do Mundo, têm consciência política zero. Se ele não quer ou não se interessa é um absurdo. Ele é um cidadão brasileiro que veio do nada como eu. Como o Ronaldo e o Romário também. Se ele quisesse poderia dizer que não iria jogar a Copa do Mundo enquanto existir corrupção na política e na Confederação Brasileira de Futebol, não competiria.

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Foi isso que você fez em 1978, de alguma forma.
Foi. Com o almirante Heleno Nunes, por algo grave que não lembro se era a gratificação ou corte. Foi algo duro. Mas ele destratou a gente. Eu me irritei profundamente e falei que ele tinha de cuidar de marinheiro e que ele não entendia nada de futebol. Fui cortado.

É um erro na carreira que se arrepende?
Não me arrependo. Falei consciente. Não tinha nada contra o regime, até porque foi o melhor período que vivi. Os militares passaram a estar no poder em 1964. Participei de duas copas em que estiveram no comando do país. Em 1970 eles introduziram a disciplina. Trouxeram isso para a gente. Foi a maior seleção de mundo.

O êxito na Copa de 1970 foi por causa dessa disciplina. Tinha muito talento, mas a disciplina foi fundamental?
É lógico. Não podia fumar. O Gerson e o Félix fumavam 40 cigarros cada. Introduziram a preparação e ninguém deu um pio, nem o Pelé, que já era o maior do mundo. É que tinha potencial, um grupo maravilhoso, não podia ter privilégio ou mordomia. O chefe da delegação era o brigadeiro Jerônimo de Bastos, presidente do Conselho Nacional de Desportos. Era bravo. O Gerson e o Félix só poderiam fumar no máximo 10 cigarros por dia. Os mais novos, em Guadalajara, flertavam com meninas mexicanas, mesmo presos no hotel, trancados. Pegávamos na mão delas por entre o portão e uma vez fomos flagrados e fomos ameaçados de corte. Foi uma choradeira. A gente sentia que seria campeão. Fomos direto no Pelé, contamos o que aconteceu e ele conseguiu contornar. Foi um milagre (risos).

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 FLORIANÓPOLIS, SC, BRASIL, 04/05/2018: Entrevista com Paulo Cézar Cajú. (Foto: CRISTIANO ESTRELA / DIÁRIO CATARINENSE)
Foto: Cristiano Estrela / Diário Catarinense

Mesmo assim, não repetiram o feito na copa seguinte, em 1974.
Foi outro nível. O time era bom, o projeto era bom, mas não conseguiu expandir. Veio Sul, Minas, São Paulo e Rio. Eram 500 jornalistas confinados conosco na Floresta Negra, na Alemanha. Era um time bom, mas tinha recebido proposta do Olympique de Marseille e estava descontente com o que acontecia. Era grupo de cariocas, de paulistas, de mineiros e de gaúchos dentro da concentração. A própria imprensa contribuía. Os jornalistas puxavam os jogadores de seus estados e eu apelava, eram todos do meu país. Eu fiquei insatisfeito.

Hoje tem muito lobby na Seleção e nos clubes?
Você vende. Por quê o Tite convocou o Willian José? Joga no Real Sociedad (Espanha), está há quase dois ou três anos, e foi colocado no mercado com o nome dele. O Taison é outro. O Dunga fez isso quando levou o Afonso, centroavante, para a Copa na África do Sul. Ele estava no futebol holandês e foi para a Inglaterra. Todos fazem, é a mesma coisa. Porém, pra mim o culpado é sempre o jogador. Ele que é a estrela. Se tivesse o mínimo de personalidade, só um pouquinho… Um bando cagões, alienados. Não reagem, convivem com o que está errado e parece que está tudo certo.

O Brasil com o Tite é diferente do Brasil do 7 a 1?
Não foi 7 a 1. Foi 10 a 1, tem os 3 a 0 da Holanda. Não ganharam medalha alguma. Eu não torço. Estou de saco cheio da escola gaúcha. Em 1998 eu torci pela França. Mas não vou torcer nesta porque não gosto do (técnico Didier) Deschamps. Espero que a Espanha jogue bem, embora esteja mudando a maneira de jogar, que a Alemanha mantenha o bom futebol do Mundial passado. Gosto do futebol bonito, bem jogado. Nada de pragmático, que se joga pelo regulamento, como é em uma Copa do Mundo. A Copa de 1994 fez mal para nós. Em 1982 o futebol perdeu, foi um castigo ao futebol.

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De 1980 há imagens suas entre o Bob Marley e Chico Buarque em uma partida de futebol. Como foi jogar pelo Politheama, o time do Chico?
Na época eu jogava no Vasco, em uma troca em que o Leão foi para o Grêmio. Nessa época tinha o festival Noites Cariocas, do Nelson Motta, era na noite de sexta. Como eu jogava no domingo, dava para ir. Alguns músicos foram convidados, entre eles o Bob Marley. Eu nem gostava de reggae.

Que tipo de música gosta?
Marvin Gaye, Stevie Wonder, James Brown… era outra parada. O Bob Marley era do pessoal que gostava de dar um tapa. Eu não era maconheiro.

E como conheceu o Bob Marley?
A Gloria Maria, repórter da televisão, foi no treino em São Januário e me entrevistou. Disse que tinha falado com ele, que perguntou sobre o que queria conhecer na primeira vez em que estava no Brasil. Ele disse que era meu fã, que gostaria de me conhecer e de jogar bola. Pra mim, uma honra. Mesmo não tendo muito a ver, fui ao Copacabana Palace falar com ele. Foi legal por isso, porque não foi só por causa do futebol. Levei para jogar bola no Chico. Ficou no Rio de Janeiro uma semana. Não tinha afinidade alguma com ele. Ele já tinha o câncer. Ele me convidou para eu conhecer o gueto em que nasceu, e ele iria na minha. Trocamos endereços. Levei ele para comer à noite, tive que arrumar peixe cru porque na época não tinha sushi. Era bom de bola e apaixonado por aquela geração do futebol brasileiro.

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