Dados incompletos, falta de transparência, dificuldade de acesso a informações e gastos sem controle fazem parte da rotina de apuração da equipe do Transparência Brasil, organização não-governamental que trabalha há 15 anos incentivando e analisando a disponibilização de informações no país. Ano passado, a entidade publicou um levantamento sobre a formação dos conselheiros de tribunais de contas nos Estados. Para a diretora do Transparência Brasil, Natália Paiva, que coordenou o levantamento, conversou com o Diário Catarinense sobre a auditoria do Tribunal de Contas do Estado que analisou os gastos de viagem na Assembleia Legislativa de Santa Catarina.
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No ano passado, o Transparência Brasil publicou um levantamento sobre a formação dos conselhos de tribunais de contas dos Estados no Brasil. Qual foi o principal problema encontrado no estudo?
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Natália Paiva – Em um primeiro momento, queríamos investigar quem eram os conselheiros dos TCEs no país, pois isso não havia um dado concreto sobre este assunto. Então fizemos uma pesquisa sobre a trajetória política desses conselheiros. Em Santa Catarina, dos sete conselheiros, cinco já ocuparam algum cargo político.
Como essa questão da ligação dos conselheiros com a política influência na forma como o Tribunal funciona?
Natália – Não afirmamos que necessariamente todas as decisões sejam enviesadas, mas há uma sombra de dúvida a respeito dessas ligações com as pessoas que ocasionalmente eles julgam, que são os políticos. Na prática, o que fica claro é que a própria nomeação para o conselho de um TCE já nasce de acordos políticos, é um jogo de cartas marcadas. No país, 64% dos conselheiros são ex-políticos.
Uma das funções dos TCEs é analisar a prestação de contas. A reportagem do DC informou que uma auditoria do TCE catarinense sobre gastos com diárias na Assembleia ficou parada por 831 dias. A senhora acredita que essa morosidade pode ter alguma relação direta com a formação do Tribunal?
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Natália – Não é possível afirmar isso, mas a ligação política abre brechas para desconfiança.
A auditoria trata de gastos com diárias de viagem e destaca problemas na comprovação das verbas. Como funciona esse controle de gastos em outros órgãos públicos pelo país?
Natália – Estamos finalizando uma pesquisa justamente sobre despesas de verba indenizatória, como auxílio-moradia, verba de gabinete e gratificações diversas. o que encontramos foi que isso varia bastante para cada órgão. Por exemplo, apenas oito assembleias têm auxílio-moradia para deputados, e a AL de Santa Catarina é uma delas, os deputados têm direito a R$ 4.378,00 por mês para esse fim. Na prática, Santa Catarina está na média de gastos, comparando com outros Estados. No entanto, fizemos pedidos por Lei de Acesso à Informação para todas as assembleias legislativas e 12 não responderam, incluindo a AL catarinense. Isso é importante porque mostra que o órgão não está preparado para cumprir uma lei vigente no país.
No ano passado, a Assembleia catarinense teve R$ 16,2 milhões com despesas em diárias de viagem. Esse valor é mais do que o dobro da soma das assembleias de todos os outros seis Estados das regiões Sul e Sudeste no mesmo período: R$ 7,6 milhões. Como é possível impedir gastos tão altos e de quem seria esse papel?
Natália – Essa é a função do Tribunal de Contas. Se ele não está fazendo isso, há um problema e outros órgãos, como o Ministério Público, devem agir de alguma forma. Para ajudar nesse processo, há dois caminhos, primeiro uma prestação de contas eficiente e em seguida a transparência desses gastos. O problema é que há uma mentalidade tacanha de que os políticos são os donos do dinheiro público, o que é absolutamente equivocado e inaceitável hoje.
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